Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 21 de junho de 2008

Casamento em Dose Dupla

Comédia sobre relacionamentos familiares e amorosos. Assim como os filmes de super-heróis, este tema é recorrente na indústria cinematográfica atual. Como se ainda tivesse algo a acrescentar naquilo particularmente óbvio, “Casamento em Dose Dupla” é desnecessário.

Na trama, Noah Cooper (Dax Shepard) trabalha como fisioterapeuta até que é demitido quando menos espera. Como se não bastasse o infortúnio, sua esposa Clare (Liv Tyler) deseja ter um filho para completar a vida do casal. Sem cabeça para pensar em qualquer tipo de responsabilidade, Noah ainda terá que aturar o primo de Clare, Myron (Mike White), que se hospeda até a data de um evento importante. Para se juntar ao time também chega a mãe de Noah, a dramática Marilyn (Diane Keaton), que decide se separar e vai morar com o filho. A vida dos quatro passam por altos e baixos para comprovar que, ao final, tudo fica bem e o amor surge das pequenas coisas e de onde menos se esperava. Aquela justificativa básica e sempre usada em filmes do tipo.

Depois do péssimo “Minha Mãe Quer Que Eu Case” e de outras comédias no currículo, Diane Keaton volta ao estereótipo de mãezona. Desta vez, o exagero de sua atuação e a forma caricatural com que encarna uma mãe conflituosa aos sessenta anos desagrada aos olhos do espectador. Aliás, Keaton virou sinônimo de comédia pastelão, demonstrando que sua carreira vai de mal a pior e sem planos para largar o gênero. Afinal, é um estilo mais prático e de consumo rápido do público, que não exige atuações tão boas e dá dinheiro, mas que não deixa de revelar a fragilidade de uma carreira de quem já fez filmes como “O Poderoso Chefão”. O último trabalho realmente interessante de Keaton nas telonas foi em 2005, com o gracioso “Tudo em Família”, na qual também interpretava a matriarca de uma família. A diferença é que este filme tinha um roteiro brilhante e sensível, o que não se repete em “Casamento em Dose Dupla”.

Em mais um projeto com a temática de casamento que fez de “Licença Para Casar” outro fracasso, a dupla Tim Rasmussen e Vince Di Meglio se perde na tentativa de dar ao roteiro o argumento necessário que motive os personagens. Entretanto, o que mais parece é que ele usa desculpas esfarrapadas para montar sua trama. Vamos aos problemas: Marilyn é super-protetora e impulsiva, talvez parecida com algum parente próximo, e gosta apenas de estar junto do filho. Isso é demonstrado desde o início. Por mais “prego” que ela seja, nada na vida do casal Noah e Clare parece ser abalado por causa disso. Quando Marilyn aparece na casa deles para morar, ela fica a primeira noite, esticando o prazo de algumas semanas até achar um lugar para ficar. Ao final da trama, são apenas quatro dias de convivência que os próprios roteiristas procuram de todas as formas criar situações psicóticas para fazer desse convívio um inferno.

Neste meio tempo, Marilyn consegue um emprego na mesma empresa do filho, rouba o carro da nora, descobre coisas sobre o marido e ainda tem a sogra enchendo o saco com seu conservadorismo. Aliás, a fatalidade com a sogra é simplesmente de mal gosto, servindo como gancho para uma cena ridícula onde os protagonistas batem boca na igreja. Ainda: quando Noah precisa dar um aviso à mãe em relação ao trabalho, os roteiristas fazem Keaton ter reações realmente contrárias ao momento, tornando a personagem uma idiota.

Se ao final do filme tudo sempre se resolve e a idiotice e defeitos dos personagens são esquecidos ou amenizados, pra quê diabos fazer um filme que não se sustenta? Como se não bastasse, ainda existem tramas paralelas que envolvem o desejo de Clare ter um filho, enquanto Myron precisa revelar ao público suas idéias mirabolantes para roteiros de filmes. Ah, e todos os cachorrinhos de Marilyn têm o mesmo nome e o chefe de Noah é um pervertido social. Quanta criatividade!

Além da incapacidade de investir em momentos realmente engraçados, o máximo que os roteiristas conseguem é constranger com a escatologia em boa parte da história. Di Meglio, que ficou responsável também pela direção, não tem o timing cômico necessário para que a história tenha um ritmo de comédia romântica, muito menos tem noção do produto como um todo. Em diversos momentos, os eventos em que os personagens se envolvem se tornam sacais e tudo o que você quer é que o filme acabe logo! Até quando há a esperança de pelo menos um momento divertido (cito aquele em que Marilyn bebe além da conta em um bar), realmente o diretor não sabe explorar o potencial do momento.

Como diretor de atores, Di Meglio continua deficiente, já que exige de Keaton uma atuação explosiva e desagradável e de Liv Tyler um excesso de doçura em sua fala e atos que não condizem com a trama, sendo irritantes. Quando a personagem precisa se alterar, Tyler praticamente encarna outro papel, o que faz de Clare irrelevante e sem motivações especiais. Dax Shepard tenta dar o ar Zach Braff em comédias, mas o máximo que consegue é ter uma atuação regular. Ainda assim, em um determinado momento em que Noah briga com a esposa, Shepard agride o público com a falta de naturalidade da cena, tornando tudo que foi visto até agora uma total falta de tempo.

Se você pensa que “Casamento em Dose Dupla” tem argumentos para ser diferente das comédias pastelões que não fazem rir e apelam para as mesmas piadas, quedas e gags, sugiro escolher outro filme. Nem Diane Keaton faz a produção ser mediana, se colocando na lista das comédias descartáveis deste ano. Um filme de mal gosto, que sequer consegue oferecer momentos de entretenimento ao espectador. Passe longe!

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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