Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 22 de agosto de 2009

Veronika Decide Morrer

Primeira adaptação de uma obra de Paulo Coelho, “Veronika Decide Morrer” capta bem o universo que o escritor brasileiro cria em seus livros. Será que daí pode-se dizer que o filme é um sucesso? Bem, se você gosta de filmes de auto ajuda, a película é um prato cheio, mas se não, é um tormento, principalmente do meio para o final.

Atualmente, Paulo Coelho pode ser considerado o mais famoso brasileiro do mundo. Seus livros só não são mais vendidos do que banana: até hoje, foram mais de 100 milhões de exemplares por cerca de 150 diferentes países do planeta. E os números não param por aí. Suas obras já foram traduzidas para 66 idiomas (e existem tantos idiomas assim?), além de ser o autor mais vendido em língua portuguesa de todos os tempos. Enfim, a disseminação da escrita de Paulo Coelho impressiona. Mas o seu texto é bastante questionado. Muitos críticos o acusam de ser comercial demais, de escrever histórias falsamente profundas, que falam basicamente sobre a superação do ser humano depois de algum trágico acontecimento. E “Veronika Decide Morrer” não difere desse estilo, carregando consigo todas as qualidades e, principalmente, defeitos da obra de Paulo Coelho.

A trama tem como personagem principal Veronika Deklava (Sarah Michelle Gellar), uma moça profissionalmente bem-sucedida de 24 anos, mas que parece não ter a felicidade ao seu lado. A rotina e a depressão são as suas principais inimigas. Então ela decide se matar e toma vários comprimidos para isso. Suas intenções, no entanto, falham, mesmo que temporariamente. Ela é rapidamente socorrida, hospitalizada e salva, para semanas depois, ser levada para uma clínica psiquiátrica. Ao acordar, ela é avisada pelos médicos que a tentativa de suicídio causou severos danos na sua saúde e que, por isso, lhe resta apenas poucas semanas de vida.

Enclausurada naquele local recheado de pessoas que apresentam diversos problemas mentais, Veronika não aguenta esperar que o seu fatídico momento chegue e tenta novamente se matar, mas dessa vez é impedida pela equipe médica. A partir de então, ela passa a ter boas relações com vários internos da clínica, especialmente com o misterioso Edward (Jonathan Tucker), um jovem rapaz afetado por um grave acidente que matou sua namorada. Com a crescente amizade e as novas experiências que vivência, Veronika agora corre contra o tempo para aproveitar ao máximo seus últimos momentos de vida.

Comandado pela desconhecida Emily Young, “Veronika Decide Morrer” começa com as fortes cenas da tentativa de suicido da protagonista, as quais são muito bem dirigidas e editadas, refletindo bastante a loucura momentânea que passa pela cabeça da garota. O ótimo ritmo da sequência nos empolga para o restante do filme. Ficamos ansiosos por saber o que realmente levou uma linda moça a querer ceifar sua vida e encerrar os seus dias. Entretanto, o filme nunca nos responde adequadamente. O passado de Veronika não é revelado: pouco sabemos sobre o seu trabalho e sobre as sua paixões. Apenas chegamos a conhecer os seus pais, mas a boa relação entre eles não justifica as atitudes tomadas por Veronika.

Sempre apostando nos closes e na câmera na mão para tentar adentrar a mente dos personagens, a diretora, porém, não consegue aprofundar uma história que bebe de uma fonte já problemática. Emily Young até que é capaz de fazê-la atraente aos olhos, com a contribuição da bela fotografia esbranquiçada de Seamus Tierney, e aos ouvidos, com a tocante trilha sonora de Murray Gold, que é composta de temas de piano e de um rock psicodélico, mas fracassa ao encarar a trama como algo bastante pretensioso e cheio de lições de moral.

O roteiro de Roberta Hanley até que é fiel ao livro, mas isso não pode ser encarado como um elogio. A maneira como trata a depressão, talvez a mais séria doença do mundo moderno, é o maior desses problemas. Ela é encarada apenas como uma total falta de auto estima decorrente, principalmente, da inexistência de um amor. Depois que Veronika se identifica com os pacientes da clínica, em especial Edward, seus pensamentos suicidas cessam e ela passa a querer viver novamente. Além disso, o argumento não desenvolve adequadamente o crescimento dessa sensação de bem-estar de Veronika. Ela subitamente passa a “enxergar a luz”, já que esta é a proposta da fotografia do filme.

Outro erro do roteiro é mostrar personagens coadjuvantes absolutamente desinteressantes, que nunca justificam as suas aparições. Doutor Blake (David Thewlis), o médico responsável pela unidade, Claire (Erika Christensen), uma jovem interna, e Mari (Melissa Leo), uma paciente prestes a deixar a clínica, estão ali apenas para contar a Veronika “historinhas” repletas de lições de moral, mas que não funcionam nem para os mais depressivos, tanto que a própria moça constata isso em uma de suas várias infelizes conversas com o médico.

O elenco, entretanto, está acima da média do longa. Sarah Michelle Gellar, em um de seus poucos papéis dramáticos na carreira, está intensa e bastante segura, nunca exagerando no tom sofrido do personagem. O seu par no filme, Jonathan Tucker, mesmo tendo pouquíssimas falas, expressa todos os seus problemas apenas através de suas feições, apesar de arregalar demais os olhos algumas vezes. David Thewlis é um pouco comprometido pela chatice do Dr. Blake, enquanto Melissa Leo mostra que o sucesso em “Rio Congelado” não foi por acaso. É uma pena que seu talento seja desperdiçado em prol de um personagem sem razão de existir. Já Erika Christensen prova que é uma das mais promissoras atrizes da nova geração, só lhe falta um pouco de sorte na escolha de sues papéis.

As atuações competentes e a direção ousada de Emily Young, no entanto, não compensam todas as falhas de “Veronika Decide Morrer”. O desfecho da película não poderia ser mais piegas, comprometendo toda a história do longa. A sensação é de termos sido enganados durante longos 103 minutos de duração. Agora é esperar que as adaptações de “O Alquimista” e “Onze Minutos”, outros livros de Paulo Coelho, fiquem apenas na especulação.

Darlano Didimo
@rapadura

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