Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

A Partida Final (2018): o fim da vida sob uma nova ótica

Um centro médico, um projeto alternativo e cinco doentes em estado terminal mostram as diversas abordagens para o fim da vida.

Filmado na cidade de São Francisco em 2017, “A Partida Final” acompanha as histórias de Bruce, Pat, Kym, Thekla e Mitra. O que essas pessoas com diferentes idades, etnias e vivências têm em comum é que todas as cinco são pacientes terminais, ou seja, possuem doenças incuráveis ou em um estágio no qual não há mais possibilidade concreta de reversão. É surpreendente que o filme, dirigido pela premiada dupla Rob Epstein e Jeffrey Friedman (“Parágrafo 175”), consiga transmitir leveza mesmo tratando de um tema tão delicado.

Os cinegrafistas seguem uma equipe de cuidados paliativos do Centro Médico da Universidade da Califórnia, em São Francisco, composta por médicos, enfermeiros e capelães que conversam com pacientes terminais e com as famílias deles. O objetivo desses diálogos é decidir qual será a melhor opção a ser adotada. A escolha fica entre manter um tratamento “formal” no hospital, receber os cuidados possíveis em casa com a família ou ir ao projeto Zen Hospice, onde uma abordagem alternativa e humanizada é utilizada por profissionais e voluntários.

Enquanto o médico Steve Pantilat apresenta as opções, dando como um dos caminhos o Zen Hospice, o doutor B. J. Miller introduz o público à rotina do projeto. A ideia do local é trazer conforto para os pacientes que já sofrem muito. Há demonstrações das rotinas, de como os enfermos têm liberdade de mudar de escolha e buscar um novo tratamento, por exemplo, e do treinamento pelo qual passa uma equipe de voluntários. O ambiente é apresentado como uma opção alternativa do padrão dos hospitais. O próprio Centro Médico da Universidade da Califórnia já busca ter uma visão diferente, e carrega em uma de suas paredes os dizeres: “nossa missão é cuidar, curar, ensinar e descobrir”. Mas é no Zen Hospice que a ideia dos pacientes entenderem o momento pelo qual passam fica mais evidente.

Os cinco personagens apresentados são vistos quase que de relance. O público não tem uma percepção clara das histórias de vida de cada um por conta do tempo limitado, já que a obra trata-se de um curta-metragem de 40 minutos. Esse distanciamento, porém, acaba por proporcionar uma visão geral positiva. Aquelas pessoas poderiam ser algum parente ou amigo de quem assiste, causando identificação e empatia por eles. Se há um enfoque, pode-se dizer que ele é feito em Mitra e, especialmente, nos parentes dela que vão visitá-la. Mitra e sua parentela são como qualquer família. Os laços de amor que os ligam também impedem que eles tenham uma visão mais racional do momento que vivem.

As famílias sofrem junto aos pacientes, e o sofrimento é registrado como parte de toda essa problemática de lidar com a iminência do fim, mas sem a exploração sensacionalista típica de programas televisivos dominicais. Não há uma trilha sonora emotiva tocando ao fundo em uma crescente gradual, tampouco são usados zooms para registrar e focar as lágrimas dos personagens. Pelo contrário. As câmeras são posicionadas como um expectador passivo, observando de canto as relações afetivas entre todas as pessoas nas cenas.

Esse cuidado estético é sutil, mas faz toda a diferença. As escolhas da dupla de diretores deixam as pessoas menos invadidas, na medida do possível, e proporcionam ao público um panorama pouco discutido sobre o fim da vida. Até mesmo a decisão por ter exatos 40 minutos, possivelmente motivada para que o filme pudesse se qualificar como curta-metragem e participar de festivais como o Sundance, permite que a história não seja desgastante ou pesada demais. Com uma proposta de retratar as conversa, reações e percepções de todos que lidam com a proximidade da morte, “A Partida Final” é um acerto.

Hiago Leal
@rapadura

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