Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 24 de março de 2008

Olho do Mal, O

As velhas fórmulas estão de volta com “O Olho do Mal”. Mais uma versão hollywoodiana para uma produção oriental, o longa faz o básico que é esperado em um filme de terror, sendo apenas mais um no mercado. A impressão de ser um filme mediano o deixa sem tanta característica de grotesco.

Baseado no chinês “The Eye – A Herança”, a trama do longa é sobre uma talentosa violinista cega que finalmente está prestes a fazer uma operação de córnea. Depois de anos de escuridão, Sydney (Jessica Alba) agora precisa aprender a viver em um mundo de imagens que não estava acostumada. Junto com sua nova habilidade física, a garota passa a enxergar mais do que deveria, tendo contato imediato com o mundo dos mortos. Entrando em paranóia devido às visões, Sydney precisa do apoio da irmã Helen (Parker Posey) e do neuropsicólogo Paul (Alessandro Nivola) para conhecer o passado do doador das córneas e descobrir o porquê dos eventos fantasmagóricos.

Não existe novidade no roteiro de Sebastian Gutierrez. O foco é a bela moça que se atormenta por imagens de crianças e espíritos que flutuam. Um despertador marca uma mesma hora todos os dias e eventos transcendentais deformam ambientes e pessoas. O que também é possível perceber na tentativa de deixar o longa um pouco fora do convencional é não apelar exageradamente ao grotesco, como temos em “O Grito”. Isso acaba prejudicando alguns números de susto com os espíritos, mas ao mesmo tempo não dá a sensação da inteligência do público estar sendo ofendida com as imagens toscas. Percebemos a preocupação em se aproximar, nem que seja um pouco, do palpável e do universo das pessoas que têm visões (para quem acredita nelas).

Por ser uma produção americana, o enlatamento acaba sendo inevitável, e fica claro o esforço dos diretores franceses David Moreau e Xavier Palud em se adequar às fórmulas impostas pela Paramount. Mesmo assim, percebemos a eficácia em diversos planos criados pela dupla, como o aproveitamento dos corredores do apartamento de Sydney ou as imagens sem foco na primeira parte da produção, quando a garota ainda está tendo sua visão ajustada. Ainda assim eles conseguem uma boa comunicação com o elenco, criando bons momentos em cena, como no ato final.

Moreau e Palud desagradam quando não se decidem se estão filmando um drama ou um suspense/terror. Isso causa um desajuste para chegar ao clímax da trama, quando fica claro para o público que a investigação sobre o doador das córneas ficou muito distante e enfada em cena, criando outras intenções e justificativas planas para resolver a história. Aliás, o desfecho para a protagonista acaba sendo muito óbvio, não só por um determinado momento mostrado no trailer de cinema, como pelo formato que as coisas vão se construindo (ou destruindo).

Jessica Alba continua com sua beleza indiscutível, ainda que não demonstre ser uma atriz de primeira. Mesmo assim, ela é nova e tem muito a aprender. Passar por um filme de terror ruim não costuma ser positivo para grandes estrelas, mas é fato que boa parte delas trabalha em uma produção do gênero em Hollywood, seja por dinheiro ou por experimentação. O fato é que em “O Olho do Mal”, Alba é o mais atrativo em cena, dando a impressão de carregar uma produção, no mínimo, mediana. Não que ela esteja em uma atuação excelente, mas a forma como ela se comunica com o espectador é válida para criar um voto de confiança no que está sendo exibido, afastando aquela idéia de terror-trash-americano.

O restante do elenco passa praticamente despercebido. Parker Posey tem sua personagem mal desenvolvida. Com a projeção, descobrimos o peso da relação entre Helen e Sydney no passado e a luta em conseguir um transplante pela irmã. Entretanto, isso acaba soando mais como um motivo mal encaixado para a aparição da personagem, visto que se fosse cortada, não faria a mínima diferença.

O ator Alessandro Nivola faz de Paul o porto seguro de Sydney, criando aí uma relação amorosa a ser desenvolvida e que justifique o apoio que ele precisa dar na descoberta do passado do doador das córneas. Inclusive um momento que pode até ter soado piegas, mas que demonstra a habilidade em desassociar algumas tendências de filmes de terror é protagonizado pelo próprio Nivola, que faz referência ao “I see dead people”, de “O Sexto Sentido”, produção pioneira e instigante de M. Night Shyamalan.

Entre os aspectos mais técnicos, a edição ficou prejudicada pela refilmagem de grande parte da película, dando a impressão de que muitos erros de continuidade aparecem em cena, principalmente em relação à aparência de Jessica Alba. Isso também causa um embate em relação ao encaminhamento da trama, sempre morna até conseguir dar uma sacudida no que a protagonista precisa fazer para descobrir o que tem por trás dos eventos sobrenaturais. A trilha sonora chega simples e corre sem tanta gradação no decorrer da narrativa.

Mesmo não sendo de todo bom e mostrando tudo o que já foi visto antes, “O Olho do Mal” dá a impressão de ser um filme, no mínimo, assistível. A falta de apelo ao máximo das imagens monstruosas e aberrações do mundo sobrenatural poupa o público de grandes julgamentos negativos, dando margem a uma análise mais dramática da situação da protagonista. Sem muita pretensão a não ser agitar as bilheterias mundiais, o longa é simples e esquemático. Pelo menos o que é para ser horror não se transforma em constrangedores momentos cômicos.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

Compartilhe

Saiba mais sobre