Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 09 de novembro de 2018

Mentes Sombrias (2018): outra tentativa falha de emplacar uma nova saga adolescente

Ancorado num romance fraco e em confusas motivações, o longa peca pela falta de profundidade, tanto na história quanto em seus personagens.

É correto afirmar que adaptações literárias de livros adolescentes não estão mais em alta, vide o fracasso dos recentes filmes da franquia “Divergente”, que mesmo tendo um elenco formado por bons atores, não conseguiu sair do lugar-comum. “Mentes Sombrias” tenta trazer de volta o sentimento de fascínio que “Jogos Vorazes” deixou, chegando ao ponto de escalar uma das atrizes da saga como protagonista. Mas não adiantou muito, já que ao pegar referências de tudo aquilo que deu certo antes, o longa acaba trazendo os erros consigo, soando repetitivo.

Baseado na obra de Alexandra Bracken, o filme fala sobre um futuro distópico onde crianças e adolescentes são afetadas por uma pandemia. Aqueles que sobreviveram acabam adquirindo poderes sobrenaturais e são enviados para espécies de campos de concentração, aonde são divididos por cores, baseadas em seu respectivo poder. No centro de tudo está Ruby Daly (Amandla Stenberg, a Rue de “Jogos Vorazes”), que com a ajuda de Cate (Mandy Moore, da série “This is Us”) foge de um desses campos, fazendo a função da “superpoderosa rara fugitiva” para que a trama possa andar.

A coreana Jennifer Yuh Nelson (“Kung Fu Panda 2“), faz o que pode na direção de um roteiro que sintetiza o que há de mais clichê nos filmes adolescentes. O enredo e os conceitos daquele universo são explicados em demasia. É como se a cada instante os personagens parassem o que estão fazendo para dizer em que ponto da trama eles estão. E por falar em trama, não é difícil supor o que vai acontecer em seguida. Toda a história é construída para que tal personagem chegue do ponto A ao ponto B, e é exatamente isso que acontece, sem surpresas.

Muito disso se deve ao romance sem química alguma entre Ruby e Liam (Harris Dickinson, “Ratos de Praia”), que parece fazer parte do pacote das sagas adolescentes. Ao dedicar uma parte muito extensa da produção com os dois, o filme acaba perdendo a qualidade – que já era pouca -, e na maior parte do tempo, ancorada na figura da protagonista. Stenberg e sua contraparte na infância, Lidya Jewett (“Estrelas Além do Tempo”), evitam que a adaptação seja ainda mais engessada, com performances de altíssimo nível. As poucas, mas ótimas sequências de ação e perseguição fazem jus ao orçamento, e os efeitos, que começam meio pobres, melhoram com o passar do tempo.

A tentativa de tornar o longa divertido com um humor forçado e coincidentemente em função de um personagem negro vivido por Skylan Brooks (“The Get Down“), se mostra estereotipada, e a trilha sonora por vezes tenta emular algum filme de herói, já que em um enredo repleto de pessoas com poderes sobre-humanos, se torna fácil e cômodo seguir a mesma linha narrativa de obras do gênero.

O principal questionamento é saber se ainda há espaço pra esse tipo de filme, pois público e fãs apaixonados por sagas distópicas não faltam. Querer tomar o posto deixado por um grande sucesso certamente não deveria ser a principal motivação destas novas tentativas. O que se vê é o desperdício de boas histórias que poderiam ser adaptadas de uma maneira mais cuidadosa, afim de que outras tantas tenham seu lugar ao sol.

Tiago Soares
@rapadura

Compartilhe