Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 27 de março de 2009

Passageiros

O confuso e fraco roteiro, somado a personagens rasos e pouco expressivos, resultam na previsibilidade e entediante trama de “Passageiros”. Mesmo com a carismática Anne Hathaway, o longa não convence e nos apresenta uma história já vista inúmeras vezes e de formas muito mais atraentes.

Penúltimo país a estrear no mundo, inclusive após a premiere de lançamento do DVD nos Estados Unidos, o longa “Passageiros” se torna um convite ao sono desde o momento em que o telespectador começa a assisti-lo. Nem a presença da talentosa Hathaway, longe de surpreender como em “O Diabo Veste Prada”, concedem simpatia ao longa. Não que aspectos como o desconexo enredo e a falta de criatividade na direção sejam os principais limiares para a limitada interpretação. Mesmo com seus 26 anos, a atriz fez o básico para qualquer ator iniciante, e no seu caso é embaraçoso para uma jovem com um futuro promissor, indicada ao Globo de Ouro e ao Oscar de melhor atriz por “O Casamento de Rachel”.

Escrito pelo, este sim iniciante, Ronnie Christensen, o script, de tantas reviravoltas e furos, deixa perdido o público até pelo menos quando já é possível deduzir o quase explícito mistério e argumento principal do filme. De mãos dadas, vem a direção do colombiano Rodrigo García, também novato no cargo, que já erra na definição do gênero principal de sua película. Em quase todo caminhar da trama é difícil definir se o que vemos é um thriller policial, um romance de casal, um drama existencial ou mesmo um soft terror sobrenatural. Não que esta “riqueza” seja de todo ruim, apenas administrada da forma como foi inibe qualquer opinião ou sensação do telespectador, já que as tramas se entrelaçam de forma tão superficial que não é possível degustar nenhum dos estilos.

A trama se inicia de forma tentadora, pois já nos coloca a par do grande mistério introduzido por rápidas e inconclusivas cenas de um acidente aéreo. Hathaway vive a psicóloga/terapeuta Claire Summers que, após uma chamada telefônica de seu mentor Perry (Andre Braugher), recebe a alcunha de analisar e tratar do estresse pós-traumático dos cinco, de 109, sobreviventes ao vôo. Utilizando do artifício da terapia em grupo, Summers logo descobre que os entrevistados apresentam versões divergentes do acontecimento, principalmente o empresário Eric (Patrick Wilson). Recluso e ao mesmo tempo aberto a visitas particulares, Eric deixa a psicóloga intrigada e fascinada, pelo mistério que ronda o acidente e por ele apresentar forte ligação pessoal com ela, sabendo de fatos de sua vida mesmo sem antes tê-lo conhecido.

O que sugere um drama regado a conspiração e política, logo se esvai ao momento que Summers relaciona o desenvolvimento extra sensorial com o trauma de Eric. Atormentada pela distância de sua irmã e pelo aparente fracasso na terapia, visto que os pacientes vão aos poucos desaparecendo, Summers se entrega ao enigmático e insólito Eric, como se esta fosse sua última esperança de sucesso. Renegando qualquer definição da ética profissional, logo ela se rende a insistência do “bon-vivant”. A medida que memórias são recobradas pelos pacientes e outros personagens surgem na vida de Summers, novos acontecimentos aparecem para “apimentar” a trama.

Uma constante sensação provocada desde o início da exibição pela câmera de García é a desnecessária sensação de suspense: takes focados em close com o característico travelling bem lento dando enfoque ao fundo dos cenários. Totalmente dispensáveis visto que, mesmo com gêneros mistos, a presença de um personagem obscuro ou alguma surpresa que possa causar espanto através desta técnica não ocorre. Mais explicitamente falando, aquela sensação em filmes de horror que algo vai aparecer na janela ou uma face fantasmagórica irá surpreender o telespectador perde seu valor quando mal ou utilizada em demasia.

A falta de interação dos personagens é outro aspecto prejudicado pelo roteiro. Até pelo fato que não há espaço para que suas histórias sejam trabalhadas, a não ser por breves flashes ao final da película. Final este que não chega a surpreender, apenas afirma aquilo que aos poucos sempre foi trabalhado no enredo. Visto apenas como o drama que se concretiza após a cumplicidade de Summers e Eric, “Passageiros” pode agradar aos mais chegados a um romance ou histórias de amor verdadeiras. Porém, pelo prometido na propaganda não vale a ida ao cinema, com sorte o aluguel do DVD.

Pablo Cordeiro
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