Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 29 de junho de 2017

Meu Malvado Favorito 3 (2017): a falta que a vilania faz

Com a correria vertiginosa de sempre, o terceiro longa deve divertir as crianças, mas relega os adultos quando aposta em tramas rasas aos seus queridos personagens.

Gru nasceu para ser o maior vilão do mundo. Criado por uma mãe vil e insensível, ele cresceu com uma personalidade tão malévola, que acabou atraindo uma tribo de Minions para lhe fazer companhia e lhe ajudar em suas missões malevolentes. Ao esbarrar em uma trinca de garotinhas órfãs, fofas até o último fio de cabelo, o grande malfeitor encontra o amor e desvia de seu propósito. Tempos depois, na continuação da saga, o patifório é atraído contra a sua vontade e acaba trabalhando para um grupo “anti-vilões”, distanciando-se ainda mais de seu destino malévolo; quando encontra ainda mais amor na pessoa da eficaz e estabanada Lucy. Gru está de volta em “Meu Malvado Favorito 3” e agora descobre que possui um irmão gêmeo desconhecido, o Dru, que, assim como ele no passado, sonha em ser o número um da maledicência e quer a ajuda fraterna para tal. Irá Gru desfazer toda a sua saga benevolente em favor de seu “novo” familiar?!

Se você gostou da premissa e por algum momento acreditou que esse grande dilema será desenvolvido por aqui, pode esquecer. Afinal, existe um grande e contínuo problema na trilogia: A falta de coerência. Nesse terceiro filme isso fica ainda mais evidente e insatisfatório, quando o protagonista parece ficar totalmente sem rumo… meio que à deriva em sua própria pessoa. É um vilão que não é vilão. Um espião que não é espião de fato. Um pai que nem sequer é chamado de pai. Porém, infelizmente, essa característica não é uma particularidade encontrada somente no personagem principal. O roteiro do longa procura encontrar uma historinha particular para cada um dos protagonistas: se Gru se vê de frente com um irmão gêmeo totalmente diferente dele, a sua amada Lucy precisa encarar agora o papel de mãe das garotas, que por sua vez, encaram o desafio de encontrar um unicórnio de verdade e de se livrar de um garotinho apaixonado. Até os Minions tem a sua demanda, e ela é “indigestamente” correlata com a saga mostrada no filme solo dos amarelinhos. No entanto, todas essas questões são abordadas das maneiras mais incoerentes – de novo! – e rasas possíveis, e são resolvidas com a rapidez e facilidade de uma piscadela.

Se existe um personagem que ganha um pouco mais de charme com toda essa falta de profundidade geral, é o vilão Balthazar Bratt. Com um visual e estilo que funde todos os esteriótipos possíveis e imagináveis dos exagerados anos oitenta, ele tem mais charme e irreverência do que todo o resto do filme junto. Sua missão, apesar de boba – como devem ser as missões de qualquer vilão de desenho animado – é simples e objetiva: vingar-se daqueles que cancelaram seu show oitentista de sucesso na TV. E ele, como gosta de frisar o tempo todo, é mau!

Apesar da edição e ação frenéticas em demasia, visualmente a animação é bem feita e alguns truques, como o da brincadeira “yin yang” das roupas dos irmãos, acabam mostrando-se bem interessantes. A trilha do brasileiro Heitor Pereira (“Angry Birds: O Filme”) segue na linha dos longas anteriores e é agitada e divertida, assim como as dançantes músicas originais compostas pelo músico Pharrell Williams.

A dublagem nacional, que traz de volta Leandro Hassum (“Até que a Sorte nos Separe 3″), agora em papel duplo, e Maria Clara Gueiros (“Bolt”) como Lucy, continua muito eficaz. Hassum inclusive cria uma persona toda particular e interessante para Dru, distanciando-se da original concebida por Steve Carrel (“A Grande Aposta”). Mas a escolha perfeita mesmo foi a do ícone dos anos oitenta Evandro Mesquita (“Brasilia 18%“) para dublar o vilão Bratt. Sua singularidade de atuação/persona é tão óbvia para o personagem, que acaba sendo um verdadeiro achado para o filme.

“Meu Malvado Favorito 3” é um longa que agradará as crianças em cheio pelo seu característico e frequente – nos dias de hoje – ritmo frenético. Contudo, um roteiro bem escrito e um desenvolvimento de personagens eficiente, como já vimos antes nos inesquecíveis “Ratatouille” e “Divertidamente” ou pelo menos próximo da “gracinha” que é o primeiro filme da trilogia, faria muito bem a nós adultos que, afinal, precisamos levar as crianças ao cinema!

Rogério Montanare
@rmontanare

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