Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 17 de abril de 2019

A Rebelião (2019): sci-fi insosso e sem energia

A ficção científica constrói uma atmosfera de "oprimidos versus opressores", mas não dá atenção suficiente aos pilares do entretenimento para garantir o interesse do público.

A Terra foi invadida por forças alienígenas superiores, que passaram a governar o planeta com o objetivo de explorar recursos naturais. Exercendo controle e autoridade sobre a sociedade humana, são chamados de “legisladores” pelos dominados. No entanto, um grupo de resistentes persiste em buscar alguma forma de reação para pelo menos reacender a esperança de algum dia expulsar os conquistadores. Esse é o contexto de “A Rebelião”, um thriller de ficção científica que pousa no centro das expectativas de filmes de invasão extraterrestre e, por esse motivo, tem tudo para desapontar espectadores desavisados.

O campo de “batalha” é mais um mundo distópico pós-apocalíptico, cuja representação segue elementos que já viraram signos do gênero: fotografia gélida, escura e com poucas cores; personagens excluídos vivendo no submundo de uma grande cidade (no caso, uma Chicago sitiada); grupos autoritários buscando manter o status quo à custa da liberdade, entre outros. Com um orçamento relativamente baixo, o diretor Rupert Wyatt (“Planeta dos Macacos: A Origem”) até busca entregar um design de produção completo, pensando nas formas dos forasteiros e de suas espaçonaves, mas seu filme não tem o escopo de um “Independence Day” embora o título nacional sugira um grande combate. A comparação mais justa deve ser com obras como “Distrito 9” e “A Chegada”, cujos objetivos são, digamos, mais “raiz” e menos “Nutella”.

Quase uma década depois da ocupação, acompanhamos dois pontos de vistas inicialmente unidos pelo trágico prólogo. Gabriel (Ashton Sanders, “Moonlight”) é um jovem morador de uma área pobre de Chicago e irmão do líder da resistência local, Rafe (Jonathan Majors, “White Boy Rick”), dado como morto pelas autoridades. Já o comandante de polícia William Mulligan (John Goodman, “Rua Cloverfield, 10”) suspeita que a organização conhecida como Pheonix (Fênix, em inglês) ainda esteja em atividade e se aproxima de Gabriel para tentar obter informações. De fato, a resistência persiste e tem um plano: “acender um fósforo para iniciar uma guerra”. Essa metáfora do roteiro, curiosamente, é algo que define muito bem o escopo de “A Rebelião”. O filme é somente a faísca de um fósforo e não a fogueira inteira. Entender e aceitar isso ajuda a não se decepcionar totalmente com o resultado.

No coração do longa está a trama de preparação para um ataque – “terrorista”, de certa maneira – por parte da resistência. O plano do grupo é causar dano aos invasores para servir como exemplo de que ainda é possível combatê-los. Essa é a “rebelião” do título, mas é executada por um conjunto de personagens dos quais sabemos muito pouco, logo, não nos importamos. A empatia do público fica limitada aos dois protagonistas, o apático Mulligan e o perdido Gabriel, simulando com precisão os sentimentos da audiência. O tom de mistério por trás do personagem de Goodman, marcado pela interação com uma subutilizada Vera Farmiga (“Invocação do Mal”), até que finalmente funciona em seu desfecho, porém, ao preço de muitas dúvidas iniciais que confundem mais que intrigam.

Como toda boa ficção científica é na verdade uma alegoria para questões humanas, o simbolismo de uma dominação alienígena opressora pode gerar diversas teorias sobre o significado da história. Há até uma referência direta ao “renascimento da América”, com o uso de elementos marcantes da cultura estadunidense, e como a luta por liberdade pode ser distorcida por líderes autoritários como um suposto golpe anárquico contra a democracia. Entretanto, de nada adianta se o filme portador de tal possível significado é insosso, sem cenas de ação empolgantes nem momentos emocionantes. Como resultado, “A Rebelião” é tão fria quanto sua própria trama e fotografia.

William Sousa
@williamsousa

Compartilhe