Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 28 de maio de 2019

Godzilla II: Rei dos Monstros (2019): grandioso como um kaiju

Se distanciando um pouco do drama humano e focado no embate entre kaijus, estamos diante de um filme que abre o universo dos monstros, cria pontes para as próximas sequências e não cansa de mostrar o quão insignificante nós somos quando comparados com eles.

“Círculo de Fogo” é um dos maiores marcos para os filmes com kaijus. A direção cuidadosa e elegante de Guillermo del Toro (“A Forma da Água”) mostrou ser possível trabalhar com esta temática e entregar um filme complexo e com camadas bem construídas. Talvez por isso sempre fique um sentimento de que esta complexidade deve estar presente em filmes como este. Porém, nem sempre um caminho funciona para filmes diferentes. E “Godzilla II: Rei dos Monstros” é a prova de que um filme pode investir na ação física e na grandiosidade das personagens e ter um resultado extremamente positivo.

Na trama, Mark Russell (Kyle Chandler, de “O Primeiro Homem”) tem dificuldades para lidar com a morte do filho, causada pela luta entre Godzilla e os MUTOs. Sua ex-esposa, a cientista Emma Russell (Vera Farmiga, de “A Freira”), vem trabalhando num aparelho capaz de controlar essas criaturas e evitar um novo ataque. Porém, o ecoterrorista Jonah Alan (Charles Dance, de “Johnny English 3.0”) consegue sequestrar Emma e decide despertar todos os titãs que a Monarch havia localizado até então.

Se no filme anterior, o Godzilla era mais um elemento da narrativa e não o protagonista de fato, agora a situação muda. O filme investe muito mais no kaiju, criando, inclusive, um arco próprio para ele. Sua primeira aparição é bem apresentada, assim como a primeira luta contra o Ghidorah. Isso deixa o filme muito mais intenso e divertido para quem espera por uma obra com criaturas gigantes.

E para ser bem sucedido nessa missão, o diretor Michael Dougherty (“Krampus: O Terror do Natal”) consegue criar um sentimento de inferioridade, não pelo uso de algum referencial, mas pelo impacto da ação. Cada golpe é capaz de destruir um prédio, o bater de asas cria um vendaval, uma caminhada é capaz de causar um pequeno tremor de terra. Tudo isso constrói um cenário caótico e confuso, mas bem utilizado pela direção que, mesmo com cortes rápidos e movimentos de câmera bruscos, consegue situar o público de tudo o que está acontecendo na cena.

Porém, se desta vez o monstro ganha mais espaço, o roteiro perde em profundidade. Não que na obra anterior isso fosse algo relevante, mas aqui ele deixa de ter importância. Embora exista um subplot sobre a dificuldade em lidar com a morte, ela é usada somente em momentos bem específicos. Millie Bobby Brown (da série “Stranger Things”) até consegue se destacar em seu primeiro trabalho no cinema. A atriz mostra não estar apegada aos trejeitos da personagem que a consagrou na Netflix e desenvolve bem o conflito interno que vive ao ver sua família ser destruída, não pelo monstro, mas pelos problemas pessoais dos pais.

Mas a verdadeira beleza do filme está na abordagem dos monstros. O filme os trata como deuses e utiliza muito bem Ken Watanabe (“Pokémon Detective Pikachu“) e sua devoção pelo Godzilla para abordar este viés. E vem justamente de Watanabe uma das mais belas cenas deste filme. Existem também alguns pequenos easter eggs, que relacionam os nomes das bases da Monarch com o cânone dos monstros, um brilho a mais que mostra o quão consciente de si esta obra é.

“Godzilla II: Rei dos Monstros” é um filme digno da grandiosidade do seu protagonista. Os monstros em tela são bem utilizados e a luta entre eles é visualmente impressionante. Falta um pouco de personalidade para a trilha sonora, que depende muito da ação do filme para se destacar, mas não há um único tema marcante. Nada que prejudique o filme, que sabe que seu mérito está nos monstros e se apega com força nisso. Há algumas pontes estabelecidas para o futuro da franquia, com King Kong e a Ilha da Caveira sendo mencionados diversas vezes ao longo da projeção. Se continuar neste ritmo, difícil imaginar por quantos filmes o planeta Terra conseguirá resistir a este maravilhoso duelo de titãs.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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