Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 06 de junho de 2009

O Exterminador do Futuro: A Salvação (2009): diferente, mas nem por isso desagradável

Após o vergonhoso "O Exterminador do Futuro 3 - A Rebelião das Máquinas", esperava-se que esta franquia criada magistralmente por James Cameron fosse ladeira abaixo, principalmente após o anúncio de que o quarto filme da saga teria roteiro de John D. Brancato e Michael Ferris, os mesmos escritores da terceira película, e que seria dirigido por McG, mesmo diretor de "As Panteras".

Mesmo com o anúncio de um elenco forte, encabeçado por Christian Bale, pouco se levou fé no projeto, que ainda teve alguns problemas nos bastidores e estreou com os fãs ainda reticentes. Mas eis que houve mesmo salvação para o projeto que, ao mesmo tempo em que presta homenagens e dá continuidade (ou origem) aos dois primeiros exemplares da saga, possui um ritmo e ambientação completamente diferente daqueles longas e, ainda bem, ignora quase que completamente “A Rebelião das Máquinas”.

No prólogo, conhecemos um dos protagonistas deste, Marcus Wright (Sam Worthington), um condenado a morte que acaba por doar seu corpo à ciência, mais precisamente para a malfadada companhia Cyberdyne. Anos se passam e embarcamos na trama principal do filme, que se passa em 2018, em um mundo devastado desde que a rede Skynet ganhou autonomia e declarou a guerra das máquinas contra os humanos.

O profetizado líder da Resistência, John Connor (Christian Bale), está em uma luta desesperada para conter o avanço dos inimigos enquanto luta contra o ceticismo do Comando Central humano. Em um conflito que parece perdido, as máquinas se utilizam de várias armas para acabar com a humanidade, dentre eles os exterminadores T-600, meio desajeitados, mas mortais. O exército da Skynet, em uma nova jogada, começou a sequestrar humanos para se utilizar destes como matéria-prima para os vindouros T-800, os quais Connor conhece muito bem de sua juventude.

Enquanto isso, o Comando coloca suas mãos em uma arma que pode finalmente colocar as máquinas em xeque. Mas a chegada de Marcus Wright a esse mundo pode mudar todo o panorama da guerra, principalmente quando o primeiro humano que ele encontra em seu caminho é Kyle Reese (Anton Yelchin), um dos grandes alvos dos exterminadores por ser o homem destinado a voltar no tempo e ser o pai de John Connor.

O roteiro de “A Salvação” evoluiu muito em relação ao do terceiro longa. Não sei se por melhora dos escritores ou pela participação (forçada) de Jonathan Nolan na confecção do texto, mas há um salto significativo de qualidade em relação ao da produção anterior. A ambientação da película que, se passando no período de conflito contra as máquinas, evita lidar com o tema da viagem no tempo, algo que seria complicado de se fazer, tendo em vista a cronologia da franquia.

O script, então, acaba funcionando bem para amarrar as pontas entre os eventos que vimos nas tramas principais dos filmes anteriores com o futuro apocalíptico previsto naquelas fitas, mostrando como as aventuras anteriores de Connor acabaram por moldá-lo no conflito. Deste modo, há um respeito maior ao fã da saga do que no desastroso “A Rebelião das Máquinas”. Claro que existem falhas, principalmente no que concerne ao plano das máquinas quanto a Kyle Reese, bem como no inútil e forçado conflito entre Connor e Wright no final do segundo ato da fita, mas o saldo final ainda é bastante positivo.

Quem realmente surpreende é o diretor McG. Não tendo realizado nenhum blockbuster desde o terrível “As Panteras – Detonando”, o cineasta mostra que fez sua lição de casa no que diz respeito aos pipocões e entrega algumas das melhores – e mais barulhentas – cenas de ação do ano. Filmando tais cenas com uma predileção por planos mais longos do que o que estamos acostumados nesse tipo de produção, o cineasta e o cinematógrafo Shane Hurlbut mostram aquele futuro horrendo como se estivessem retratando um filme de guerra, até mesmo com cenas que remetem ao holocausto.

