Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 24 de janeiro de 2010

Amor sem Escalas

O longa é simples, mas encanta com sua narrativa sem apelos dramáticos.

Os filmes podem nos encantar de diferentes formas. O fato de ficar pensando na trama ao sair do cinema quer dizer que a sua mensagem foi passada e que você, como espectador, conseguiu absorver. “Amor sem Escalas” é assim. Baseado no livro de Walter Kim, Jason Reitman e Sheldon Turner conseguem encantar pela maneira simples com que escreveram o roteiro, sem precisar enrolar e, principalmente, sem apelar para momentos dramáticos que buscam apenas chocar o público que está assistindo.

Dirigido por Jason Reitman (responsável pelos elogiados “Obrigado por Fumar” e “Juno”), “Amor sem Escalas” traz George Clooney interpretando Ryan Bingham, um sujeito que vive em aeroportos, aviões e hotéis, viajando de um lado para o outro nos Estados Unidos com um único objetivo: demitir pessoas. Com a crise financeira que assolou os Estados Unidos no ano passado, muitas empresas tiveram que cortar gastos. Ryan pertence a uma empresa terceirizada que é responsável por isso. Para ele, cada pessoa reage de uma forma ao ser demitida e, neste caso, cabe a ele fazer com que esta notícia seja dada da “melhor” maneira possível.

No entanto, o executivo vive de maneira solitária por escolha, livre de qualquer relacionamento. Ao longo do filme, por exemplo, perceba como ele se mantém distante dos seus familiares, evitando qualquer tipo de relação com ele. Com esse jeito cínico, o seu maior objetivo é atingir dez milhões de milhas no programa de milhagem da sua companhia aérea favorita. Em uma dessas missões, ele conhece Alex Goran (Vera Farmiga), com quem passa a ter uma relação casual que começa a mudar o seu jeito de pensar e, principalmente, de viver.

De uma maneira sutil, Jason Reitman consegue nos mostrar as verdadeiras facetas do seu personagem. Perceba, por exemplo, como é o local onde ele mora, se parecendo completamente com um quarto de hotel. As próprias palestras que ele dá quando tem uma pausa nas viagens ajudam a continuar sempre viajando, pois ele não consegue viver de outra forma. Assim, ao receber a notícia de que as demissões seriam ocorridas por videoconferência (também com o objetivo de cortar gastos), Ryan passa a viver ainda mais preocupado. É quando ele conhece Natalie Keener (Anna Kendrick), que está começando neste ramo e é responsável pelo novo sistema a ser implantado, mas que ainda tem muito o que aprender.

A partir de toda esta trama, Jason Reitman inteligentemente divide o seu filme em duas fases. “Amor sem Escalas” começa de maneira irônica, com uma edição que facilite ainda mais para tornar os diálogos sarcásticos – muito por conta também de Ryan e Alex, que começam a manter esta relação casual. Quanto mais a trama avança, Ryan passa a rever os seus princípios e a querer algo mais fixo (seja uma moradia e, até mesmo, um relacionamento). Mudando de um humor irônico a um filme extremamente trágico, no qual o protagonista passa a fazer diversos questionamentos sobre si mesmo.

Além disso, Jason Reitman mistura diversos estilos em seu filme. Ele pode ser encarado pela personalidade humana improvável de Ryan Bingham, um drama empresarial que mostra com clareza as consequências da terrível crise pela qual passou os Estados Unidos, um road movie no qual a estrada é o céu e até (por que não?) uma comédia romântica para adultos. Sem apelar para momentos de intensas dramaticidades, Reitman aposta muito mais em uma direção criativa – ele consegue diferentes focos e enquadramentos nas pessoas que foram demitidas – e na grande atuação de George Clooney e Vera Farmiga.

Os dois atores, aliás, são os responsáveis pela mudança de curso do filme. O romance casual que ambos mantinham apresentava significados diferentes para cada um deles. No caso de Ryan, Alex mudou completamente o seu jeito de ser e de enxergar o momento. Mas, para ela, Ryan era apenas um escapismo da vida que ela tinha quando não estava viajando. Por essa razão, é interessante observar como o tom sarcástico inicial do filme vai, aos poucos, cedendo espaço para uma atmosfera mais amargurada. A própria trilha sonora de Rolf Kent muda, dando lugar a letras e ritmos que provocam um sentimento maior de amargura, enquanto que Ryan vive a sua crise pessoal de não saber mais o que deseja para si mesmo.

“Amor sem Escalas” é, enfim, um filme triste e trágico. Esta tragicidade está relacionada à mudança de comportamento de Ryan Bingham, um executivo que parecia ter uma vida e objetivos bem definidos, mas que depois se viu entregue às próprias indecisões que ele não sabia que tinha. A tristeza corresponde exatamente por meio das suas desilusões. Jason Reitman recheia o seu filme com excelentes diálogos, mesclando o humor com o drama e, dessa maneira, ele transforma a história que, no início parecia totalmente despretensioso, em um filme com tamanha sensibilidade em assuntos cruciais, que vão desde as questões familiares até a atual situação mundial de trabalho pós-crise econômica. Este é um filme para se ver e rever diversas vezes.

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