Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 11 de outubro de 2008

Guerra dos Rocha, A

Se fosse classificar "A Guerra dos Rocha" como alguma coisa, seria "mau investimento". Afinal, se for para ver algo que parece feito para a TV, tem ritmo televisivo e cujo roteiro é idêntico ao de um especial de fim-de-ano da Rede Globo, é melhor (e mais divertido) ficar em casa assistindo "Toma Lá Dá Cá".

A palavra "desnecessário" me veio à cabeça várias vezes durante a projeção de "A Guerra dos Rocha". Era desnecessário travestir Ary Fontoura para interpretar a matriarca da família, que Felipe Dylon estivesse em cena, que alguns bons atores estivessem pagando esse mico… enfim, eram tantas coisas desnecessárias que até esta crítica parece desnecessária!

Antes mesmo de o filme começar, já fui pensando mal do título da produção. "A Guerra dos Rocha" é um trocadilho infame quanto a "A Guerra dos Roses". Não estou me referindo à peça de Shakespeare, mas ao longa da década de 1980 com Michael Douglas em seu elenco que mostra o tragicômico fim de um casamento. Qualquer fita que tenha em seu título uma referência velada a outra, mas sem haver nenhuma ligação direta entre as duas, já é de se desconfiar (vide "Espartalhões" e "Todo Mundo em Pânico").

Começa o filme e, como surpresa, o logotipo da 20th Century Fox não está enquadrado corretamente. Achei que era problema de projeção, mas não! O logotipo da distribuidora não aparece direito no filme! Depois de uma abertura em animação completamente desastrosa (que parece ter sido feita por um aluno de 5ª série, com todo respeito a essas crianças, claro!), a "história" tem início.

Somos apresentados à matriarca da família Rocha, Dina (Ary Fontoura), uma senhora bem intencionada, mas que só causa confusão por onde anda. Atualmente morando na casa de Marcelo (Lúcio Mauro Filho), seu filho mais novo, e da esposa deste, Sofia (Taís Araújo), a atrapalhada anciã é expulsa de casa após desorganizar uma papelada que Sofia tinha levado a noite toda arrumando e destruir a cozinha do casal. Dina, então, vai até a casa de seu filho do meio, o "doente" César (Marcello Antony), um advogado estressado sem tempo para a esnobe esposa Júlia (Giulia Gam).

A bem da verdade, o imóvel é da velha senhora, mas está emprestado para César e Júlia viverem com a filha deles, a adolescente Bebel (Cecília Dassi), que mais quer saber de seu namorado surfista juvenil Bilinho (Felipe Dylon). No entanto, após mais um desentendimento com uma nora, lá se vai Dina buscar abrigo na casa de outro filho. O primogênito dela, o senador Marcos (Diogo Vilela), vive uma vida de luxo, ao lado de sua esposa-troféu Paola (Ludmila Dayer), esbanjando dinheiro e prestes a ser ouvido em uma CPI, dando uma festinha para uma testemunha-chave em seu caso. A chegada da destrambelhada senhora ameaça ruir a ocasião e o político despacha a mãe de volta para a casa do irmão mais novo. A partir daí, os três filhos e suas respectivas se reúnem para ver o que vão fazer com a idosa, enquanto a pobre mulher toma um rumo ignorado no meio do Rio de Janeiro.

Poucos escapam ilesos desse desastre. O talentoso Ary Fontoura está claramente fora de seu elemento vivendo a dona Dina. Desconfortável neste papel-central, Fontoura acaba não ganhando a simpatia do público, algo fundamental no projeto. Além disso, devo dizer que não havia nenhuma necessidade de se escalar um homem para viver a personagem, com tal fato aparentando ser um mero capricho por parte do diretor. O fraquíssimo Marcello Antony está pior do que o de costume vivendo o "hipocondríaco" César, sem nenhum timing para a comédia. Lúcio Mauro Filho simplesmente não funciona no longa, Giulia Gam só consegue irritar toda santa vez que aparece, Taís Araújo têm pouquíssimo tempo de cena e Ludmila Dayer é gostosa e só.

Cecília Dassi na pele da adolescente Bebel não tem muito o que fazer, se saindo até bem (na medida do possível). No entanto, boa parte das poucas aparições da jovem atriz são levadas ao fundo do poço pelo insuportável Felipe Dylon que, só de aparecer na tela, já da vontade ao espectador de sair correndo do cinema. Quem realmente se salva deste Titanic são Diogo Vilela e Aílton Graça, vivendo respectivamente o senador Marcos e seu assessor Marcondes. Os dois realmente possuem química juntos e um ótimo timing cômico, mas, como já dizia o ditado, uma andorinha só não faz verão (ou duas, como neste caso).

O diretor Jorge Fernando, mais uma vez, parece achar que a única diferença entre TV e Cinema é o tamanho da tela. Sim, pois só isso explica os cortes ridículos, a decupagem triste e o ritmo mais destrambelhado que a dona Dina. Para completar, o cinematógrafo Paulo Souza faz um trabalho terrível, nada lembrando sua participação no ótimo "Era Uma Vez", completando o toque de especial de fim-de-ano da Rede Globo com uma fotografia sofrível. Some-se isso com um elenco totalmente fora de sintonia e temos um filme-bomba nas mãos. O pior mesmo é a megalomania exagerada de Jorge Fernando, que ainda se insere em uma ponta sem pé nem cabeça no final do filme – se bem que, a esse ponto, podia aparecer quem fosse mesmo, que ninguém ligaria.

"A Guerra dos Rocha" é um desperdício de tempo e dinheiro do espectador e de salas de cinema para os exibidores. Para desespero de qualquer um que goste da sétima arte, o filme já vem acompanhado de um trailer do vindouro "Se Eu Fosse Você 2", produção no mesmo estilo canhestro. Deus tenha piedade de todos nós…

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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