Se utilizando de uma fotografia mais cinzenta e granulada, principalmente nas cenas diurnas, é impossível não pensar em “O Resgate do Soldado Ryan” em algumas sequências, principalmente na primeira grande batalha do filme. McG às vezes extrapola, como no modo em que John Connor chega ao comando, altamente exagerado, mas se mostra um diretor bem mais competente do que outrora.

Em matéria de efeitos especiais, “A Salvação” não inova muito, mas apresenta máquinas assustadoras e convincentes, misturando animatrônicos com computação gráfica. A principal surpresa em relação à CG está em uma curta ponta digital, muito bem realizada, de uma figura bastante conhecida dos fãs da saga. A montagem do filme, realizada pelo oscarizado (e colaborador habitual de James Cameron) Conrad Buff, é eficiente, embora ocorram alguns erros de continuidade um pouco mais acentuados que poderiam ter sido minorados na sala de edição, mas nada excessivamente incômodo

O som do filme está ensurdecedor, nos jogando praticamente dentro do confronto, com o espectador podendo ouvir cada bala e explosão como se estivesse ao lado da ação. Prepare seus ouvidos. A trilha sonora é bastante eficiente, com o compositor Danny Elfman se utilizando de maneira econômica do tema clássico da franquia composto por Brad Fiedel, que surge apenas nos momentos mais icônicos para a mitologia da saga.

Quanto às atuações, Christian Bale surge um tanto quanto excessivamente bruto no filme. Sim, John Connor está em guerra contra as máquinas desde que nasceu, mas pouco sentimos de humanidade nele no filme, característica que ele diz defender com todas as suas forças, mas pouco demonstrada pelo ator nesse seu trabalho. Apenas em pontuais tomadas de Bale com Bryce Dallas Howard – que vive a esposa de John, Kate Connor – vemos um pouco de afeto aqui e ali, mas é pouco para nos remeter ao jovem tranquilo do segundo filme.

A figura mais humana do filme é Marcus Wright, magistralmente encarnado por Sam Worthington. Esse australiano surge como uma das grandes revelações do ano. Carismático e hábil nas cenas de ação, Worthington rouba a cena em cada uma de suas aparições. Seu personagem, aliás, é o coração do filme, com sua “jornada do herói” em busca de redenção, sendo o grande mote do longa. Sua atuação me deixou bastante curioso para saber como ele despontará em “Avatar”, longa no qual ele será dirigido pelo criador do “Exterminador”, James Cameron.

No elenco coadjuvante temos Anton Yelchin, que dá ao adolescente Kyle Reese uma vitalidade e força de vontade importantes para “iluminar” um pouco o filme. É uma pena que a pequena parceira do personagem, a muda Star vivida por Jadagrace, jamais se mostre a altura de uma Newt de “Aliens – O Resgate”, sendo praticamente mais um elemento de cena. Michael Ironside aparece fazendo uma imitação de Jack Nicholson com o general Ashdown, o típico personagem clichê colocado no filme para ser detestado pelo público.

A figura feminina principal é representada pela piloto Blair Williams, cuja intérprete, a atriz Moon Bloodgood, encarna com coragem e bravura, mas com um toque de feminilidade que concede um charme maior à personagem. Bloodgood apresenta uma ótima química com Sam Worthington em mais um dos relacionamentos-relâmpago que marcam a franquia. A já citada Bryce Dallas Howard possui pouquíssimo tempo de cena como a grávida médica de batalha Kate, mas a importância da personagem para esta história em especial é realmente pequena, com o trabalho da intérprete realmente sendo pouco marcante nesse sentido.

“O Exterminador do Futuro – A Salvação” é um animal completamente diferente dos dois primeiros filmes da saga, verdadeiros clássicos do cinemão americano, embora preste diversas homenagens a estes. Enquanto tais fitas misturavam conceitos fascinantes de viagem no tempo e filosofia com ficção científica e ação, com um toque de slasher movie, esta nova encarnação da franquia surge como uma aventura sci-fi de ação muito menos ambiciosa, mas nem por isso desagradável de ver, sendo uma película extremamente bem feita e bastante eficiente.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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