Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Emak Bakia! (2012): um road movie nada comum sobre uma obra surreal

Inspirado pela obra (quase) homônima do surrealista Man Ray, o documentarista Oskar Alegria embarca em uma jornada para descobrir os diversos significados da expressão basca que dá título ao filme.

la_casa_emak_bakia“Emak Bakia” é uma expressão do idioma basco que quer dizer, de maneira ríspida, “Deixe-me em paz”. Também é uma casa perdida, próxima à comuna de Biarritz, onde o dadaísta e surrealista Man Ray, em 1927, filmou partes do seu cinepoema, tendo tirado o título do referido curta-metragem daquela residência, sem saber de seu significado – que muito se aplica àquela obra.

Mais de 80 anos depois, outrosignificado é agregado. “Emak Bakia!” é um documentário escrito e dirigido pelo cineasta Oskar Alegria, que presta homenagem ao filme de Man Ray. Além disso, se trata de um road movie tão pouco usual quanto a fita homenageada, com a jornada tendo como ponto de partida apenas um velho poema visual experimental e fotografias antigas.

A película retrata a busca de Alegria por aquilo que inspirou Man Ray no título de seu cinepoema. A procura pela casa que foi palco das experimentações fílmicas do já falecido artista surreal poderia, de modo objetivo, ser resumida em uma caminhada de meros 14 quilômetros. No entanto, o diretor passa longe de querer tomar o caminho mais curto para sua meta.

Durante os 87 minutos de projeção, Alegria disseca cada fotograma da fita original, inclusive refazendo algumas de suas sequências usando sua própria sensibilidade. Tal empreitada não visa encontrar lógica em uma sequência onírica de imagens. Este seria um esforço em vão e egoísta, que contrariaria o caráter subjetivo do movimento do qual Man Ray fazia parte.

O que o cineasta deseja com essa viagem é encontrar os outros significados para “Emak Bakia” que se originaram do trabalho de Man Ray, expondo também para o público o que ele enxergou nas ilusões de luz e sombras projetadas naquela película.

Assim, o que temos não é uma pálida imitação do que fora feito anteriormente ou o retrato frio de algo desconhecido do grande público, mas a luta de um homem para que o motivo de sua adoração por aquela obra artística incomum seja compreendida, relatando o impacto que esta lhe causou e a outros, recorrendo até mesmo a um peculiar retrato histórico sobre o local de sua feitura.

Ao replicar o estilo livre que Man Ray usava em seu corpo de trabalho, o documentário vai e volta em suas andanças, falando sobre praias, ovelhas, despertares e praias. No decorrer da produção, porém, essa liberdade excessiva revela-se como uma faca de dois gumes.

Ao aumentar o escopo do objeto de estudo do cineasta, frutos preciosos surgem na tela, como a descoberta de uma fascinante princesa romena. Ao mesmo tempo, isso também deixou Alegria divagar por demais, saindo inclusive de seu tema, desperdiçando longos minutos com um palhaço, sem ligação com a proposta-título, em momentos que não se encaixam com o restante do filme (algo irônico, considerando a inspiração surrealista deste).

É arte sobre arte, em suas mais diversas formas, seja cinema, fotografia, dança, moda, música, poesia ou arquitetura. O motivo dessa extravagância visual é altamente passional e é com essa paixão que Alegria e aqueles que são entrevistados por ele pintam o retrato do que significa Emak Bakia para eles e como foi possível dotar essa expressão de sentidos tão particulares.

Esse filme fez parte da programação do 23º Cine Ceará – Festival Ibero-americano de Cinema, em setembro de 2013.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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