Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 03 de agosto de 2019

The Newsroom (HBO, 2ª Temporada): o custo da verdade [SÉRIE]

Segunda parte do show é marcada por grande atuação de Jeff Daniels e mostra as falhas na cobertura de uma história falsa, trazendo consequências negativas para os jornalistas da ACN.

Em sua primeira temporada, “The Newsroom” se notabilizou por nos apresentar a redação de um emissora de TV dedicada ao jornalismo 24 horas por dia, além da luta quase utópica dos seus profissionais para conseguir transmitir as notícias para o público da maneira mais ética possível. Eles tentam fugir do jogo de interesses comum neste meio, principalmente os políticos e econômicos, estes sempre buscando influenciar a pauta dos programas noticiosos. Em seu segundo ano, a série da HBO dá um passo além e foca sua história nas consequências negativas que a busca da verdade pode trazer. Se aproveitando de notícias do mundo real e fugindo do senso comum em um drama político assinado por Aaron Sorkin (“A Grande Jogada”), nesta nova fase o destino influencia diretamente a história, tornando um furo de reportagem, a Operação Gênova, um retumbante fracasso para os jornalistas do News Night, principal jornal da ACN (Atlantis Cable News).

Charlie Skinner (Sam Waterston, “Suprema”), diretor de jornalismo da emissora, Will McAvoy (Jeff Daniels, “O Apanhador era um Espião”), âncora do News Night, e MacKenzie McHale (Emily Mortimer, “O Retorno de Mary Poppins”), produtora do grande jornal do canal, se deparam com uma denúncia sobre a Operação Gênova, missão de resgate do exército americano no Oriente Médio que fez o uso do gás sarin – uma substância proibida – contra civis. Antes disso, é importante contextualizar como o destino atuou como maior artífice para os derradeiros acontecimentos da temporada. Quando um repórter designado para cobrir a campanha presidencial de 2012 se acidenta em casa, Jim Harper (John Gallagher Jr., “A Justiceira”), ainda abalado pelo fora recebido de Maggie Jordan (Alison Pill, “Vice”) no final do primeiro ano, decide ocupar esse espaço e se oferece para cobrir a pré-campanha de Mitt Romney pelo Partido Republicano. Assim, ele se afasta da sua função de produtor do News Night, onde era essencial. O jornalista Jerry Dantana (Hamish Linklater, “Loja de Unicórnios”), produtor em Washington, é chamado para substituir Jim em Nova York, uma terrível decisão para a reputação da emissora.

Em seus primeiros episódios já somos apresentados a uma história com fatos consolidados, com seus protagonistas sendo entrevistados pela advogada Rebecca Halliday (Marcia Gay Harden, “À Queima-Roupa”), sobre os erros cometidos durante o processo de apuração da Operação Gênova. O roteiro aqui acerta ao inverter a história, deixando o público curioso para saber o que aconteceu e de que maneira, uma informação só revelada quase no final da temporada.

Além disso, como histórias secundárias, vemos o drama de Maggie, que após terminar seu namoro com Don Keefer (Thomas Sadoski, “John Wick: Um Novo Dia Para Matar”) decide ir para África em uma cobertura especial da ACN. Após presenciar uma tragédia no continente africano, ela volta abalada, a ponto de afetar sua vida pessoal e profissional. Os dramas de outros personagens ajudam a dar mais consistência na trama, tornando a série mais palatável para o público não interessado pelos meandros do meio jornalístico. Destaque aqui para Sloan Sabbith (Olivia Munn, “O Predador”), personagem mais presente nessa nova temporada com sua inteligência e sua busca por um par ideal, e para Neal Sampat (Dev Patel, “O Convidado”), com suas sugestões de pautas estranhas, mas principalmente por ser o primeiro jornalista da ACN a prever o surgimento do movimento Occupy Wall Street, até então menosprezado pelos seus companheiros de redação.

Apesar de ter um bom elenco de apoio, responsável por manter a série em ritmo alucinante, muito em função do roteiro sempre acelerado de Sorkin, o personagem de Jeff Daniels continua a ser o destaque em “The Newsroom”. Seu Will McAvoy é um frio jornalista na frente das câmeras – inclusive mantendo a postura profissional mesmo quando descobre sobre a morte do seu pai, no intervalo do jornal – e fora delas mostra suas incertezas e dilemas. Mesmo sendo um milionário jornalista, admirado e seguido por milhares de pessoas, Will é uma pessoa solitária. Transmitir todos esses sentimentos com grande maestria foi um dos principais motivos que levaram Daniels a ganhar o Emmy de melhor ator em 2013.

Outro ótimo ponto explorado por “The Newsroom” está no roteiro conciso e que conflui no final da temporada, amarando todas as pequenas histórias paralelas soltas ao longo dos nove episódios desse segundo ano do show. Outro ponto sempre importante de destacar diz respeito ao espaço dado pela série para debater a forma como o jornalismo hoje é produzido e consumido, já com o surgimento e cada vez maior fortalecimento das redes sociais. Mostrar os bastidores de um jornal, toda a loucura que é, principalmente quando uma história urgente surge, também se torna divertido e curioso de se ver, em especial para os curiosos pelo meio jornalístico.

O drama passado pelos jornalistas da ACN com a Operação Gênova acabou servindo de aprendizado e a série termina sua segunda parte em um tom positivo. Com alguns desfechos inesperados, ela passa a mensagem que o mais importante para os jornalistas, e o público, é sempre acreditar no poder das notícias, quando bem apuradas.

Filipe Scotti
@filipescotti

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