Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 28 de fevereiro de 2009

Força Policial

Por mais que sua distribuidora tente comparar este "Força Policial" com "Tropa de Elite", a verdade é que esse longa sobre policiais americanos não passa de um filme de segunda com um elenco de primeira, não chegando nem perto da qualidade do trabalho de José Padilha em matéria de roteiro ou carisma.

Nos EUA, tem algo que não se apresenta muito no Brasil. Por lá, existem famílias que passam gerações trabalhando nas forças policiais, sempre servindo e protegendo o público, carregando o distintivo quase como um brasão familiar. Aqui, nossos policiais são mal pagos e mal vistos pela sociedade em geral. Portanto, com duas realidades tão diferentes, a comparação forçada entre o gringo "Força Policial" e o tupiniquim "Tropa de Elite" que a distribuidora do primeiro tentou forçar se perde na diferença gritante das duas realidades, principalmente quando o policial vivido por Colin Farrell reclama que "só" ganha 65 mil dólares por ano.

Em "Força Policial", somos apresentados à família Tierney, um clã profundamente enraizado com o departamento de polícia da cidade de Nova York. O pai, Francis (Jon Voight), é um oficial de alta patente da força, hoje mais voltado para as tarefas políticas e administrativas, a três anos de se aposentar com honras. O filho mais velho, Franny (Noah Emmerich), comanda o 31º Distrito Policial e tem sua carreira em uma espiral ascendente junto à força. Já o do meio, Ray (Edward Norton), é um tira fora do campo há alguns anos, desde um misterioso incidente que culminou na morte de um jovem, tendo se auto-exilado no trabalho burocrático. Há ainda a filha mais nova, Megan (Lake Bell), que se casou com o também policial Jimmy Egan (Colin Farrell), um dos homens de confiança de Franny.

Durante uma amistosa partida de futebol americano entre os policiais de NY e os de Detroit, Franny recebe uma ligação na qual é avisado que quatro homens de seu distrito foram assassinados em uma batida que deu errado. Os quatro eram subordinados diretos de Jimmy, que estava no jogo na hora. Rapidamente, uma força-tarefa é reunida para investigar o que aconteceu e pegar o assassino, com o patriarca dos Tierney logo colocando Ray contra a parede e obrigando-o a entrar na equipe, saindo de seu refúgio burocrático. Ray começa a investigar e acaba descobrindo segredos que poderão afetar sua vida e de sua família para sempre.

O maior problema de "Força Policial" está em seu roteiro. Escrito por Joe Carnahan e Gavin O'Connor, o texto traz alguma força em certas cenas mais pesadas, como naquelas que mostram os traficantes em seu esconderijo ou nas focadas na investigação de Ray, algo bastante característico dos filmes de Carnahan, responsável pelo ótimo "Narc". No entanto, o script começa a se diluir em muitas subtramas que acabam roubando a atenção da investigação principal.

Um exemplo dessas distrações é o arco de Franny e de sua esposa gravemente doente, vivida por Jennifer Ehle. Apesar dessa história ter alguma influência nas ações do policial no último ato do filme, tais motivações poderiam ter sido mostradas de um modo que não tomasse tanto tempo do fio condutor da história e que não fosse tão piegas.

Personagens secundários com arcos menos relevantes – como aquele citado no parágrafo anterior – acabam ganhando espaços na história que poderiam ser melhor explorados por eventos mais importantes para a trama principal e que foram relativamente negligenciados, como o acordo entre alguns policiais e um determinado traficante. Além disso, personagens simplesmente desaparecem por um bom tempo da trama e voltam de repente, sem uma organização lógica dos eventos. Tais problemas mostram claramente que, durante a produção do filme, o roteiro fora mexido várias vezes, algo bastante perigoso, já que ameaça atrapalhar com a coesão inicial do texto, algo que aconteceu aqui.

Além disso, o diretor Gavin O'Connor não se mostra muito a vontade no projeto, mesmo sendo um de seus co-roteiristas. A despeito de possuir uma boa técnica de filmagem e de saber enquadrar as cenas, se saindo bem tecnicamente, o cineasta se mostra perdido durante a narrativa, justamente por conta do problemas de roteiro. Mais que isso, O'Connor faz escolhas equivocadas até na trilha sonora do filme.

Veja a cena na qual Ray e seu pai conversam e Franny chega. O fundo musical, composto por Mark Isham, toma um fundo de suspense, quase como em um filme de terror, extremamente inadequado para o momento. Além disso, em um momento clímax do filme, durante uma briga entre dois personagens, a música usada para a sequência vai entrar para a história como uma das mais estranhas a serem usadas em uma luta de bar.

Aliás, todo o desenvolvimento da parte final da história parece forçado demais, com personagens tomando decisões completamente ilógicas, em um excesso de roteirismo gritante. Desenvolvido em três partes, ocorre uma situação com reféns altamente implausível, seguida por um tumulto generalizado e a citada – e completamente despropositada – briga de bar. Um detalhe vai para a multidão que, mesmo com diversos policiais a poucos metros dali, consegue linchar um homem sem maiores problemas!

Edward Norton e Noah Emmerich praticamente carregam o elenco nas costas, com belas composições de personagens. Norton, já acostumado a viver tipos com traumas e dilemas morais, mostra seu Ray como um homem com uma cruz a carregar, mas também como alguém que é extremamente eficaz em seu trabalho – vide a cena na qual ele descobre que alguns suspeitos haviam passado pela polícia momentos antes do crime. Já Emmerich é eficaz em mostrar Franny como um homem bom, mas que tomou algumas decisões de comando questionáveis.

Tecnicamente falho e com uma narrativa dispersa, "Força Policial" está fadado a ser um daqueles filmes que passam no Super Cine da Rede Globo durante as noites de sábado, ou seja, um longa policial fraco, genérico e enlatado.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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