Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 27 de maio de 2019

Nosso Último Verão (Netflix, 2019): a superficialidade da estação

Num mundo cada vez mais desconstruído, novo romance da Netflix ainda pensa pequeno e dentro da caixinha.

O verão americano é um evento não apenas cinematográfico, é praticamente um estilo de vida. Nele, os blockbusters são lançados, as pessoas vão à praia, os biquínis aparecem e grande parte dos filmes escolares se concluem ou começam. A Netflix entrou na onda para lançar “Nosso Último Verão”, nova comédia romântica do seu catálogo que narra a vida de estudantes que precisam decidir o que fazer antes de ir à faculdade em suas últimas férias de verão. Um músico que se envolve com uma aspirante à cineasta, uma babá que não sabe se quer fazer faculdade, uma estagiária com problemas de relacionamento, uma dupla de nerds que se passam por adultos e dois atletas que, mesmo sendo babacas, querem demonstrar um pouco de profundidade. Assim, repleto de tramas paralelas, sendo algumas até desconexas, o filme de William Bindley (“Madison”) busca abordar o amadurecimento, perspectivas de vida, mudanças de foco e objetivos, mas infelizmente o texto do diretor em parceria com Scott Bindley (“O Que Será de Nozes 2”) cai nos vícios do gênero.

Toda a discussão se o ensino médio poderia ter sido melhor ou se eles poderiam ter feito algo diferente é o que há de mais interessante na produção. O verão parece ser a época de mudanças, o catalisador de todas as decisões importantes, e é uma pena que esse aprofundamento seja apenas superficial já que a obra prefere apenas pincelar seus personagens, talvez pela quantidade deles em tela. O foco maior está em Griffin (K.J. Apa, da série “Riverdale”) e Phoebe (Maia Mitchell, da série “The Fosters”), o músico e a jovem cineasta que se complementam e se ajudam na produção de um filme. As sequências do casal são embaladas por músicas pop que parecem saídas diretamente de um videoclipe. A fotografia estourada grita a estação em questão a todo instante, o que faz parecer que você acabou de sair de um sonho adolescente. Aliás, alguns momentos da trama são dignos de vergonha alheia ao tratar a mulher como um troféu a ser conquistado, fazendo com que uma espécie de soberania masculina tome conta do enredo, tendo o homem como único motivo de felicidade de parte das personagens femininas.

Os relacionamentos e um debate sobre como a vida profissional afeta a pessoal e vice-versa fazem com que, à medida que a estação acaba, o tempo se encurte e o ciclo comece a se fechar. As pessoas às vezes não são o que parecem e, ao abordar isso e tentar ser significativo, o longa inclui uma briga de status banal, fazendo tudo voltar à história rasteira de outrora. Um dos personagens cita que a vida adulta é a escola outra vez, com os tímidos, os populares, os atletas e nerds disputando espaço ao passo que aprendemos mais sobre nós mesmos. Estaríamos bem se o enredo seguisse essa linha e não caísse em fetiches saídos diretamente da mente de um adolescente na puberdade.

Ao se preocupar em encerrar todos os ciclos, “Nosso Último Verão” se torna demasiadamente longo, com espaço para uma pequena reviravolta forçada que deixa o mundo pequeno demais. O filme pode até funcionar para o público teen, mas falta a inspiração necessária para agradar aqueles que gostam de cinema, mesmo aquele ao qual o foco é apenas entreter.

Tiago Soares
@rapadura

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