Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 22 de abril de 2019

Um Homem de Sorte (Netflix, 2018): enfrentando monstros internos

Drama de época apresenta a importância dos valores para conviver em sociedade.

Baseado no livro “Lykke-Per”, do autor dinamarquês Henrik Pontoppidan, “Um Homem de Sorte” é o novo drama de época distribuído pela Netflix. Dirigido por Bille August (“Trem Noturno para Lisboa“), o longa conta a história de Peter Andreas Sidenius (Esben Smed), um talentoso estudante de engenharia que cresceu com uma família muito religiosa na cidade de Jutland, na Dinamarca. Ao ser admitido em uma faculdade, o jovem deixa suas raízes religiosas para tentar a sorte em Copenhague.

Na cidade grande, o rapaz tenta divulgar um projeto com potencial revolucionário no controle de fornecimento de energia na cidade. Em pleno final do século XIX, ao invés de usar o carvão, que é finito, a energia seria captada das forças da natureza, como o vento e as ondas do mar. Neste processo para atrair atenção ao seu trabalho, Peter passa a frequentar a casa da família Solomon e logo se interessa por Jakobe (Katrine Greis-Rosenthal), a filha mais velha, que é noiva de Eybert (Rasmus Bjerg).

O bom trabalho de Esben Smed é essencial para o andamento do filme. O drama de época conta três histórias sobre o seu protagonista: sua relação com a religião após uma infância complicada, seu interesse por diversas mulheres e sua batalha contra os seus monstros interiores enquanto convive em sociedade. O maior mérito da obra de Bille August é apresentar que o mesmo orgulho que motiva Peter pode representar seu fim.

O protagonista demonstra que tem o controle da situação quando o assunto é seu emprego, mas se perde para a arrogância quando precisa demonstrar gentileza. Sem conseguir resolver seus problemas com os pais, Peter prefere ter uma angústia permanente. E essa angústia transforma a vida de diversas pessoas, seja para o lado positivo ou para o negativo.

O diretor não se apressa para contar a sua história – são 2 horas e 47 minutos sem o menor receio de alongar as cenas. Apesar de ser a proposta do filme, sua duração também joga contra seu próprio enredo. Não existe uma grande cena, um ápice na história de Peter. Todas as cenas são direcionadas para servir aos sentimentos do personagem de Smed. Já o roteiro, que o diretor divide a autoria com Anders Frithiof August (“Sommeren ’92“), volta e meia retorna ao questionamento mais relevante na história de Peter: os valores enraizados na infância influenciam na criação de um adulto?

“Um Homem de Sorte” é um grande exemplo de como a humildade e o altruísmo são benefícios que deveriam aparecer naturalmente nas pessoas, independente da religião. A obra reforça também a importância de cada pessoa lutar contra seus próprios monstros para permitir um encontro com a felicidade. A busca pelo revolucionário é plausível desde que o egoísmo abra espaço para a humildade.

Fábio Rossini
@FabioRossinii

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