Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Sangue Negro

"Sangue Negro" á uma história dedicada a um personagem. Sem o talento de um elenco altamente competente não haveria razão para a indicação ao Oscar. Sem a capacidade tocante de Daniel Day-Lewis em construir um personagem apaixonante não haveria "Sangue Negro".

Dizem que a televisão é de quem produz, o cinema de quem dirige e o teatro de quem atua. Em cada uma das formas de arte um profissional se destaca por poder imprimir de maneira mais acentuada seu ponto de vista e seu talento. É seguro dizer que, se isso for uma regra, “Sangue Negro” é a exceção. Daniel Day-Lewis é o maior atrativo do longa-metragem dirigido por Paul Thomas Anderson e a razão maior da indicação ao Oscar.

Daniel Plainview é um homem que batalha por seu sucesso. Sozinho no deserto, Daniel encontra prata e ouro, o suficiente para iniciar uma pequena companhia de mineração. O grupo de trabalhadores encontra, por acaso, um poço de petróleo em uma das minas que exploram e, junto com a riqueza, uma tragédia, o acidente que torna o óleo evidente mata um dos colegas de Daniel, um pai solteiro.

O bebê órfão é adotado pelo homem que logo se torna um magnata do chamado ouro negro. A criança é também um símbolo do que Daniel Plainview chama de “negócio familiar”, uma maneira de conquistar e convencer pequenos proprietários de terra a venderem seus terrenos para que a empresa perfuradora continue a prosperar.

O protagonista realmente não mede esforços para conquistar seus objetivos, mesmo que para isso (e aí está a justificativa do título americano, “There Will Be Blood”, em tradução “Haverá Sangue”) sangue seja derramado. É Daniel Plainview, brilhantemente interpretado por Daniel Day-Lewis, o motivo da existência de “Sangue Negro”. O longa-metragem, de quase 3 horas de duração, é a história de uma vida, a narrativa de uma conquista merecida por um homem cínico e ambicioso.

Não é só Daniel Day-Lewis quem brilha na criação de seu personagem. O garoto Dillon Freasier, que interpreta H.W. Plainview, recebeu a difícil tarefa de se comunicar com o olhar. