Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 04 de novembro de 2018

7 Dias em Entebbe (2018): cinema político com técnica, mas sem emoção

Uma ótima equipe, uma história interessante, elenco acima da média... o longa tinha todos os ingredientes para ser um grande filme. Mas no geral não atinge seu potencial, e deixa a sensação de que poderia ter sido mais.

Como falar de um conflito extremamente complexo como o existente entre Israel e Palestina, que dura mais de 50 anos, em menos de duas horas? Uma possibilidade é através de um recorte, utilizando um momento na história para que ele sirva como exemplo para o todo. Assim é “7 Dias em Entebbe”, história real de um sequestro ocorrido em 1976, contada pelo diretor José Padilha (“Robocop”), com roteiro de Gregory Burke (“71: Esquecido em Belfast”), um dramaturgo e roteirista que também tem faro para abordar conflitos políticos/sociais reais.

O Brasil é uma terra muito fértil em quesito de cinema social. Houve o movimento do Cinema Novo, que teve como um dos objetivos escancarar as mazelas do Brasil, e a chamada Retomada do Cinema Brasileiro, da qual Padilha é um dos herdeiros, ao lado de nomes como Walter Salles (“Na Estrada”) e Fernando Meirelles (“360”). Padilha produz filmes inegavelmente políticos, como “Tropa de Elite” e a sua sequência, e até mesmo “Robocop”, para apontar as consequências prejudiciais de conflitos diversos. Este é o caso da guerra por território e reconhecimento entre os povos e culturas de Israel e da Palestina, que levaram milhares de pessoas à morte nas últimas décadas.

É uma pena que o filme não consiga ser marcante ou surpreender, mesmo tendo potencial para tanto. Na história, baseada em fatos, o grupo autointitulado “Guerreiros da Liberdade”, composto por palestinos e simpatizantes alemães, sequestra um avião saindo de Tel Aviv, em Israel, com mais de 200 passageiros. O objetivo é chamar a atenção do mundo inteiro para a guerra que ocorria no Oriente Médio e usar os passageiros israelenses como moeda de troca para libertar prisioneiros palestinos.

O filme começa num palco, durante o ensaio de um espetáculo de dança do coreógrafo Ohad Naharin, com uma poderosa interpretação da canção tradicional judaica “Echad Mi Yodea”. Essa introdução serve como uma metáfora para tudo que será mostrado dali em diante. Os personagens vão se colocando em seus lugares, treinando e se preparando para o que vem pela frente.

A obra se divide em três núcleos. O núcleo principal é o dos sequestradores lidando com o cárcere dos passageiros, apresentado do ponto de vista dos alemães Wilfried Böse (Daniel Brühl, de “Capitão América: Guerra Civil”) e Brigitte Kuhlmann (Rosamund Pike, de “Garota Exemplar”). Outro polo é o de uma bailarina que ensaia para sua apresentação, enquanto seu namorado ensaia para uma operação militar. E também existe o núcleo político de Israel, no qual o primeiro-ministro e seu chefe de defesa discutem como resolver a situação. Tudo é uma preparação para como o cenário do sequestro pode se desenrolar, mas, por conta da quantidade de personagens e da constante mudança de foco, eles acabam ficando subdesenvolvidos, sem a profundidade necessária para a obra.

José Padilha mostra sua qualidade técnica ao navegar com a câmera em planos longos entre os personagens, e indica a diferença de postura deles em relação ao sequestro. Na verdade, toda a parte técnica é bem realizada, seja na edição ágil de Daniel Rezende (“Bingo: O Rei das Manhãs”), na trilha sonora de Rodrigo Amarante, ou mesmo na fotografia de Lula Carvalho (da série “Narcos”), que consegue captar bem a estética dos anos 1970 sem que soe artificial. Contudo, falta coesão ao unir todos esses elementos.

Apesar da adaptação da história real omitir e modificar partes importantes dos acontecimentos para o filme, como o fato do espetáculo de dança visto na obra ter sido montado quase 20 anos depois, ou da operação militar ter consideráveis diferenças do que é mostrado para o que realmente aconteceu, o que mais incomoda é a falta de força da obra. A emoção na história fica em segundo plano. A operação militar não chama a atenção, o sequestro não cria apreensão, é um filme que fica na metade do caminho, como uma música bacana, mas que não empolga.

Seja por problemas na composição da obra (roteiro), por dividir a história e não conseguir explorar com profundidade seus personagens, ou problemas na condução da orquestra (direção), que mesmo com excelentes colaboradores, não conseguiu criar uma peça harmônica e marcante, fato é que, apesar de tudo, “7 Dias em Entebbe” é um filme bem produzido e necessário pelas questões que ele levanta.

Hiago Leal
@rapadura

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