Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 21 de junho de 2007

Pulp Fiction – Tempo de Violência

Uma impecável obra prima de Quentin Tarantino. Definitivamente, não seria possível transformar em simples expressões tamanha competência que tornam este um dos melhores filmes de todos os tempos na história do cinema. A começar por um elenco impressionante e passando por todos os quesitos restantes, o longa renova em idéias e consegue alcançar um nível de qualidade incrível, podendo ser facilmente considerado como perfeito.

É muito difícil e, ao mesmo tempo, muito fácil falar sobre “Pulp Fiction”. Afinal, como conseguir descrever uma verdadeira aula de cinema concedida por um dos melhores cineastas de todos os tempos? Resumindo basicamente a história, o público se depara com uma inebriante e alucinante trama contada com muita eloqüência por parte de Tarantino. Retratando detalhes da vida dos gângsters, o filme traz um um verdadeiro elenco estrelado para viver eletrizantes reviravoltas onde diversas situações envolvem diferentes personagens que se relacionam de maneira impressionante. Situada em Los Angeles, a história traz uma série de acontecimentos onde a violência e o submundo do crime caminham lado a lado. Dentre as principais histórias contadas, temos os gângsters Vincent Vega (John Travolta) e seu parceiro Jules Winnfield (Samuel L. Jackson), o boxeador Butch Coolidge (Bruce Willis) e o chefão da máfia Marcellus Wallace (Ving Rhames) e sua mulher Mia Wallace (Uma Thurman). Todos os personagens estão de alguma maneira relacionados. No entanto, esse é só um prefácio para a inacreditável trama que Tarantino desenvolve e o público só será capaz de entender o que digo ao final do filme.

Não poderia começar de outra maneira senão idolatrando a competência de Quentin Tarantino no roteiro e na direção do longa. Quando o assunto é a tal trama escrita pelo cineasta, podemos nos deparar com uma mistura de minuciosos detalhes que compõem um complexo quebra-cabeças de fatos. Quando o espectador pensa que se vê livre de uma dessas situações, ele mergulha de cabeça em outra mais absurda (no sentido positivo da palavra) ainda. Além disso, é absolutamente fantástico observar os diálogos e a comicidade desenvolvidos no roteiro. Com todos os méritos possíveis, Tarantino traz conversas entre os atores que realmente retratam temas cotidianos e, ao mesmo tempo, consegue aliar simplicidade e sofisticação de maneira primordial. O humor é algo realmente a parte no longa. É claro que o excelente time de atores consegue enaltecer ainda mais esse aspecto. No entanto, é impossível não ver a parcela de criatividade do cineasta na contribuição para o lado cômico da história. Até mesmo em cenas inusitadas (como o encontro do mafioso Marcellus com Butch após a fuga do boxeador e a morte de Vincent Vega), o público é confrontado por doses precisas de comicidade e ironia.

Conforme comentei anteriormente, destaco também o excelente trabalho de direção desenvolvido por Tarantino. Planos, escolha e controle de elenco, condução da trama, exploração de características das personagens, momento exato para ápices de cenas, ênfase em determinados sentimentos e emoções que seriam transmitidos ao público e até referências a formas de arte (como a maleta com conteúdo dourado de Marcellus e o movimento de mãos de Mia ao falar que Vincent Vega era um “quadrado” – simbolismo total), enfim, todos os fatores podem exemplificar a tamanha competência do diretor. Aliado ao também ótimo trabalho do restante da equipe técnica, como a produção (que inclui o veterano de Hollywood Danny DeVito), o trabalho de montagem de Sally Menke e a direção de fotografia de Andrzej Sekula, o filme consegue obter um resultado sensacional, sendo esse um quesito chave para o seu grande sucesso e, conseqüentemente, passar a ser visto como inovador e base de inspiração para outros projetos desenvolvidos ao longo dos anos.

Mais difícil ainda é conseguir encontrar adjetivos que sejam suficientemente capazes de colocar no topo do mundo o elenco magnífico que Tarantino reuniu para o filme. A começar pela dupla John Travolta e Samuel L. Jackson, indicados para o Oscar respectivamente para os prêmios de Melhor Ator e Melhor Ator Coadjuvante. Posso afirmar sem sombra de dúvidas que este foi um dos melhores trabalhos nas carreiras memoráveis dos dois atores, que mostram atuações inesquecíveis em “Pulp Fiction”. Poderia ficar horas enaltecendo um por um o restante do elenco, mas apenas os citarei e resumirei todos com uma simples palavra que não faz jus ao trabalho que fizeram: brilhantes. Uma Thurman (Mia e o uso excessivo de drogas), Bruce Willis (Butch e a violência escancarada), Harvey Keitel (Winston e a sabedoria e tranqüilidade incomparáveis), Tim Roth (Pumpkin e o temperamento explosivo mas, ao mesmo tempo, consciente), Eric Stoltz (Lance e novamente o uso de drogas excessivo com o humor) e Ving Rhames (Marcellus e a tal autoridade de chefão). Absurdamente brilhantes! Outros destaco um tanto quanto de maneira menos vibrante, já que não vejo como tão marcantes assim. Trata-se de Rosanna Arquette e Maria de Medeiros que, honestamente, não vi nada que me chamasse tanto atenção. Talvez porque suas atuações não se destacaram tanto perante aos “monstros” que estavam aos seus lados. Não digo que foram ruins, apenas não acrescentaram tanto quanto o restante do elenco. Para completar, não poderia deixar de frisar as “pontas” sensacionais de outros dois seres mitológicos dos cinemas: Christopher Walken e o próprio diretor e roterista Quentin Tarantino. Repito que a tal dose de humor, sentimentos ou emoções são dosadas nas medidas exatas por estes dois atores que, apesar de mal aparecerem no filme, conseguem exemplificar perfeitamente o que digo sobre os tais aspectos de interpretação, que são seguidos rigorosamente por todos os outros atores.

Para completar a magnitude do filme, jamais poderia esquecer de uma das trilhas sonoras mais marcantes do cinema. Canções que não só se encaixam oportunamente dentro da história, mas também têm o dom de completar as intenções dos atores, auxiliando até mesmo nas reações do público em determinadas cenas e ainda dando um ar totalmente original. Afinal, o que seria da cena de dança de John Travolta e Uma Thurman sem o twist dançante que torna tão envolvente a tal seqüência? Não é a toa que até quem nunca viu o filme deve imaginar de qual cena me refiro. Simplesmente um marco na história! Digo o mesmo para a canção tema “Miserlou” e “Girl, You’ll Be A Woman Soon”, da banda Urge Overkill.

Enfim, sinto-me até injusto em não conseguir expressar tudo o que realmente essa impecável obra merece. É mais do que óbvio que ela não consiga agradar a gregos e troianos até mesmo pelo seu gênero diversificado e único. No entanto, a meu ver, dez estrelas chegam a ser hipocrisia e covardia para um filme como esse, que foge completamente dos padrões tradicionais e até mesmo alternativos do cinema. Com certeza, como já disse mais de uma vez, é algo completamente original e inovador. Cinéfilo ou não, não deixe de conferir para que você possa entender através deste filme porquê o cinema é algo inexplicavelmente maravilhoso.

Ícaro Ripari
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