Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 02 de janeiro de 2012

Imortais (2011): épico de ação erra ao apostar apenas no choque gráfico

Diretor indiano mistura referências bollywoodianas com temas gregos e o resultado acaba sendo digno do carnaval carioca.

É possível fazer um filme divertido com um roteiro ruim, embora seja bastante improvável. No entanto, é praticamente impossível sair algo aproveitável ao se juntar um texto ruim e uma direção pedante. Esse é exatamente o caso de “Imortais”, fita de ação baseada nos mitos gregos que chega (atrasado) na esteira de “Fúria de Titãs” e “300”.

Escrito pelos desconhecidos Charley Parlapanides e Vlas Parlapanides (americanos com ascendência grega), o filme mostra a jornada do mortal Teseu (Henry Cavill) para impedir que o rei louco Hipérion (Mickey Rourke) coloque suas mãos no lendário Arco de Éforos, uma poderosa arma que pode libertar os titãs e destruir os deuses e o mundo. Em sua missão, Teseu terá a ajuda do ladrão Stavros (Stephen Dorff) e da oráculo Faedra (Freida Pinto).

O roteiro é um verdadeiro queijo suíço, com personagens entrando e saindo da narrativa sem muitas explicações, com estes jamais tendo suas motivações expostas na tela de maneira clara. Ao não nos dar nem ao menos um relance da família de Hypérion, explicação oferecida para sua insanidade, impossibilita-se uma maior aproximação com o vilão.

Também é impossível entender o motivo de Stavros se juntar a Teseu em sua busca quase suicida, as razões da persistência de Zeus (Luke Evans) em manter a lei que o impede de ajudar Teseu mais diretamente ou mesmo a insistência de Atena (Isabel Lucas) em desrespeitar tal decreto.

Henry Cavill mostra disposição para as cenas de luta e é um ator carismático, tendo todo o ar de herói que o projeto requer. John Hurt, mesmo aparecendo pouco, se mostra à vontade no papel de mentor do protagonista e é sempre bom ouvir sua voz rouca característica. Mickey Rourke, por sua vez, atua no piloto automático, se mostrando um vilão desinteressante, com sua característica mais marcante sendo o sadismo, o que fica chato depois de duas ou três cenas. Já dentre os coadjuvantes, Stephen Dorff está insuportável como de costume e Freida Pinto parece ter sido colocada como um enfeite bonito para o público masculino.

A verdadeira “estrela” da produção é o diretor Tarsem Singh (que também assina apenas como “Tarsem”, dependendo do seu humor). Desde a ficção científica “A Cela”, sua estreia nos cinemas, ficou claro que o cineasta adora exibir na tela visuais mais exóticos, tentando dar uma aura de maior profundidade às suas obras por meio de fetiches gráficos. Aqui reunido com seus colaboradores habituais, o designer de produção Tom Foden e a figurinista Eiko Ishioka, o indiano leva os mitos gregos à Sapucaí, nos mostrando uma Grécia Antiga bizarramente carnavalesca, excessivamente adornada.

Nada explica o visual esquisitíssimo dos deuses gregos adotado pela produção, causando risadas no público ao invés de reverência. Quebrar a iconografia visual estabelecida para o panteão helênico é uma coisa mais do que aceitável hoje em dia, considerando o excesso de obras audiovisuais sobre os mitos gregos, mas transformar as divindades em Acadêmicos do Grande Olímpo é sabotar o próprio filme. Dar um visual que beira o sado-masoquista a Hipérion e aos titãs, sem muita explicação, também gera resultados igualmente risonhos, vide a aparição do “Minotauro”.

O clima mais exagerado e um tanto teatral proposto por Tarsem e sua equipe jamais casa com o banho de sangue que são as cenas de ação que surgem durante a projeção, claramente tiradas de “300”, inclusive com o slow motion, a angulação side-scroll e a tendência ao gore. O problema é que as cenas absurdas ali funcionavam exatamente pelo tom cartunesco dado por Zack Snyder. Tarsem, por sua vez, jamais deixa espaço para o humor em sua tentativa de épico, se levando absolutamente a sério.

O mais frustrante é que, mesmo com o roteiro se utilizando de deuses e armas fantásticas, tais elementos jamais são empregados por Tarsem de maneira criativa nas sequências de luta, nem mesmo nas que envolvem os combates entre seres imortais, que se resumem a embates genéricos dos deuses contra oponentes absolutamente iguais e, ao que parece, infinitos. Aparentemente, as divindades perdem seus poderes quando lutam entre si, só isso explicando a ausência de suas habilidades especiais nesses momentos.

Não posso deixar de falar do 3D, essencialmente inútil, servindo apenas para matar a fotografia com o escurecimento da imagem, sendo a projeção tradicional preferível, caso decida conferir a produção. Sem ritmo e contando com cenas de ação requentadas, a única coisa que “Imortais” teria para oferecer ao seu público seria seu visual. Infelizmente, trata-se de um filme de ação, não de um desfile de moda.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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