Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 01 de agosto de 2019

Velozes e Furiosos – Hobbs & Shaw (2019): delicioso absurdo estúpido

Filme tem roteiro desconexo, estúpido e não trata bem suas tramas. Entretanto, entende o espírito da franquia de brincar com o absurdo e, com uma dupla em ótima química, entrega diversão absoluta.

A bilionária franquia “Velozes e Furiosos” se encontrou de verdade a partir do quinto longa, quando abraçaram o absurdo num filme de assalto que ainda trouxe Dwayne Johnson (“Arranha-Céu: Coragem sem Limite”) para o elenco. Nas sequências, tretas entre Johnson e Vin Diesel (“Vingadores: Ultimato”) nasceram e chegaram à internet, o que fez com que a Universal, para não deixar que a rixa afetasse o desempenho de uma franquia tão lucrativa, aproveitasse a grande fama do ex-lutador de luta livre para lançar um spin-off chamado “Velozes e Furiosos: Hobbs & Shaw”.

Fiel à maluquice da franquia, a trama aqui gira em torno de uma corporação maligna e tecnologicamente avançada, que está atrás de um supervírus que eliminará grande parte da população humana, considerada fraca por eles. Para tal, contam com seu novo agente, Brixton (Idris Elba, “Vingadores: Guerra Infinita”), um homem com coluna de metal e partes cibernéticas, ilustrando que a franquia vem aumentando tanto o nível de loucura em suas propostas que faz crer que um dia ela se passará no espaço. Elba, aliás, soube achar o tom certo entre ameaçador e caricato.

Os personagens do título são interpretados por Dwayne Johnson e Jason Statham (“Megatubarão”). Ambos atores foram adicionados à franquia após vários longas “Velozes e Furiosos“, mas encaixam perfeitamente com a proposta disparatada da mesma. Além disso, os dois já trabalharam em outras obras que brincam com essa loucura visual mesclada com comédia. Statham, aliás, traz elementos de outro personagem seu, o motorista da cinessérie “Carga Explosiva”, onde também é um cara elegante que luta artes marciais e executa movimentos irreais com veículos.

Se o roteiro é irracional e desprovido de coesão com uma premissa estúpida (o que, francamente, era exatamente o esperado), a ação e a comédia funcionam no carisma e na química da dupla principal. Eles funcionam tão bem em cena que muitas vezes vê-los se insultando é mais divertido do que as sequências de ação em si, ilustrando diálogos que exploram bem a relação entre os dois e compensam pela trama sem sentido e por uma ou outra fala que passa do ponto em que a bobeira fica divertida para dar uma leve agonia.

Os tons cômicos nas cenas de ação são bem representados nas cenas do elevador panorâmico e nas duas salas divididas por um vidro, exemplos de onde a direção de David Leitch (“Deadpool 2”) acerta em cheio. É uma pena que a mão do diretor não esteja constantemente calibrada durante todo o filme – os movimentos de câmera parecem se repetir para filmar a ação, o que acaba não demonstrando a criatividade que o longa merece e que era esperada.

Isso não quer dizer que as cenas de ações sejam ruins, de forma alguma. “Isso é impossível”, diz um personagem em certo momento, e reflete perfeitamente tudo o que é feito pelos dublês e efeitos especiais. Seguindo a proposta do espetáculo absurdo da franquia, as cenas empolgam e divertem por não terem medo de abraçar a loucura da física daquele universo. Há uma sequência que envolve carros enfileirados e um helicóptero que é absolutamente incrível e exala o espírito da franquia a cada frame.

Um dos elementos que sempre permeou a franquia foi o tema de família, e ele não é bem trabalhado aqui. Há conflitos entre irmãos que são apresentados, deixados de lado, e retomados no terceiro ato qunado realmente se lida com eles. Era um dos pontos do roteiro que precisava funcionar melhor, mas cai por terra com a trama desconexa que falha em dar peso emocional.

Vanessa Kirby (“Missão: Impossível – Efeito Fallout”) foi uma boa adição, se mostrando altamente competente em cenas de ação e interagindo com Johnson e Statham sem deixar a adrenalina cair. Além da atriz, há outras participações especiais interessantes e referências a trabalhos antigos dos atores que divertem. No melhor “estilo Marvel“, o longa tem três cenas após o fim. Uma no início, outra no meio e outra após o fim dos créditos. Nenhuma de vital importância para a história ou futuro da franquia, mas são definitivamente engraçadas.

Um filme com história ridícula e texto nada coeso, transições de tempo e espaço não correlacionadas, falas que quase sempre acertam o tom de comédia, atores com ótima química e uma direção competente, “Velozes e Furiosos: Hobbs & Shaw” não faz sentido e se deleita com isso. Ao não ter medo de abraçar a breguice e o absurdo, ele honra a franquia com entretenimento blockbuster de primeira.

Bruno Passos
@passosnerds

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