Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 16 de março de 2015

O Sétimo Filho (2014): um amontoado de clichês sabotou o filme

Uma partida de RPG pode ser extremamente divertida, desde que a aventura seja interessante, os jogadores se mostrem engajados e se o mestre do jogo for competente. Se um ou mais desses elementos falharem, o resultado será uma confusão generalizada onde ninguém sai satisfeito. Isso é o que ocorre nesta fraca fantasia.

imageApesar de contar com um elenco repleto de grandes nomes e efeitos competentes, “O Sétimo Filho”, adaptação da série literária criada por Joseph Delaney, decepcionou feio nas bilheterias estadunidenses, sendo o primeiro grande fracasso do ano – custou US$ 95 milhões e arrecadou pouco mais de US$ 17 milhões, antes de desaparecer das listas de filmes mais vistos.

Ao contrário do que acontece com certas fitas, cujos desastres financeiros são inexplicáveis, é fácil entender o que aconteceu com o longa de Sergei Bodrov (do eficiente “O Guerreiro Genghis Khan”). Contando com um roteiro que mais parece uma colcha de retalhos formada de clichês do gênero de fantasia, personagens chatos e desprovidos de motivações e atores que, em sua maioria, parecem não saber o que estão fazendo ali (além de garantir o dinheiro para reformarem suas casas), o resultado final deixa transparecer a falta de paixão dos envolvidos para com um o projeto. Mas me adianto.

A trama mostra um mundo medieval onde seres sobrenaturais são caçados por uma antiga ordem, cujos membros são popularmente conhecidos como Caça-Feitiços. O último que resta do grupo é o constantemente ébrio Mestre Gregory (Jeff Bridges) que, anos antes, aprisionou a maior das bruxas, Mãe Malkin (Julianne Moore). Após um evento chamada lua de sangue, Malkin escapa e começa a reunir seu exército para – é claro – dominar o mundo. Para impedir a bruxa, Gregory “compra” um novo aprendiz, Tom Ward (Ben Barnes), que está – é claro – tem um destino a cumprir e se apaixona – é claro – por Alice (Alicia Vikander), bruxa mestiça sobrinha de Malkin.

Os personagens não possuem rumo, motivações ou arcos narrativos discerníveis além de chavões costurados, os poderes e habilidades dos seres que surgem naquele mundo jamais são explicados ou colocados de um modo que faça sentido dentro da narrativa – bruxas e magos se transformam em dragões, porque sim – elementos dramáticos são mal explorados… É como se os envolvidos achassem que o público ignoraria esse problema só porque tem um guerreiro, um bárbaro, um mago uma ladina e alguns dragões/bruxas em uma tela IMAX.

É incompreensível como intérpretes do calibre de Jeff Bridges, Julianne Moore, Olivia Williams e Djimon Hounsou foram tão mal usados por Bodrov e pelo guião escrito pela dupla Charles Levitt (“Sempre Amigos”) e Steven Knight (do ótimo “Senhores do Crime”). Se bem que é por conta desses atores gabaritados que a produção não se torna uma perda de tempo ainda maior, especialmente por conta de Bridges, que vive Gregory como se este fosse o filho impossível de Gandalf e do Dude, de “O Grande Lebowski”.

Ben Barnes, que deveria ser o protagonista, desaparece em cena toda vez que é colocado para contracenar com qualquer outro ator. Sem carisma, o outrora Príncipe Caspian da franquia “Nárnia” consegue o milagre de empalidecer se comparado com Kit “Jon Snow” Harrington, que em cinco minutos de cena consegue deixar uma impressão maior que aquele que deveria ser o herói da história.

Nem mesmo quando um evento trágico é revelado para Tom este apresenta um sinal de emoção. A química entre Barnes e Alicia Vikander é quase inexistente, com o casal ainda caindo no irritante “nunca te vi, sempre te amei”, uma combinação que torna o elemento romântico entre os dois um verdadeiro porre.

Apesar de justificar seu inchado orçamento com efeitos especiais e um design de produção relativamente eficiente (embora nem mesmo a versão IMAX salve o inútil 3D), as cenas de ação não chamam muito a atenção – com exceção de um tenso exorcismo no começo da projeção, demonstrando a falta de esmero do diretor na confecção do filme. A despeito de um óbvio gancho para uma continuação, é altamente improvável que novas aventuras de Tom Ward venham a ganhar as telas – ou que esta fita gere algum interesse do público em eventuais continuações.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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