Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 08 de maio de 2019

Pokémon: Detetive Pikachu (2019): nascido para os cinemas

A esperada adaptação de Pokémon mistura elementos de diversos gêneros para construir o primeiro live action da franquia com personalidade.

Num mundo onde os “monstrinhos de bolso” convivem conosco em diversos tipos de mídia, finalmente podemos vê-los em live action no cinema. Inspirado pela história do jogo homônimo lançado em 2016, “Pokémon: Detetive Pikachu” dribla a responsabilidade de adaptar grandes aspectos do universo Pokemón inserindo as criaturas em um filme repleto de elementos do gênero noir misturados com muita aventura. E o que há de mais destaque: Pikachu fala! Nas vozes de Ryan Reynolds (“Deadpool”) e, na versão brasileira, de Philippe Maia (“Animais Fantásticos e Onde Habitam”), o pequeno roedor elétrico investiga um misterioso caso de desaparecimento na Ryme City, uma metrópole onde humanos e Pokémon vivem lado a lado.

Tim Goodman (Justice Smith, “Jurassic World: Reino Ameaçado”) é um solitário rapaz cujas perdas na família o fizeram abandonar o interesse por treinar Pokémon. Aos 21 anos, não tem ao menos uma espécie deles para si e almeja uma simplória carreira como avaliador de seguros. Após receber notícias ruins sobre seu pai, um dedicado detetive da Ryme City, o ex-Treinador viaja até esta cidade e logo encontra um Pikachu com chapeuzinho de caçador a la Sherlock Holmes pronto para ajudá-lo a descobrir o que houve com seu pai. Não demora para Tim também conhecer uma outra aliada nas investigações, a xereta Lucy (Kathryn Newton, “O Retorno de Ben”), jornalista estagiária que trabalha numa das empresas do super rico e visionário fundador da cidade, Howard Clifford (Bill Nighy, “Questão de Tempo”).

A construção visual de Ryme City e seus arredores como habitat urbano para milhares de Pokémon, dos mais diferentes tipos e evoluções, e seus parceiros humanos é um dos pontos altos da adaptação. Inspirada nos arranha-céus londrinos e em típicas ruas asiáticas populosas e estreitas, a cidade e suas luzes de néon são um personagem à parte, tal qual em grandes filmes noir como “Blade Runner”, “Chinatown” e “Minority Report”. A ação na escuridão e o efeito de sombras, geralmente marcadas pelas persianas do escritório do detetive, são características deste tipo de filme, inegavelmente referenciado aqui e não só pela arte, fotografia e personagens. Não é ao acaso que a trama de “Pokémon: Detetive Pikachu” dê muitas voltas, é recheada de flashbacks e tem amnésias como ponto de partida.

Quanto às recriações animadas dos adorados personagens, as cores e texturas realizadas pela equipe de efeitos visuais imprimem realismo suficiente para acreditar que eles podem existir de verdade. É tanta espécie de Pokémon na tela que os fãs vão querer rever o filme com a Pokédex ao lado para ajudar a identificar cada criatura diferente que aparece. A decisão de ambientar a história numa cidade onde eles são livres permite abusar das referências além de poupar a produção das críticas de protetores de animais, já que a captura de Pokémon com as Pokébolas e as batalhas organizadas não fazem parte relevante do roteiro, apesar de estarem no longa para agradar qualquer um que curte a franquia.

Por outro lado, a química entre os três protagonistas não funciona tão bem quanto o visual. O Pikachu desta versão é fofíssimo, mas também é desbocado e espevitado, se misturando com o humor da personalidade que Ryan Reynolds cultivou nos seus filmes anteriores, especialmente na franquia “Deadpool”. Há uma certa malícia nos diálogos, que se encaixa no noir assim como o tom pesado de luto que inicia a história, mas afeta a classificação etária indicativa para o longa. Ainda assim, a relação construída entre os personagens sustenta o investimento emocional do espectador, fazendo o público se importar com eles e garantindo momentos comoventes.

Carregado pelo carisma de praticamente todos os Pokémon apresentados e pelo ótimo visual, “Pokémon: Detetive Pikachu” também diverte pelas viradas do roteiro, não tão originais nem muito inteligentes, mas que são bem construídas e com boas intenções. As ausências de uma trilha sonora marcante e de grandes momentos de ação são compensadas pelo deslumbre de finalmente ver a franquia japonesa em live action, mesmo para quem não é aficionado. Não chega a ser um memorável exemplo de gênero híbrido, misturando animação, aventura e mistério como foi “Uma Cilada para Roger Rabbit”, mas traz consigo uma excelente experiência para a garotada e fãs de todas as idades.

William Sousa
@williamsousa

Compartilhe