Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Máquinas Mortais (2018): pateticamente esquecível

Com belos efeitos visuais, o longa tenta construir um novo universo de ficção científica no cinema. Mas o que realmente consegue ser aproveitado nessa trama?

O steampunk é um dos subgêneros mais fascinantes da ficção científica. O visual enferrujado, o vapor para todos os lados, autômatos que caminham entre humanos e a cafonice das roupas são elementos que carregam um forte peso para as histórias. Esses elementos visuais, como em toda boa obra de ficção científica, devem compor a narrativa, mas nunca se sobrepor a ela. “Máquinas Mortais” parte de uma premissa muito interessante, oferece um visual incrível, mas não tem muito mais a oferecer além disso.

O filme mostra a tentativa do mundo de seguir em frente após a Guerra dos 60 Minutos ter devastado uma considerável parcela da população. Os poucos seres humanos que restaram são forçados a viverem em cidades móveis – estruturas gigantescas e mortais obrigadas a atacar cidades menores para se reabastecerem de novos recursos.

O estreante Christian Rivers demonstra uma considerável fragilidade na forma como conduz o longa, o que gera a grande maioria dos problemas. Não há um envolvimento com o ambiente apresentado. A estética é bonita, mas não diz qualquer coisa para quem está assistindo. Esse vazio no conteúdo é notado em especial dentro de Londres, onde a história gasta bons minutos durante o filme mas não mostra muita coisa. O público é obrigado a aceitar o (pouco) que é mostrado sem entender os conflitos sociais presentes no local e sem nem ao menos ter um conhecimento do que de fato Londres se tornou. Com isso o longa se limita a exibir uma cidade gigante que caminha de um lado para o outro.

E Rivers parece ficar ainda mais perdido quando precisa trabalhar seus personagens. Ignorando os (vários) diálogos expositivos, o que resta em “Máquinas Mortais” é um descuido absoluto no desenvolvimento das pessoas em tela. Alguns personagens não chegam nem a ter seus arcos concluídos, desaparecendo do filme sem que o público ao menos saiba o que aconteceu com eles. Hester Shaw (Hera Hilmar, de “Ashram”) é quem acaba sofrendo mais com isso. A protagonista é apresentada com uma personalidade justificada pelo seu passado, mas nada disso parece ter importância, e o roteiro não hesita em transformá-la para poder justificar alguns acontecimentos.

Essa mesma pobreza é perceptível no vilão Thaddeus Valentine (Hugo Weaving, de “Até o Último Homem”). O clichê máximo do vilão é colocado ali, tentando disfarçar seu maniqueísmo com pseudocamadas de profundidade mal exploradas. Por mais que Weaving demonstre ter se dedicado ao papel, parece haver pouco para o ator extrair de um vilão tão mal construído, o que resulta nos clássicos problemas de vilanismo infantil e que não justifica em momento algum suas ações. Mesmo o plot twist guardado para o final, porém previsível desde o início, não afeta a forma como as cenas se desenrolam.

O roteiro ainda entrega um conflito secundário no segundo ato que não apenas não colabora no desenvolvimento da trama, como a impede de seguir por um longo período, tendo como resolução um conceito que abre mão de todo o potencial da ficção científica para ficar simplesmente no óbvio. Surge como uma tentativa de introduzir um segundo vilão, que nem ao menos serve como distração para que o plot principal evolua.

A soma final de “Máquinas Mortais” é de um belo visual que não chega nem a agradar quem assiste ao filme, pois pouco do que é mostrado tem algum significado de fato. Falta uma história bem desenvolvida ser contada através de personagens realmente interessantes. Com isso, essa casca estética apresentada deixa de impressionar ainda no início, forçando que o público busque se divertir com as cenas de ação que ora funcionam, ora tornam-se exaustivamente longas. Um resultado frustrante para um potencial tão grande.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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