Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Robin Hood – A Origem (2018): tentativa de modernização antiquada

A tentativa de atualizar a história do personagem clássico, misturando a época medieval com a estética atual, fica apenas na tentativa mesmo.

Quase todo mundo conhece a história de Robin Hood, o ladrão que rouba dos ricos para dar aos pobres. Por conta desta fama, muitos já se aventuraram a narrar a sua versão do conto nos cinemas, normalmente apostando em algo que diferencie sua obra das outras. Em 1938, os grandes Michael Curtiz (“Casablanca”) e William Keighley (“Minha Espada, Minha Lei”), trouxeram a sua visão aventureira e cômica, encabeçada pelo carisma do astro Errol Flynn. Em 1991, Kevin Costner (“Estrelas Além do Tempo”), um dos rostos mais conhecidos dos anos 1990, aplicando seu charme, apossou-se do manto verde e do arco e flechas, tornando o personagem um marco em sua carreira de ator. Recentemente, o diretor Ridley Scott (“Alien: Covenant”) decidiu mostrar uma versão mais brucutu do anti-herói e escalou o eterno gladiador Russel Crowe (“A Múmia”) para a empreitada, algo que resultou em uma obra esquecível. Chegamos ao ano de 2018 e o novato Otto Bathurst, com larga experiência em séries como “Peaky Blinders” e “Black Mirror”, achou que era uma boa ideia trazer o gatuno bonzinho de volta em “Robin Hood – A Origem“, mas não sem antes dar um desastroso “banho de loja” na “franquia”.

Robin de Loxley (Taron Egerton, de “Kingsman”) é um lorde bon vivant que se apaixona pela ladra Marian (Eve Hewson, de “Ponte dos Espiões”) e vive um tórrido romance com a garota. Tudo muda de figura quando o maléfico xerife de Nottingham (Ben Mendelsohn, de “Jogador Número 1”) alista o rapaz para as cruzadas no Oriente Médio, separando o casal. Na guerra, o jovem mostra-se um bom soldado, com grande perícia no arco e flecha, até o momento em que é colocado diante de uma injustiça e salva a vida de um combatente do exército inimigo, Little John (Jamie Foxx, de “Em Ritmo de Fuga”). De volta à sua casa, juntamente com o novo amigo, ele descobre que seus bens foram roubados pelo xerife e que sua namorada foi enxotada para as minas, local terrível onde os pobres da cidade residem. Em busca de justiça e vingança, os dois criam um plano para destruir o vilão e a igreja, ao mesmo tempo que melhoram a vida dos miseráveis e criam uma lenda.

O plot, rocambolesco e incoerente, aposta em uma inovação vazia da história. Apesar de vender o filme como uma origem para o personagem, tudo que antecede às histórias já conhecidas de Hood acontece somente nos primeiros 30 minutos de filme… a não ser que você se deixe enganar pelo final medonho. Levando os temas espinhosos dos dias de hoje para o contexto medieval com mãos pesadas, os roteiristas também estreantes, Ben Chandler e David James Kelly, fazem uma mistura incongruente e nada convidativa ou sedutora. Travar a ação para inserir discursos absurdos e óbvios não auxiliam em nada no andamento do longa. O mesmo acontece com as tiradas bobas e nada engraçadas.

Existem casos onde, mesmo com enredos fracos, as obras permanecem ancoradas em eficientes takes de ação ou bom humor, algo que não passa nem perto de acontecer aqui. Se as interessantes primeiras cenas sugerem o clima sujo de guerras modernas, com sons que emulam armas de fogo e bombas, algo se perde feio quando a trama volta para a Inglaterra. Tudo passa a ficar falso e acelerado artificialmente. Apesar de sucessivas, as set pieces não são filmadas de maneira empolgante, ou mesmo interessante. Os erros de continuidade – a jaqueta do herói aumenta e diminui o tempo todo – e mesmo a falta de veracidade nos combates – em um certo momento, Hood passa ileso, como se fosse invisível, por uma horda de combatentes de digladiando! -, constroem, aos poucos, um crescente desdém pelo que se vê na tela, e mais ainda pelos personagens.

A tal modernização da história passa, obrigatoriamente – pelo menos na cabeça de Bathurst -, pelos cenários e também nos figurinos dos atores. Algo que o filme parece se orgulhar de ter criado, mas que já havia sido visto, com muito mais requinte e bom gosto, em “Coração de Cavaleiro” (2001), há mais de 15 anos! Se a ideia era mostrar uma Nottingham viva, moderna e pulsante, o resultado soa apenas brega. Qual é o objetivo ao mostrar uma mocinha – um tipo de personagem que felizmente está caindo em desuso – sempre limpa e maquiada? Mesmo nos momentos em que ela habita as tão temidas minas?

Com atuações canhestas em papeis repetitivos – Ben Mendelsohn, um ótimo ator, precisa se reciclar urgentemente! -, um protagonista sem carisma, humor raso, uma história tola e muita ação vazia, “Robin Hood – A Origem” é um daqueles filmes que prometem muito e não cumprem quase nada.

Rogério Montanare
@rmontanare

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