Cinema com Rapadura

Críticas   sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Annabelle (2014): filme traz pânico em forma de boneca

Spin-off de “Invocação do Mal” rende bons sustos e revigora a tradição dos brinquedos assustadores do cinema de horror.

Transformar brinquedos aparentemente inocentes em vilões de filmes de terror se tornou um clássico do gênero. As criaturas são capazes de, literalmente, tirar o sono não apenas no mundo ficcional, mas também da plateia, com suas maldades e poderes paranormais. O exemplo mais familiar até hoje é o Chucky, da franquia “Brinquedo Assassino”. Mais recentemente, “Jogos Mortais” apresentou o macabro Jigsaw, que lançava jogos sangrentos para as suas vítimas. Agora é a vez de Annabelle, a perigosa boneca de “Invocação do Mal”, contar um pouco sobre a sua história.

A trama acompanha um casal que está esperando a primeira filha. Certo dia, John (Ward Horton) presenteia a esposa Mia (Annabelle Wallis) com uma boneca rara, que logo vira enfeite no quarto da criança. A vida pacata do casal é abalada após o ataque de membros de uma misteriosa seita. Traumatizados, John e Mia resolvem mudar de casa para esquecer o passado, mas uma onda de eventos malignos acompanha o casal. Como desvendar o desconhecido e combater as forças demoníacas causadas por uma simples boneca? É o que eles tentam descobrir neste tenso spin-off.

Mais experiente como diretor de fotografia, John R. Leonetti assume a direção de “Annabelle” com segurança após as péssimas experiências anteriores com “Efeito Borboleta 2” (2006) e “Mortal Kombat – A Aniquilação” (1997). James Wan, responsável por “Invocação do Mal”, ficou com o cargo de produtor, já que estava envolvido com “Velozes e Furiosos 7” e com (mais) um último episódio da franquia “Jogos Mortais”.

Leonetti respeita a história anteriormente contada por Wan, mantendo o constante clima sombrio da trama. Sua câmera arquiteta sequências extremamente eficazes, mesmo quando trabalha os clichês. Televisões e rádios ligam e desligam sozinhos e portas batem misteriosamente, mas existe certa classe na forma que Leonetti registra tais fenômenos. Apesar de não se livrar dos acentuados sustos sonoros, o cineasta acerta ao balancear o suspense psicológico com o terror trash, fundamentais para o bom desempenho do longa.

Auxiliado por uma montagem que jamais deixa o ritmo do filme cair, em sincronia com a poderosa trilha sonora de Joseph Bishara, Leonetti também traz propostas visuais que causam aflição no espectador. Uma máquina de costura pode se transformar em um instrumento altamente perigoso, o subsolo de um condomínio pode ser apavorante e um ataque físico de um demônio pode te surpreender. Além de referenciar “Invocação do Mal”, Leonetti homenageia também “O Bebê de Rosemary”, clássico de Roman Polanski.

Os atores Annabelle Wallis e Ward Horton tentam fazer com que o público se importe com o destino deles, mas é dela o melhor aproveitamento por mostrar como o seu transtorno cresce gradativamente. Horton mal sabe dosar os momentos dramáticos e tem poucas cenas relevantes. Aliás, a espontaneidade da pequena Leah, filha dos protagonistas, se sai bem melhor do que o casal. Tony Amendola e Alfre Woodard fazem um bom contraponto na trama. Amendola representa a religião (aliás, é interessante como o filme mostra a religiosidade dos personagens sem fanatismo) e Woodard poderia ser melhor aproveitada como Evelyn, a vendedora de livros místicos.

O principal acerto do roteiro de Gary Dauberman é fazer com que Annabelle seja pavorosa desde o começo do filme, possuída ou não. A sensação de perigo está sempre presente e a boneca funciona bem como receptáculo da maldade, sem precisar necessariamente se mexer para mostrar os danos que pode causar. A obsessão pelos closes nos olhos de Annabelle é de arrepiar! Se por um lado o roteirista é bastante feliz ao reaproveitar os clichês de forma orgânica e trazer novos conflitos pavorosos, “Annabelle” derrapa em seu terceiro ato, com uma solução fácil demais, talvez para reforçar a intenção de que também pode virar uma franquia. O deslize é lamentável, mas não impede que este integre a lista dos bons filmes de terror lançados nos últimos anos.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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