Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 11 de abril de 2019

Entre Irmãs (2017): mais homoafetividade que cangaço

Somente as atrizes se entregam ao filme porque o diretor, Breno Silveira, opta por perpetuar estereótipos e dirigir seguro uma produção com linguagem de novela.

Desde sempre, a maior parte do cinema brasileiro sofre com a influência das TVs, mesmo os filmes de gênero são limitados pela cultura televisiva. “Entre Irmãsé mais um caso que deveria ter sido diretamente lançado como uma minissérie e não como um filme, pois todo seu desenrolar em forma de novelo o distancia do cinema, ainda mais se tratando de um longa com quase três horas de duração. Além disso, toda a previsibilidade da trama é enfadonha e a condução carece de viradas de interesse. A ambientação do sertão é econômica e a câmera de Silveira quer os romances clichês. O que salva o filme de uma lástima total são as atrizes: Marjorie Estiano (“As Boas Maneiras”) e Nanda Costa (“Infância”) estão inspiradíssimas em seus papéis.

Em meados da década de 30, o cangaceiro conquistava terras e reinava derramando sangue por onde passava no sertão. Na trama, o tal líder destemido é Carcará (Júlio Machado, “A Sombra do Pai”) e seu caminho muda quando ele conhece as irmãs Luzia e Emília, interpretadas respectivamente por Costa e Estiano. Ambas são costureiras e filhas de Dona Conceição (Lívia Falcão, “Sangue Azul”), até que Carcará força Luzia a abandonar a família e seguir seu bando. Pouco depois do conflito, a mãe falece e Emília parte para a cidade iludida pelo jovem e rico Degas (Rômulo Estrela, “Em Nome da Lei”).

As irmãs, que desde a infância eram muito próximas, são separadas e conduzidas a caminhos completamente opostos. Enquanto Emília é uma jovem que sonha com um príncipe e se encanta pela cidade grande, a corajosa Luzia encontra na pessoa do cangaceiro o homem para extravasar sua raiva. Amargurada, ela carrega em seu braço esquerdo uma sequela de um acidente numa árvore. Tal cena abre o filme, mas sua deficiência nunca é explorada ao longo da história e por vezes é até esquecida.

O primeiro ato apresenta bem os personagens, já do segundo para o terceiro a relação das irmãs é ignorada. O bando de Carcará segue tomando vilas e pilhando cadáveres. Luzia os acompanha consentindo com as matanças e por vezes assumindo a liderança ao lado do cangaceiro. Já Emília mais parece uma hóspede no conforto da família patriarcal de Degas. O único elo entre as duas narrativas são os jornais noticiando a costureira ao lado do bando. Essa desatenção, não só desestabiliza a conexão do espectador pela história das irmãs como se estende demais e começa a abrir desdobramentos desnecessários.

Todavia, o maior equívoco não é só o alongamento de um arco de reencontro previsível. “Entre Irmãs” não está disposto a abordar a dureza do sertão ou o laço entre as costureiras. O diretor Breno Silveira (“Gonzaga: De Pai pra Filho”) se rende ao sensacionalismo televisivo e se perde em relações homoafetivas. O enredo não quer se aprofundar no assunto e trazer à tona discussões. A relação extra-conjugal de Degas com Felipe (Gabriel Stauffer, “A Verdade Obscura”) é equivocadamente demasiada. A rejeição da família era suficiente para o conflito de Emília dar espaço para a misoginia de Degas, expondo a intenção de aproximar a trama do filme a triângulos amorosos de novelas. Como se isso já não bastasse, Emília flerta com a prima de Degas, Lindalva (Letícia Colin, “Um Namorado para Minha Mulher”), que entra em cena apenas para protagonizar cenas de nudez. O final é tão despido de surpresa quanto um novelo que chega ao fim. Vale uma ressalva às atrizes Marjorie Estiano e Nanda Costa, que se entregam a um filme que tem tão pouco a oferecê-las.

Jefferson José
@JeffersonJose_M

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