Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Street Fighter: A Lenda de Chun-Li (2009): um filme muito, muito ruim mesmo

"Street Fighter - A Lenda de Chun-Li" não só é terrível como filme, como também macula a infância de qualquer um que tenha nascido nos anos 1980 e passado horas na frente de um fliperama ou de um videogame acabando com os dedos jogando os games da série. Lixo é pouco para descrever (mais) esta produção desastrosa lançada pela 20th Century Fox.

A fita tem início com uma terrível narração, indicando que o filme será relatado em flashback por sua protagonista-título, Chun-Li. Já com primeiros 30 de projeção já sabemos três coisas: ela vai aprender uma grande lição, não morre no final e Kristin Kreuk está mais perdida do que cego em tiroteiro. Enfim, ela nos conta de sua infância feliz e rica, que adorava tocar piano e que o seu pai era mestre em artes marciais e lhe ensinou alguns golpes. Certo dia, ele é sequestrado por alguns homens e Chun-Li nunca mais o vê.

Anos se passam e aqueles vilões do começo do filme, para surpresa de ninguém, se revelam os grandes antagonistas da trama. O chefão do crime Bison (Neal McDonough) e seu grupo de capangas liderados pelo brutamonte Balrog (Michael Clarke Duncan) assumem o controle de uma multinacional e possuem um plano imobiliário sinistro envolvendo o antigo bairro do mafioso, na cidade tailandesa de Bangkok.

Enquanto isso, a mãe de Chun-Li morre e ela perde seu norte, sendo a pianista atraída para a Tailândia por um guru, mestre em artes marciais, chamado Gen (Robin Shou), que lidera algo conhecido como a Ordem da Teia. Em meio a isso tudo, o investigador da Interpol Charlie Nash (Chris Klein) tenta, ao lado da policial Maya (Moon Bloodgood), arrumar um jeito de prender o perigoso Bison, que espera um importante pacote para breve.

Se você me perguntar o que raios essa sinopse tem a ver com Street Fighter, eu juro para vocês que eu não sei. Todos os personagens do game que aparecem em cena, sem exceção, foram descaracterizados, tanto em suas personalidades quanto em seus visuais. Os fãs da franquia só os reconhecem pelo nome, mais nada. É incrível a capacidade do roteirista Justin Marks de destruir qualquer semelhança do filme em relação ao restante da franquia.

Só para desabafar, Bison deixa de usar seu uniforme militar e poderes psíquicos para se tornar um homem de negócios loiro metido com magia negra(!), Gen se torna um ex-criminoso arrependido de meia-idade e líder de um grupo que mais parece uma seita, Vega, de um perigoso vilão narcisista se torna um assassino feio e inapto. Nash é um playboy bancando o policial ao invés de um militar e Maya… bem, quem diabos é Maya? Essa daí não estava na tela de seleção dos meus jogos não!

Mas a própria personagem-título fora extremamente descaracterizada. Sim, realmente o pai de Chun-Li fora bastante prejudicado por Bison, mas nunca o progenitor da garota foi mostrado como um homem de negócios, mas sempre como um policial, profissão que a própria Chun-Li seguiu com o intuito de se vingar do vilão. No filme, a única policial que aparece é a tal Maya e as habilidades de luta da protagonista são elevadas quase que instantaneamente.

Com poucos dias de treinamento, a pianista de família rica passa de praticante ocasional de wu-shu para mestra dessa arte marcial, capaz até de soltar as famigeradas “magias”! Não é só isso que é repentino em Chun-Li. A própria jornada da protagonista é completamente insana, com esta saindo de sua vida pacata em Hong Kong apenas porque o roteir…, ops, um pedaço de pergaminho vindo do nada, mandou.

A pobre diaba se torna a mendiga mais arrumada das ruas de Bangkok, podendo passar fome, mas sempre com o cabelo arrumado e maquiada! Kristin Kreuk, recém saída da série “Smallville”, mostra que devia ter ficado na telinha, pois não é particularmente linda, não convence como heroína de ação e, nas cenas mais “dramáticas” do filme, mais parece estar com prisão de ventre.

O próprio Bison, aliás, é patético. Além de bater em pessoas indefesas e amarradas, ele é mostrado roubando peixes(!!!) e seu grande plano, aliás, envolve a compra inescrupulosa de uma favela para transformar o local em condomínios de luxo. Estou tentando não rir enquanto escrevo isso, mas é a pura verdade, este é o plano final do maligno vilão deste longa, que se livrou de toda a bondade de sua alma para fazer isso. E a interpretação de Neal McDonough realmente não ajuda em dar mais credibilidade ao antagonista, exagerando tanto que beira a vergonha alheia.

O canastrão Robin Shou se limita a ter umas cenas de ação soltas e a proclamar uns discursos de treinamento mais batidos do que bolo. Balrog, vivido por Michael Clarke Duncan, é o que mais se aproxima da versão original do personagem, com o ator até parecendo estar se divertindo como o gigantesco assassino, sendo ele o ponto forte (ou menos fraco) do elenco. Ainda bem que o Vega do “cantor” Taboo mal aparece, sendo mais uma curiosidade bizarra do que uma figura no filme.

Agora, o trabalho de Chris Klein como o policial Nash é digno de ser mostrado em todas as escolas de artes cênicas como exemplo do que NÃO se fazer. O homem não consegue abrir a porta do carro sem parecer artificial! Sem contar que ele não possui química nenhuma com Moon Bloodgood que, em tese, seria seu “par romântico”. Por falar nela, a atriz até que poderia se sair bem como a policial Maya, se esta não fosse a caricatura perfeita da mulher-policial.

Nos aspectos técnicos, o desastre não é menor. O diretor Andrzej Bartkowiak (“Romeu Tem Que Morrer”, “Doom – A Porta do Inferno”) está ainda mais fraco do que de costume. Mesmo as cenas de ação, que deveriam ser o forte de sua direção, simplesmente não empolgam em nada. Vemos muitos tiroteios para um longa que deveria mostrar mais lutas mano-a-mano e “magias”.

A ação corporal é mal coreografada, os efeitos dos ataques energéticos horrorosos e mesmo as sequências de tiro mais lembram uma série policial ruim dos anos 1980. A montagem do filme também não é das melhores, com a fita não tendo menor ritmo, se mostrando extremamente travada. O filme tem um visual feio, figurinos que não lembram os do jogo, cenários pouco atraentes. Enfim, realmente não agrada aos olhos.

Em 1994, assisti “Street Fighter – A Última Batalha”, estrelado por Jean-Claude Van Damme. Por mais cretino que fosse aquele filme, era divertido, tinha carisma e, diabos, o Bison de Raul Julia era um maluco em uma roupa militar querendo, é claro, dominar o mundo! Já este “A Lenda de Chun-Li” é apenas um filme muito, muito ruim mesmo, com um vilão que quer dominar um bairro em um longa que não diverte ninguém.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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