Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 16 de fevereiro de 2008

Velocidade Sem Limites

Assistir à "Velocidade sem Limites" é uma experiência frustrante. Vemos carros caríssimos, que nunca poderemos dirigir, correndo e sendo destruídos e mulheres lindas se digladiando para aparecerem na câmera, mas que nunca mostram absolutamente nada. Ah, sim... O filme tem uma história! E é exatamente isso que o faz ir pelo ralo.

"Eu quero ser o seu carro". Quando a belíssima atriz Nadia Bjorlin, estrela deste "Velocidade Sem Limites", começou a cantar esta música, tive a certeza que estava vendo um dos pontos mais baixos da sétima arte que já terei o desprazer de assistir em toda a minha vida. Sim, este poderia ser apenas um "Velozes e Furiosos" genérico, mas, enquanto o produto original era uma bobagem cinematográfica divertida, este aqui consegue causar danos cerebrais permanentes.

Dirigido pelo dublê (de cineasta e de verdade mesmo) Andy Cheng, o longa até se sai bem quando apresenta seus astros principais em cena. Ferraris, McLarens e Mercedes estão todos muito bonitos, correndo a velocidades absurdas e fazendo manobras que desafiam as leis da física. Mas quando aparecem seres humanos em cena, o desastre é iminente.

Claro que existem as exceções e estas vem na forma – e que forma! – das modelos incrivelmente lindas e sem talento algum que se engalfinham para aparecerem em cena como se fossem as meninas daquele programa de TV, o "Fantasia". Aliás, este é o perfeito resumo deste projeto: muito bonito de se ver, mas sem abrir a boca, por favor.

Para escrever o "roteiro" desta abominação de 90 minutos foram necessárias duas pessoas. Esses dois indivíduos conseguiram juntar todos os clichês de filmes de ação e corrida existentes na longa trajetória do cinema e condensá-los em um único "treco". Irmão morto? Confere. Pai falecido em um acidente trágico? Claro! Herói de guerra voltando pra casa? Com certeza!

Linhas e linhas de texto poderiam ser gastas discorrendo sobre cada um destes chavões, mas vamos resumir com a certeza de que estão todos no filme. Apesar de originalidade (ou a falta desta) não ser sinônimo de qualidade, saber se utilizar de clichês com certeza é, e Robert Foreman e Daniel Sadek com certeza não estão nem perto disso.

A história mostra a escultural Nat (Bjorlin), dona de uma loja de peças automobilísticas e que sonha com o estrelato junto à sua banda. Chamada pelo ricaço Infamous (Eddie Griffin) para tocar em uma corrida promovida por alguns milionários, ela acaba sendo colocada para correr, pois herdou os dons de pilotagem de seu pai, que morreu em um grande prêmio anos atrás.

Enquanto isso, o boa pinta Carlo (Nathan Phillips) acaba de voltar do Iraque onde serviu como soldado. Encontrando seu irmão mais moço, o boa-vida Jason (Jesse Johnson), trabalhando como piloto de corridas para o seu inescrupuloso tio Michael (Angus Macfadyen), ele acaba indo de encontro aos interesses do vilão ao se apaixonar por Nat, que conquistou Michael ao cantar "Eu quero ser o seu carro" antes da corrida. Também tem a parte do vilão estar envolvido com criminosos barra-pesada, mas… Quem liga? Tudo será, invariavelmente, em uma última corrida mesmo.

E são nestas que o forte de Andy Cheng se mostra. Todas as seqüências automobilísticas são muito boas e divertidas, mas se trata de um filme não de um auto-show, algo que qualquer um pode assistir na TV a cabo. Um bom filme "de ação" consegue intercalar as cenas de proezas físicas com um divertido desenvolvimento de personagens, algo inexistente nesta produção, que ainda possui uma cena que ultrapassa todos os limites do ridículo, com a aterrissagem de um avião em uma estrada, a qual conseguiu me deixar em choque.

É como se o espectador estivesse assistindo a um filme pornô, onde a narrativa cai para o 53º plano. E os bons apreciadores da anatomia feminina que não se afobem, já que a mulherada aparece em cena, no máximo, de biquíni, com apenas várias insinuações quase sensuais das já citadas modelos-figurantes para as câmeras.

Os atores têm um desempenho uniforme, com todos eles sendo absurdamente ruins. Nadia Bjorlin é deslumbrante, mas realmente não sabe atuar, quanto mais cantar. Os trinta segundos onde a atriz solta a voz poderiam ser usados como tortura pelos oficiais americanos no Iraque. Falando em soldados, temos Carlo, vivido por Nathan Phillips. Ele é o mais inexpressivo "herói de ação" já visto nas telas. O ator não consegue convencer sequer nas cenas de luta, o trabalho do "intérprete" nas seqüências pseudo-dramáticas chega a ser constrangedor.

Os apostadores das corridas são versões sem graça dos milionários liderados por John Cleese em "Tá Todo Mundo Louco!", apostando quantias imensas com coisas sem sentido. Dentre eles, destaco Eddie Griffin, que está uma caricatura ambulante do negro americano endinheirado. O ator deveria ser preso por perpetuação de estereótipo racista! Já outro membro do grupo de ricaços, o Michael de Angus Macfadyen, é um dos vilões mais patéticos que eu já vi, com o ator não desperta nada no espectador além de pena, não pelo personagem, mas pelo papel de ridículo que faz.

A trilha sonora consegue reunir o que existe de mais batido do hip-hop, com músicas que parecem rejeitadas da série de games "Need For Speed". Já a edição segue o padrão dos atuais filmes de corrida, com trezentos cortes despropositados por minuto, sendo raros os planos que duram mais de quatro segundos.

Como obra cinematográfica, "Velocidade Sem Limites" pode ser classificado como uma bobagem sem limites. No entanto, caso Andy Cheng decida dirigir uma produção sem narrativa, mostrando apenas mulheres seminuas lindas e cenas de carros em alta velocidade fazendo acrobacias insanas, assistirei com o maior prazer, desde que seja no conforto da minha casa e bem longe de uma sala de cinema.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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