Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 24 de outubro de 2014

O Apocalipse (2014): Nicolas Cage em mais uma de suas “bombas”

Ator aumenta sua lista de filmes grotescos com mais um onde praticamente nada se salva.

oapocalipseO fim do mundo sempre esteve na moda. Deixando a história de lado e focando apenas no cinema, o próprio Nicolas Cage já fez, além desse, trabalhos com temática semelhante, como em “Presságio” (2009). Coincidência ou não, ambos são longas absolutamente bizarros, onde pouca coisa ou praticamente nada se salva do desastre completo. E por “desastre completo”, eu me refiro não ao apocalipse visto em tela, mas à péssima (falta de) qualidade das obras em si.

Neste “O Apocalipse”, remake da trilogia “Deixados Para Trás” iniciada em 2001 e baseada na série de livros homônimos, temos uma premissa que bebe basicamente da mesmíssima fonte que a recente nova série da HBO, “The Leftovers” (até o título original é bastante semelhante: “Left Behind”); de repente, e sem explicação aparente, milhões de pessoas simplesmente somem ao redor do mundo, nas mais variadas circunstâncias. Tal evento, que na série ficou conhecido, dentre outros nomes, como o “arrebatamento”, gera caos e desordem, fazendo com que a sociedade se desestabilize e procure razões para o ocorrido.

Em meio a tal cenário desolador, acompanhamos um grupo dos “deixados para trás” que buscam seguir em frente. Nicolas Cage vive o piloto Ray Steele, pai de uma família desestruturada e, ao que tudo indica, infiel à esposa Irene (Lea Thompson), uma fanática religiosa. A filha do casal, a bela Chloe, que mora fora e veio visitar a família no aniversário do pai, é uma cética que desdenha das crenças da mãe. Quando o personagem de Cage precisa fazer um voo na data especificada, isso gera uma tensão familiar que, após o “arrebatamento”, será posta a prova em duas linhas narrativas equilibradas de maneira artificial e pouco envolvente.

Partindo de meras caricaturas na construção de seus personagens, o roteiro de Paul Lalonde e John Patus peca pela falta de sutileza; nessa e em quase todas as outras questões. Temos o herói inabalável, o já citado pai de família em um momento difícil, a jovem bonitinha e musa do herói (ainda que ambos tenham acabado de se conhecer no saguão do aeroporto) e, mesmo no avião, as figuras são extremamente constrangedoras, tamanha apelação e falta de criatividade: o anão bad boy, o árabe que todos desconfiam ser um terrorista, o asiático ligado em tecnologia, o casal de velhinhos, a mãe desesperada e por aí vai. Até as referências bíblicas, essenciais para o desenrolar da trama, são colocadas de modo altamente grosseiro e superficial, sem qualquer tipo de reflexão mais profunda.

Do ponto de vista técnico, o filme também não apresenta nada que o torne particularmente diferenciado. O diretor Vic Armstrong conduz a narrativa de modo burocrático, apoiado por uma fotografia que não adiciona nenhuma camada de significado, e uma trilha sonora que também não pontua bem os momentos de tensão e ação, sendo basicamente dispensável da construção dramática do longa. Mesmo a montagem paralela, com seus bem realizados truques de passagem de cena, ainda que também pouco sutis, não é suficiente para prender a atenção do espectador de maneira satisfatória, com as tramas sendo equilibradas de forma tosca e nada natural, fazendo com que a junção das narrativas no terceiro ato se torne algo completamente bizarro.

É inacreditável a capacidade de Nicolas Cage em escolher mal os seus papéis. Parece que o ator não tem um filtro que separe roteiros bizarros e roteiros arrumados. O que é uma pena, pois apesar de não achá-lo um grande profissional, ele sem dúvidas tem muito mais potencial do que o que costuma apresentar nessas “bombas”. “O Apocalipse” é apenas mais um desses casos, com uma história boba, sem sal e construída de maneira pedestre e artificial, apoiada em uma parte técnica também de péssima qualidade, aumentando a lista de filmes grotescos protagonizados pelo astro de Hollywood.

Arthur Grieser
@arthurgrieserl

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