Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 08 de março de 2008

Em Pé de Guerra

Ornado de clichês do começo ao fim, “Em Pé de Guerra” apresenta-se como um filme superficial e desnecessário, falhando em sua única arma para segurar o espectador: boas risadas. Não satisfeito em ser sem graça, ele chega a ser constrangedor.

Na trama, o escritor John Farley (Seann William Scott, da franquia “American Pie”) escreve livro de auto-ajuda e é bastante respeitado pelo trabalho que desenvolve. Sucesso de vendas ao redor do país, ele passa em seus exemplares a motivação necessária para enfrentar dificuldades cotidianas, viajando o país inteiro para oferecer palestras.

Tudo vai muito bem até o dia em que Farley tem a pior notícia da sua vida: sua mãe, Beverly (acredite se quiser, Susan Sarandon, de “Vida Que Segue”) está apaixonada pelo homem que transformou sua vida em um inferno durante a adolescência, o Sr. Woodcock (Billy Bob Thorton, de “Papai Noel às Avessas”). Justamente o homem que acabou com sua auto-estima, arrasando-o de maneira física e psicológica (e de vários de seus amigos), está prestes a virar seu padrasto.

Desesperado, Farley tentará provar para si e para os outros que, não só superou tudo que aconteceu no passado, mas também o fato de que hoje é um homem muito melhor que Woodcock em todas as áreas de sua vida. Deu para sentir o que vem por aí?

Uma sucessão de piadas sem gosto invade a tela. Piadas com comidas, com pessoas acima do peso…. é um festival de mal gosto. O roteiro cru e superficial não consegue desenvolver o texto e nem amarrar a trama, fazendo uso exacerbado de situações já vistas antes – e que sequer foram boas. A impressão que se tem ao assistir aqueles momentos é, realmente, de que foram trabalhados em algum outro filme. Para piorar a falta de originalidade e perspicácia, some isso ao fato de que, além de tudo, foi mal copiado. Simplesmente não surte nenhum efeito.

Os inexperientes Michael Carnes e Josh Gilbert assinam o script, que certamente é um mal passo em uma carreira iniciante. Se o filme funcionou única e exclusivamente como um laboratório, espero sinceramente ver trabalhos que funcionem no futuro. Só não entendo como trabalhos que mais parecem um exercício estudantil conseguem não só orçamento para serem filmados, como ainda distribuição internacional.

Outro grande erro foi a escalação do elenco. Se existem duas figuras antipáticas, sem carisma e entediantes na indústria cinematográfica, seriam exatamente Scott e Thorton. Não sei quais as intenções de Thorton como profissional, mas me pergunto seriamente se um dia ele vai fazer um papel que não seja ele mesmo. Francamente, onde estavam com a cabeça quando colocaram esses dois juntos em cena? São fracos e caricatos, e entre eles não há interação alguma. Um caso simples de pessoas que não funcionam bem em cena, nem conseguem extrair nada do roteiro e que entram mais uma vez em um dos piores conceitos de cinema que os americanos poderiam ter criado: filmes supostamente de comédia, que precisam fazer apelos sexuais em suas histórias para parecer engraçado, já que o roteiro geralmente não se sustenta em si. Porém já está comprovado que o estilo de comédia adolescente inaugurado em “American Pie” já ficou para trás (ainda bem).

Agora a maior surpresa foi ver Susan Sarandon, uma das maiores atrizes da atualidade, entrar em um projeto tão sem rumo como esse. Acredito que tenha sido um desses casos de apoio a estreantes do cinema, pois de outro motivo não entendo o que uma profissional do seu porte foi fazer em uma produção sem eira e nem beira como esta. Sim, porque é exatamente o que se espera de atores como Thorton e Scott, mas não dela.

E finalmente, chegamos a Craig Gillespie. Gillespie pode não ter experiência com cinema, mas ele tem tempo atrás das câmeras. Foi diretor de comerciais por longos dezesseis anos, mas como diretor cinematográfico é, no mínimo, confuso. Não sei se o roteiro era de todo ruim, mas ele certamente pecou ao fazer sua leitura nas telas. Ok, a história em si não ajuda, é fraca, o elenco é outro ponto constrangedor. Mas a direção pode dar sua parcela de jeito nisso, e Gillespie não tem vivacidade suficiente para fazê-lo. Várias vezes perde o rumo da cena, tornando-se repetitivo e mostrando pouca (ou nenhuma) criatividade.

Outro problema é o excesso de didática na trama, um recurso que já deixou claro não funcionar. Conseguimos enxergar claramente tudo que vem a seguir, porque acaba transformando-se em uma cadeia de fatos previsíveis, onde todas as cenas são explicadas demais e o público não tem o prazer de tentar desvendar o que ainda está por vir.

A câmera de Gillespie não tem atitude, não mostra a que veio e vacila por não conseguir sequer atender a rapidez que a comédia necessita. Seu principal erro seria ter sérios problemas em dosar as situações e extrair dela aquilo que necessita: seja riso, drama, ou o ponto em que acontece a lição de moral do longa. “Em Pé de Guerra” é um filme que pode ser bem descrito como sem graça.

Beatriz Diogo
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