Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 22 de junho de 2008

Agente 86

Na década de 1960, Mel Brooks e Buck Henry estrelaram a série “Agente 86”, que seguia as desventuras do atrapalhado, mas competente, Maxwell Smart, o Agente 86 do CONTROLE, equipe de espionagem do governo americano. Subversivo e hilário, o programa durou cinco temporadas e foi um grande sucesso. Este remake conseguiu colocar no cinema toda a graça que a série original tinha.

Devo confessar que estava com muito medo do que veria ao entrar no cinema para assistir a “Agente 86”. Como grande fã da série, temia que a genialidade atrapalhada de Maxwell Smart fosse tão diminuída nesta versão em tela grande quanto foi a do Inspetor Clouseau em sua mais recente versão cinematográfica. Felizmente, parece que os realizadores do longa também são fãs do material original, tornando esta nova versão do agente secreto mais azarado da história da cultura pop uma ótima experiência, tanto para fãs antigos, quanto para os novatos da franquia.

De uma maneira estranha, este filme pode até ser considerado uma continuação da antiga série. Se passando nos dias de hoje, a agência de espionagem norte-americana conhecida como CONTROLE foi publicamente desativada, com os apetrechos clássicos usados por seus agentes de campo sendo expostos em um museu. Mas isso é apenas uma fachada, com o grupo ainda agindo, desta vez em ações contra-terroristas.

Nisso, somos apresentados à Maxwell “Max” Smart (Steve Carell), analista sênior do CONTROLE, que realiza minuciosos relatórios sobre as atividades dos seus alvos. O maior desejo de Smart é ser promovido para agente de campo, objetivo que seu físico “avantajado” atrapalhou nas sete tentativas anteriores. Tendo entrado em forma e tirado notas altíssimas em uma nova bateria de testes para o trabalho, ele acaba não sendo promovido pelo seu Chefe (Alan Arkin) por ser muito importante em seu trabalho no escritório. Desiludido, Max encontra sua chance quando a sede do CONTROLE é invadida por um grupo de terroristas da KAOS, velho inimigo da agência de espionagem que todos julgavam ter sido derrotado.

Com a identidade de todos os agentes de campo do CONTROLE exposta, Max é promovido a Agente 86 e colocado como parceiro da experiente e bela Agente 99 (Anne Hathaway), enquanto seu melhor amigo e melhor homem do CONTROLE, 23 (The Rock), é obrigado a ficar realizando trabalhos no escritório. Agora, Max e 99 terão de conseguir trabalhar em equipe para encontrar aquele considerado como o grande chefão da KAOS, Siegfried (Terence Stamp).

O grande trunfo do filme está em não mostrar Max Smart como um idiota. Claro que o Agente 86 é um tanto quanto atrapalhado e inexperiente, mas consegue analisar situações de perigo como ninguém, é um ótimo estrategista, exímio atirador e corajoso como ninguém. No entanto, sua ingenuidade (quase) sempre o coloca em perigo e o deixa em maus lençóis com a 99. Steve Carell está em casa com esse tipo de personagem, um homem habilidoso, que não é levado a sério justamente por seu bom caráter. Aliás, o ator devia dar aulas para muitos pseudo-comediantes por aí. Seguindo o exemplo de Buster Keaton, Carrel consegue ser engraçado mesmo (ou seria principalmente?) quando está sério, sendo o homem ideal para ser o novo rosto do Agente 86.

Max não chegaria a lugar nenhum sem sua parceira, a Agente 99, e Anne Hathaway está perfeita no papel do contraponto sério desta inusitada parceria. Sempre focada no dever, 99 é a agente perfeita, que sacrificou muito de sua vida pessoal pelo seu dever, tendo passado por uma plástica radical para ganhar um novo rosto. É interessante notar que o trabalho mais marcante de Hathaway, “O Diabo Veste Prada”, faz um ótimo contraponto com essa postura workaholic adotada por 99. Ela e Carell formam uma dupla perfeita na tela, com os dois tendo uma ótima química em cena.

Os demais integrantes do elenco aparecem muito bem na fita. O fenomenal Alan Arkin dá um ar de respeitabilidade imponente ao nem sempre tão controlado Chefe do CONTROLE. Dwayne “The Rock” Johnson encarna o típico estereótipo do agente secreto com perfeição, colocando ainda seu bom-humor característico ao personagem.

A dupla de vilões vivida por Terence Stamp e Ken Davitian faz rir com a solenidade do primeiro fazendo contraponto ao jeito despojado do eterno produtor rechonchudo do repórter Borat. Mas quem rouba a cena, em curtas participações, são Bill Murray e James Caan. O primeiro vive o azarado Agente 13, sempre relegado a disfarces nada convencionais. Já Caan interpreta um Presidente dos EUA nada convencional – apesar de extremamente realista.

Devo dizer que Peter Segal me surpreendeu muito na direção desta fita. Dono de uma filmografia instável que conta com a bomba como “O Professor Aloprado II – A Família Klump”, o bom “Corra Que a Polícia Vem Aí 33 e 1/3” e o razoável “Como Se Fosse A Primeira Vez”, Segal mostra um humor mais contido em “Agente 86”, abusando de gags de pano de fundo e ótimas sacadas, como a hilária e nada sutil homenagem à “Fahrenheit 11 de Setembro”.

O cineasta jamais tenta reinventar a roda, preferindo apostar em planos mais comuns. Além disso, alguns quadros são tirados diretamente da série de TV original. É simplesmente maravilhoso para os fãs ver a abertura e o encerramento do antigo programa de TV sendo atualizados na tela do cinema – com direito ao tema original do seriado.

O ritmo de filmagem por ele imposto não é, de maneira alguma, o de um “filme sátira”, mas sim de uma comédia de ação que presta homenagens a um gênero, o que foi a escolha mais do que perfeita para este projeto, já que esta produção conta com algumas cenas de ação de fazer inveja a alguns longas policiais. Para níveis de comparação, o editor de “Agente 86”, Richard Pearson, é um dos montadores do novo 007, “Quantum of Solace”.

Divertido, agitado e hilário, “Agente 86” se torna uma das maiores surpresas desta temporada de lançamentos do meio do ano, sendo uma produção que agradará a diversas faixas de cinéfilos. Recomendado!

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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