Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Bruxa de Blair (2016): remake disfarçado de sequel descartável

Repetindo a estrutura narrativa do filme de 1999, o roteiro é preguiçoso. A direção também não é criativa: repete cenas e não inova na linguagem de found footage, apesar de aproveitar as novas tecnologias. O original é melhor.

A versão de 2016 de “Bruxa de Blair” é um remake disfarçado de sequel e que quer funcionar como reboot. Isto é, na essência, repete muito do longa de 1999 – como faz um remake –, por outro lado, tem como premissa narrativa os acontecimentos do primeiro (e acerta ao ignorar completamente o péssimo segundo filme) – como faz um sequel –, entretanto, quer retomar a franquia para talvez ter continuações – como um reboot. Vale a regra: o original (“The Blair Witch Project”, de 1999) é melhor.

O argumento é de continuação: 16 anos após o sumiço da irmã Heather (no filme de 1999), James (James Allen McCune) reúne três amigos para retornar à floresta em que ela foi vista pela última vez – depois, ao grupo se juntam dois outros jovens que conhecem melhor o local. A partir disso, é tudo imitação da película inicial a que esta se refere, com exatamente a mesma estrutura narrativa e cenas idênticas. Não houve uma reinvenção, e sim uma atualização: como no original, o longa utiliza a linguagem de found footage (a filmagem é feita pelas próprias personagens, como se fosse um documentário), com a novidade (que não é mérito, mas obrigação) de aproveitar as novas tecnologias.

Não que tal metodologia de filmagem tenha sido criada em 1999, mas “The Blair Witch Project” foi precursor de um subgênero dentro do terror (dando ensejo a “[REC]” e “Atividade Paranormal”, dentre outros), que agora está desgastado em razão da sua banalização. Diante do esvaziamento inventivo (na narrativa e na técnica de gravação), caberia uma atualização. Assim, com imagens de boa resolução, as personagens (o elenco não compromete) usam um drone e câmeras auriculares. Porém, o potencial não é aproveitado: exceto por uma cena estática, o drone serve apenas para planos gerais da floresta. Quanto às câmeras auriculares, a ocularização interna (terminologia de François Jost) – ou seja, a exposição da perspectiva das personagens (câmera subjetiva, premissa do found footage) – é bastante eficaz para manipular o espectador, agregando na atmosfera assustadora. O mesmo vale para as lanternas, que concentram o foco do olhar do público para o centro da tela, ignorando regiões periféricas onde muito pode acontecer.

Entretanto, nada disso é novo. Adam Wingard acaba fazendo uma direção sem originalidade alguma, com uma fórmula defasada e que clama por revitalização. Por seu turno, Simon Barrett elabora um roteiro reciclado, recheado dos clichês do subgênero e altamente previsível. Ainda que seja ignorado o argumento pouco crível – James tinha apenas 4 anos de idade quando a sua irmã sumiu (e não foi encontrada pelas autoridades responsáveis pelas buscas), não obstante, 16 anos depois, ele consegue levar mais três amigos para adentrar numa floresta desconhecida e inabitada onde haveria uma bruxa –, são poucos os trunfos do plot. Por exemplo, a instabilidade da fluidez da passagem do tempo é um bom elemento (pouco aproveitado); por outro lado, o uso da câmera para não olhar a bruxa não é inédito (Perseu que o diga). A edição de som é ótima (uivos, passos na floresta); a mixagem, tumultuada nos momentos mais intensos, tornando-se incômoda. Nada novo. Jump scares? Sim, nenhum especialmente memorável.

Em síntese, faltou criatividade à direção e sobrou preguiça no roteiro. Exceto pelo desfecho, onde reside o zênite do design de produção (com riqueza de detalhes e mesmo um vislumbre da bruxa), trata-se de um terror descartável. Distante da mudança de paradigma causada pelo filme de 1999, cairá na vala do esquecimento.

Diogo Rodrigues Manassés
@diogo_rm

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