Cinema com Rapadura

Críticas   segunda-feira, 06 de abril de 2015

Velozes e Furiosos 7 (2015): uma despedida digna para Paul Walker

Eficiente e surpreendentemente emocionante, este sétimo exemplar da longeva e rápida franquia reúne um time dos sonhos dos heróis de ação em mais uma aventura tão divertida quanto absurda.

Meio que por acaso, meio que por desígnio, “Velozes e Furiosos 7” acabou por se tornar um animal bem diferente do filme original, lançado em 2001, que era basicamente um “Caçadores de Emoção” onde as pranchas de surfe foram substituídas por carros tunados. Mesmo assim, o DNA de máquinas rápidas, mulheres lindas e adrenalina desenfreada jamais foi esquecido.

No decorrer desses 14 anos (UAU!) a franquia passeou pelos subgêneros de exploitation, roubo, teve um interlúdio meio “Karate Kid – A Hora da Verdade” e se metamorfoseou em algo que mistura “Missão: Impossível” e “Os Mercenários”, mas com uma personalidade própria, adquirida durante sua longeva corrida, ganhando inclusive uma intrincada cronologia.

Apesar do diretor Justin Lin e do roteirista Chris Morgan terem entrado para a equipe no terceiro filme, foi a partir do quarto longa, com o retorno do elenco original, que a série tomou os rumos atuais e se tornou a máquina bem lubrificada que é hoje. Mesmo com Lin dando lugar a James Wan (mais conhecido por filmes de terror como “Jogos Mortais” e “Invocação do Mal”), este sétimo capítulo não perde o ritmo imposto pelos seus antecessores.

Infelizmente, uma tragédia real acrescentou um elemento emocional à produção que, por coincidência, já começa com a família Toretto tendo de lidar com a perda de um de seus membros – Han (Sung Kang), que finalmente alcançou seu fatídico destino mostrado em “Velozes e Furiosos – Desafio em Tóquio”.

Os amigos de Dom Toretto (Vin Diesel) estão sendo caçados pelo mercenário Deckard Shaw (Jason Statham), irmão do vilão da fita anterior. Han é a primeira vítima e o grandalhão Agente Hobbs (Dwayne Johnson) é mandado para o hospital logo depois pelo novo antagonista, que demonstra de cara que não está para brincadeiras.

Isso obriga Dom, Brian (Paul Walker, em seu último trabalho) e o resto do grupo a recorrerem à ajuda de uma agência de inteligência, liderada pelo misterioso Sr. Ninguém (Kurt Russell) para deter o quase indestrutível inimigo. Só que o próprio Ninguém tem planos para a trupe, que envolvem o resgate da hacker Ramsey (Nathalie Emmanuel) e de um dispositivo perigoso que estão nas mãos de um terrorista (Djimon Hounsou) que pretende…

Bom, ninguém se importa com isso. O roteiro é apenas uma desculpa (e esfarrapada) para que a produção explore os pontos fortes da série, que são as cenas de ação absurdas e as interações carismáticas entre um elenco de química impecável, pilares da franquia que funcionam maravilhosamente aqui.

O fato de que o guião é repleto de situações estapafúrdias e que tem um MacGuffin roubado do seriado “Person of Interest” não interfere em absolutamente nada na diversão que o filme oferece, até mesmo porque este não se leva a sério em quase nenhum momento, com uma exceção sobre a qual falarei depois.

Mesmo que alguns dos plots sejam desenvolvidos com uma sutileza de um elefante assistindo a uma novela mexicana, algo que se aplica especialmente no enlace entre Dom e a ainda desmemoriada Letty (Michelle Rodriguez), reencontrar esses personagens dá a sensação de rever velhos amigos, algo fundamental para que o público entre na brincadeira.

No decorrer da aventura, vemos que esta é uma verdadeira carta de amor à série, homenageando cada um dos capítulos anteriores, expandindo e fechando arcos iniciados anteriormente. Figuras como Hector (Noel Gugliemi) e o gaijin Sean (Lucas Black) reaparecem mesmo que rapidamente, relembrando o público que, por mais que “Velozes” tenha mudado, ainda se trata do mesmo universo.

Dentre os superlativos números envolvidos na fita, temos quatro montadores e dois diretores de fotografia empregados pela produção. De algum modo, James Wan conseguiu com que essa equipe extremamente plural, somada com a equipe de dublês e o pessoal dos efeitos especiais, alcançasse um visual único para as setpieces amalucadas que acontecem no decorrer dos quase 140 minutos da projeção.

O resultado é uma narrativa onde carros saltam entre prédios facilmente e caem literalmente de paraquedas em meio a insanas perseguições sem que o público tenha a impressão de estar assistindo um desenho do Pernalonga. Sim, há um elemento cartunesco e exagerado nas cenas de ação e um caráter de indestrutibilidade nos personagens (especialmente em Shaw), mas isso jamais interfere na tensão das seqüências nem no resultado final do produto. Destaque para o insano resgate de Ramsey e o duelo final em Los Angeles, que basicamente demole a cidade inteira,

Vin Diesel assume com naturalidade o papel de protagonista e “alfa” do filme. A despeito de dividir a tela ao lado de nomes como Statham, Johnson, o tailandês Tony Jaa (da franquia “Ong-Bak”) e, especialmente, Kurt Russell, o filme jamais diminui a presença ou a importância destes para afagar o ego do ator principal, ressaltando assim a imponência de Toretto. A carreira de Russell é respeitada com um personagem digno de alguém que já foi Jack Burton e Snake Plissken, Dwayne Johnson se mostra como o Hulk da franquia e Statham vive um antagonista que faria o T-1000 corar, mas nenhum deles ofusca Vin Diesel e sua postura de pai daquela família.

Há alguns momentos que são presentes para os fãs, como ver Hobbs dando o golpe final que era a marca registrada de The Rock na época de luta-livre ou o combate entre Michelle Rodriguez e Ronda Rousey (a segunda vez que Letty enfrenta uma adversária interpretada por uma lutadora profissional). Mas as grandes emoções vão para o arco de Brian e Mia (Jordana Brewster), praticamente improvisado após a morte de Paul Walker no meio das filmagens. Não só este faz sentido dentro da narrativa, mas também fecha a participação de Brian na série de uma forma orgânica, permitindo a seus amigos uma despedida tocante, que fala tanto do personagem, quanto do ator.

Por si só, “Velozes e Furiosos 7” seria imperdível para os apreciadores do bom cinema de ação, como uma divertidíssima montanha-russa cinematográfica. Mas, através deste longa, os colegas de Paul Walker conseguiram dar uma despedida digna para um profissional que era tido como uma das pessoas mais queridas do meio, funcionado até mesmo como uma experiência catártica para os fãs de Walker.

P.S.: Assim como em “Noé”, o filme foi lançado para o mercado latino-americano em 3D, o que não ocorreu nos EUA. Assim, a conversão deixou muito a desejar e não acrescenta nada à produção. Entretanto, o espetáculo audiovisual proporcionado vale o ingresso mais caro de uma sessão IMAX tranquilamente.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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