Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 22 de abril de 2019

Guava Island (Prime Video, 2019): pequeno grande filme

Regada a boa música e clima tropical, o novo filme estrelado por Donald Glover é uma aventura urbana curiosa, que utiliza vários elementos para contar uma história completa em pouco tempo.

Guava não é uma ilha qualquer, ela é uma criação de sete deuses dos sete reinos para servir como um local de paz preenchido por natureza. Ou essa era a proposta inicial, como conta a bela animação que abre o filme “Guava Island”, produção do Amazon Prime Video e com direção de Hiro Murai (da série “Atlanta”). A obra é estrelada por Rihanna (“Oito Mulheres e um Segredo”) e pelo multifacetado Donald Glover (“Han Solo: Uma História Star Wars”), como um resultado daquilo que o artista vem promovendo nos últimos anos.

Desde o começo, o músico Deni Marron (Glover) aparece correndo para espalhar sua música e promover de uma forma ou outra um festival pelo qual diversos moradores da ilha anseiam. A parceira de Deni, Kofi Novia (Rihanna) não está tão empolgada com as festividades que se aproximam, por saber que o magnata da ilha Red Cargo (Nonso Anozie, de “7 Dias em Entebbe”) não vê as comemorações com bons olhos. O embate entre essas forças opostas é muito bem colocado visualmente: enquanto Deni é baixo, magro, parece ser alérgico a fechar suas camisas floridas e porta uma longa barba, Red é alto, robusto e se veste de maneira alinhada, com cabelos e barba bem curtos.

Apesar de ter pouco menos de uma hora de duração, a produção de “Guava Island” se empenhou em entregar um material de qualidade. Na fotografia, um granulado dá aquele ar de antigo que também ocorre pelas bordas arredondadas e pela proporção quadrada da tela do filme. Todas essas características poderiam apontar para um conteúdo duro e sério, ligados aos temas levantados de abusos de poder, perseguição e violência urbana. Mas a obra consegue ser uma divertida aventura que transpira boa música, cores e luz, até em momentos que poderiam ser mais sombrios.

Filmado em Cuba, muitas interpretações podem ser tiradas da história fictícia em paralelo com a realidade do local, como o fato de o artista ter esse sonho de trazer felicidade para as pessoas com a sua música em contraponto com a autoridade local, repressora e que cerceia a liberdade de seus habitantes. Mas Deni faz questão de pontuar, ao cantar os sucessos “Summer Time” e “This is America”, que ali também poderiam ser os Estados Unidos ou qualquer outro lugar, desde que siga a máxima de que para qualquer pessoa enriquecer, alguém tem que ficar ainda mais rico.

Moderno, inteligente e versátil, “Guava Island” é um prato cheio em termos de entretenimento. Meio musical, meio aventura, o filme vai se desdobrando e revelando novas possibilidades. Infelizmente, falta o tempero da participação feminina, que é deixada de lado e relega às personagens com histórias interessantes e de potencial, papéis meramente reativos às ações do herói e do vilão da trama.

Fato é que, ainda que careça de certa dose de representatividade de gênero, Donald Glover acerta novamente e cria (como ator, co-produtor, co-roteirista) uma obra que vai além de dar novas roupagens para suas músicas, e é completa por si só. Suscita questionamentos e emoções como outros de seus trabalhos na música, cinema ou TV e deixa o público curioso para o que pode estar por vir. É muito positivo que filmes como esse sejam produzidos, totalmente em sincronia com as novas plataformas que permitem o nascimento de conteúdos menos engessados e fora do padrão.

Hiago Leal
@rapadura

Compartilhe