Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Resident Evil – O Capítulo Final (2017): um “game over” abaixo da média

Quinze anos depois, creio que as esperanças para um bom filme com versões decentes dos personagens dos games que originaram a franquia já foram pelo ralo. O que os fãs esperavam aqui era uma conclusão razoável para esta longeva série. E não vão encontrar nada disso.

A cronologia da série “Resident Evil” nos cinemas sempre foi um tanto… peculiar. Apesar de sempre ter sido “cuidada” pelo cineasta Paul W.S. Anderson (que produziu todos os longas e escreveu e roteirizou a grande maioria destes), os cliffhangers no final de cada filme nem sempre faziam sentido com o começo do capítulo seguinte, com personagens sumindo e situações mudando radicalmente sem muitas explicações.

Pois bem, este “Resident Evil – O Capítulo Final”, novamente comandado e roteirizado por Anderson, veio com a promessa de fechar a saga da heroína Alice (Milla Jovovich) de vez. Para variar, o que vemos logo de cara na tela não tem nada a ver com o final do episódio anterior, que havia mostrado Alice e o vilão Wesker (Shawn Roberts) se unindo com outros personagens famosos da franquia como Ada Wong, Leon S. Kennedy e Jill Valentine em uma resistência final contra o computador Rainha Vermelha e os monstros criados pelo T-Virus.

Aqui, Leon, Jill e Ada não dão as caras (nem seus destinos são explicados) e Alice foi traída por Wesker (nada disso aparecendo em tela, diga-se). Sem poderes, ela tenta sobreviver no apocalíptico mundo infestado por criaturas perigosas, quando é contatada pela Rainha Vermelha (Ever Anderson, a estreante filha de Jovovich e Anderson) com a proposta de livrar o mundo do T-Virus de vez, através de um antivírus transmitido pelo ar. Para isso, Alice teria de voltar à Colmeia, base central da Corporação Umbrella e cenário do primeiro filme “Resident Evil – O Hospede Maldito”, tendo de passar por Wesker e pelo seu chefe, o Dr. Isaacs (Ian Glen, de “Game of Thrones”).

Lendo essa premissa, o público poderia achar que se trataria de um final com várias referências aos filmes anteriores e que fecharia a história de uma maneira satisfatória aos fãs que vêm acompanhando a série no cinema desde 2002. Bom, alguns trechos dos filmes são exibidos durante a narrativa, mas nada encaixa de fato com os fatos antes estabelecidos pela série.

Se eu fosse listar todas as contradições e incongruências do filme em relação aos seus antecessores, esse texto teria dez laudas. Basta dizer que a “origem” de Alice e do próprio T-Virus apresentada aqui contradiz tudo o que havia sido estabelecido anteriormente pela série, o que não seria um problema tão grande se o próprio filme não nos lembrasse constantemente disso ao apresentar flashbacks da fita original e até referências visuais nas cenas de ação do terceiro ato.

Após um longo prólogo estabelecendo o confuso background deste “Capítulo Final”, temos um primeiro ato extremamente repetitivo onde Alice é nocauteada três vezes e acordando em situações de perigo. As ações de Isaacs ganham vieses religiosos (característica inédita no personagem até aqui) e a atuação canastrona de Ian Glen parece até fazer sentido dentro da trama em dado momento, mas se revela apenas má atuação mesmo. Já o Wesker de Shawn Roberts continua sendo apenas um vilão patético, agora inexplicavelmente reduzido a subalterno de Isaacs.

E aí temos Alice. A personagem de Milla Jovovich começou como uma durona heroína de ação, ganhou e perdeu superpoderes, ganhou um exército de clones e… bom, chegou um ponto onde Anderson parece tão perdido sobre quem é a pobre moça que ele simplesmente desistiu de escrever algo coerente. Ao menos os fãs de Jovovich podem se contentar com o fato de que a musa de ação continua em boa forma.

Ali Larter retorna como Claire Redfield após ter sumido do filme anterior. Não há explicação nenhuma sobre o que aconteceu com a personagem e Larter também não faz muita coisa além de servir como uma apagada parceira para Jovovich, algo que deve irritar os fãs dos games, pois Claire é a única heroína de lá a aparecer neste “Capítulo Final”. Ruby Rose (da série “Orange is the New Black”) e os pouco conhecidos Eoin Macken, Fraser James e William Levy também “marcam” presença como os nada marcantes companheiros da vez de Alice.

Anderson se sai um pouco melhor comandando as cenas de ação do que como escritor. As megalomaníacas setpieces funcionam até que bem, apesar de serem tão exageradas que mais fazem rir do que criar suspense ou impressionar, e o design das criaturas e dos sets são razoavelmente decentes (embora os tanques com iscas para zumbis não sejam lá muito práticos).

Até mesmo pelo público já ter investido quase quinze anos acompanhando as desventuras de Alice, existe sim algum retorno emocional em ver a jornada da personagem chegando a um fim. Por mais idiota e pouco conclusivo que este seja.

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Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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