Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 29 de março de 2019

Shazam! (2019): diversão e inocência em harmonia total

Novo longa da DC traz de volta toda a leveza e singeleza dos antigos filmes de super-heróis.

Em 1978, na era de nascimento dos blockbusters do cinema, uma campanha de marketing chamava a atenção por uma simples frase: “Você vai acreditar que um homem pode voar!”. Essa ação divulgava um filme que se tornaria um marco na história cinematográfica mundial, “Superman – O Filme”. Apesar de não ser oficialmente o primeiro longa de super-heróis da história, Superman era diferente em todos os sentidos. Era divertido, puro, aventuresco e possuía uma aura otimista que viria a ser a tônica para outras diversas incursões de justiceiros mascarados no cinema e na TV. O tempo passou, o mundo mudou, e diversas produções que mantiveram esse tom acabaram naufragando nas bilheterias, principalmente quando o cineasta à frente da obra não entendia muito bem o que estava adaptando (alô Joel Schumacher!). Muitos tentaram – alguns com sucesso, outros não – adaptar o âmbito contemporâneo ao universo dos heróis, quase fincando o mundo dos quadrinhos na nossa realidade. Após o sucesso estrondoso de “Batman: O Cavaleiro das Trevas” de Christopher  Nolan, acreditava-se que o dark teria vindo para ficar nesse universo. A Marvel até deu seu jeito em adequar os seus heróis, dando a eles bom humor, mas também uma boa dose de ironia. A pureza tinha morrido para os cruzados de capa… até que “Mulher-Maravilha” e, principalmente, “Shazam!” aportassem nos cinemas.

Se no longa da amazona o mote era seguir, quase que categoricamente, a cartilha do “Superman” de 1978 – excetuando-se o seu terrível terceiro ato -, aqui a ideia é extrapolada ao limite, tornando o longa uma obra verdadeiramente família. Isso não é ruim de maneira alguma, podendo ser considerado até a sua maior qualidade. Com uma imersão total na ambientação lúdica, levando-se pouquíssimo à sério, é muito fácil comprar a aventura do garoto abandonado que se torna um super-herói ao som de uma palavra. Ao mesmo tempo que é mais fácil ainda entender as motivações do vilão, ainda mais simplificadas.

Billy Batson (Asher Angel) é um adolescente rebelde e solitário em busca dos pais que o “abandonaram” quando criança. Quando é adotado por uma família formada totalmente por “rejeitados”, o garoto passa a entender, lentamente, o significado do conceito familiar. Ao defender o irmão nerd e falastrão Freddy Freeman (Jack Dylan Grazer) de valentões, ele é convocado por uma entidade mágica para defender o mundo do mal, e para isso ele só precisa dizer a palavra Shazam! para ser transformado em um verdadeiro campeão.

Com uma história básica e simples, do bem contra o mal e de se aprender a dar valor ao que se tem, a verdadeira graça de “Shazam!” é todo o esforço do personagem em emular um ser heroico padrão, mesmo que por baixo dos músculos, capa branca e collant vermelho, esteja uma criança de 14 anos. Toda a brincadeira dos garotos – o irmão nerd possui algumas das melhores cenas do longa – em aprender a lidar com estes novos poderes e responsabilidades é muito delicioso de acompanhar. Quando o longa resolve bancar e brincar com as referências a outros super-heróis da DC, aí o riso é garantido.

Trazendo efeitos e cenas de ação muito bem realizadas e criativas, tecnicamente o filme é impecável. E nem precisava ser, já que as atuações são a verdadeira alma do longa. Se os garotos seguram muito bem suas cenas, é no carisma impressionante de Zachary Levi (interpretando o herói transformado) que o filme se esbalda. Em nenhum momento é possível não acreditar que existe um menino dentro daquele corpo gigante. Sua atuação passa muito longe do exagero e entrega um humor fino, autêntico e fora do comum.

Existem alguns defeitos no longa, como todo o conceito e caracterização pobre dos monstros que representam os sete pecados capitais. Há também uma certa redundância de ações no terceiro ato – apesar das duas maravilhosas surpresas que ele nos proporciona – que tornam a ação e a história um tanto truncadas e desinteressantes. Mas nada que atrapalhe ou desabone toda a jornada positiva trazida até ali.

Com duas cenas pós-créditos – em uma delas você terá que ser fã dos quadrinhos para entender de fato -, muita sensibilidade, jovialidade e frescor, “Shazam!” é o filme certo para você levar sua família ao cinema e sair com o coração aquecido. Como todo bom filme família deveria fazer.

Rogério Montanare
@rmontanare

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