Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 20 de setembro de 2008

Nem por Cima do Meu Cadáver

Algumas vezes, os filmes que chegam aos cinemas dão uma sensação saudosista das primeiras experimentações cinematográficas, quando as comédias, por exemplo, eram realmente divertidas e quase nada semelhantes entre si. Em "Nem Por Cima do Meu Cadáver" sabe-se exatamente o rumo que a história vai trilhar desde os minutos iniciais e é apenas um leve entretenimento.

A trama começa com os preparativos do casamento de Henry (Paul Rudd) com a histérica Kate (Eva Longoria Parker). Enquanto ela pira com cada detalhe para o dia mais importante da sua vida, o noivo apenas espera a hora de dizer o sim. O perfeccionismo de Kate acaba a devorando quando, ao reclamar de uma estátua de gelo no formato de um anjo sem asas, a própria escultura cai em cima dela e a mata.

Um ano após o acidente, Henry e sua irmã Chloe (Lindsay Sloane) visitam a casa de Ashley (Lake Bell), uma médium trambiqueira, na tentativa de fazer contato com Kate para tirar Henry da solidão. Sem sucesso, Chloe influencia Ashley a fingir ter tido o contato espiritual com a falecida para instigar Henry a ser feliz, porém a situação muda. Ashley se apaixona por Henry, e ainda terá que lidar com o fantasma de Kate, que não deixará os dois serem felizes.

Não há inovação na história escrita e dirigida por Jeff Lowell. Aqui temos a mocinha que tenta ficar com o galã, mas vive um inferno com uma pseudo-vilã. Ainda temos a irmã idiotizada do galã e o melhor amigo gay da mocinha. Enquanto Cazuza diz que os destinos de alguns foram traçados na maternidade, neste longa os destinos de traçados não têm nada. Os desfechos para os quatros é o convencional de qualquer comédia romântica, que apela para as fórmulas do gênero. Até chegar ao final, é fato que existem alguns poucos momentos que causam o mínimo de diversão, vide a cena do banheiro da academia, mas é impossível não sentir a falta de uma pimenta a mais para causar humor. Na direção, Lowell faz o feijão com arroz, se limitando ao prático.

As gags típicas de comédias estão presentes, porém parte delas acaba soando menos desagradável devido às atuações do elenco. Não que eles estejam brilhantes, pelo contrário. Porém, é fato que Lake Bell tem um senso cômico bem articulado, visto recentemente no divertido "Jogo de Amor em Las Vegas". Isso já não se aplica por completo em Eva Longoria Parker, que restringe-se a um personagem sem profundidade e muitas vezes sem graça para as ocasiões que deveriam ser hilárias. Talvez somente na cena em que Parker cantarola uma música enquanto Ashley e Henry tentam ficar a sós é que a atriz arranca risadinhas.

O galã Paul Rudd continua se rendendo a comédias meia-boca que só desgastam sua carreira com a fama de "moço de comédias românticas". E mais: talvez ele tenha futuro em outros gêneros também, já que não é um ator ruim. Ainda temos a participação especial de Jason Biggs, estrela da franquia "American Pie", que tem seus maneirismos exagerados, porém foge da caricatura completa e pontua com coerência a evolução de seu personagem, por mais que o roteiro faça isso de uma forma artificial e desesperada para tentar encontrar soluções aos seus problemas.

Ainda que o longa apresente essas irregularidades, não há muito o que esperar de algo comum. É redundante escrever a cada comédia romântica nova que o gênero precisa de mais impulso e criatividade, como é o caso. Não há nem a preocupação com uma trilha sonora contemporânea legal que agite o público-alvo do longa, com baladinhas românticas. A trilha instrumental também deixa a desejar, já que muitos momentos pedem acompanhamento sonoro para aumentar a dramaticidade. Como nem tudo é só negação, o longa articula algumas mensagens bonitinhas sobre paixão e apaixonados, além de medir o teor dramático correto quando é necessário, vide a seqüência final.

"Nem Por Cima do Meu Cadáver" é, assim como seu título, longo e nada original. Mas se tem uma coisa que eu acho interessante nessas repetições fílmicas de comédias é que o público passa a aceitá-las apenas como entretenimento de fácil digestão e ainda agrada qualquer tarde monótona de domingo. Talvez seja por isso que os espectadores nem cheguem a odiar o longa, mas certamente reforça a idéia de que hoje em dia é preciso de muito mais criatividade do que trazer do além uma personagem para incomodar o mundo dos vivos. "Ghost – Do Outro Lado da Vida" agradece.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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