Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 11 de janeiro de 2009

Dia Em Que a Terra Parou, O

Remake de um clássico, este “O Dia em Que a Terra Parou” até que mantém um bom clima tenso até metade da projeção. Pena que depois caia no lugar comum, deslizando entre a diversão rasteira e as mensagens pretensiosas. Pelo menos uma coisa é certa: este é o papel certo para Keanu Reeves.

Em tempos em que idéias originais em Hollywood estão cada vez mais raras do que micos-leões dourados no Brasil, a idéia de refilmar clássicos segue de vento em popa. Porém, nada justifica a realização deste remake de “O Dia em Que a Terra Parou”, que Robert Wise dirigiu em 1951. Há de se convir que o longa fizera um enorme sucesso em sua época devido sua temática bastante crítica à sociedade, conceitos esses que já foram remexidos de todas as maneiras pela indústria cinematográfica, tornando-os hoje algo um tanto comum. Mas, como os figurões não aprendem…

A trama é basicamente a mesma: um alienígena chamado Klaatu (vivido por Keanu Reeves) desembarca no planeta acompanhado do poderoso robô Gort para acabar com as guerras entre humanos, mas erroneamente é recebido como um inimigo. Agora, a Terra corre o risco de ser completamente destruída. A cientista Helen Benson (Jennifer Connelly) é a única que acredita numa salvação, e tenta manter um contato amistoso com o extraterrestre.

Algumas mudanças em relação ao original foram feitas, como por exemplo, a transferência de Washington D.C para Nova York. Entendível por NY ser o palco predileto das catástrofes da sétima arte, mas foge do contexto inicial, pelo fato de o alienígena vir para buscar o contato direto com o presidente. Visualmente, as mudanças foram positivas, ao transferir a trama para os dias atuais. Efeitos especiais impecáveis e as cenas de ação (poucas, mas existem) são convincentes, quando o alienígena mostra seus poderes.

Merece destaque a clássica cena da chegada de Klaatus, acompanhado do destruidor robô Gort. A nave, antes um disco voador tradicional, foi trocado por um enorme globo de plasma (!) e Gort – cujo visual está bastante semelhante ao original – atinge agora dimensões gigantescas e está bem mais articulado. Com quase tudo digital, a cena é tecnicamente impecável, mas há de convir que o encanto original fora em partes perdido. Por incrível que pareça, o visual rústico de um homem vestido de robô e uma nave falsa ainda soam bem mais ameaçadores.

Já outra mudança, bastante prejudicial ao novo longa, é em relação a missão de Klaatu. No original, ele vem para a Terra com o intuito de conviver com os humanos por um período e avaliar se a raça merece ou não ser preservada, passando a conferir todas as raízes destrutivas dos homens. Neste, o E.T. chega só para dar o ultimato de que a espécie está prestes a extinguir, para o bem do meio-ambiente. O que antes era mais interessante, justamente as diferenças de personalidade entre os seres de mundos distintos, ficou resumido apenas à questão ambiental, perdendo demasiadamente o espaço para o desenvolvimento dos personagens, e a própria crítica aos humanos que tende inicialmente. Em resumo, Klaatu vem para dizer “você destroem o ambiente, merecem morrer, e tchau”!

Ironicamente, os melhores momentos do longa são quando ele mostra suas raízes pretensiosas, apresentando a estranheza de Klaatu em relação a falta de bom senso dos terráqueos. Ver dois homens brigando em uma estação de trem unicamente por causa de um bilhete, ser baleado assim que chega apenas por tocar na mão de uma mulher, e um diálogo curto mais bastante profundo com o Professor Barnhardt (vivido pelo sempre ótimo John Cleese) são momentos que lembram o original, e abrem esperança para uma trama bem mais reflexiva. O que acaba acontecendo é: apresentar essas questões superficialmente, induzir que os humanos cavaram a própria cova e acaba sem grandes aprofundamentos.

O diretor Scott Derrickson, de “O Exorcismo de Emily Rose”, faz um trabalho correto, sem grandes invenções. Durante a primeira hora de projeção, consegue manter o clima bastante tenso, com o espectador curioso sobre qualquer atitude de Klaatu, e conseqüentemente, a reação das pessoas ao redor. Pena que a caída no lugar comum e o inconstante roteiro de David Scarpa tornem um filme um tanto entediante da metade para o final.

Detalhes como a difícil relação da personagem Helen com seu enteado Jacob (vivido por Jaden Smith, filho de Will Smith) e a dor do menino pela morte do pai em nada acrescentam à trama. Pelo contrário, ainda prejudica o desempenho da atriz Jennifer Connelly, que visivelmente se esforça doando seu talento dramático, mas se perde devido o mau desenvolvimento de sua personagem. Já Jaden Smith, por sinal, chega a ser irritante toda vez que aparece. Com uma dupla tão fora de sintonia, fica difícil acreditar que a missão de convencer os invasores que a Terra merece uma chance cabe a eles.

Finalmente, o astro: Keanu Reeves. Conhecido como um dos mais inexpressivos atores do Cinema, ele está perfeito no papel de Klaatu. Melhor dizendo, o papel é perfeito para ele. Isso porque, diferente de como fez Michael Rennie no original, ele não age como um ser humano com expressões sentimentais, e sim como um ser se adaptando a um novo corpo, em um novo mundo. Por isso, precisando mover o rosto o mínimo possível, Reeves se sente em casa! E mesmo com uma desenvoltura robótica, Klaatu se mostra um personagem interessante. Isso porque ele chega com um intuito de avisar o pior para a terra – e ele próprio é ciente de que os humanos merecem morrer -, mas não reluta ao salvar a vida de um policial ou de Jacob, pois isso não está em seus planos.

“O Dia em Que a Terra Parou” é uma refilmagem desnecessária que poderia até ter dado certo se Scott Derrickson não tivesse deixado a peteca cair. Sem ser tão pipocão como “Guerra dos Mundos”, mas também longe de ter a complexidade de “2001 – Uma Odisséia no Espaço”, o longa acaba por se perder no meio termo. Se buscam uma história em que coloque os terráqueos como alvo em prol do bem do resto do mundo perante sua futilidade, aconselho que leiam e releiam “O Guia do Mochileiro das Galáxias”. Douglas Adams não só mostra isso, como ainda nos faz rir!

Thiago Sampaio
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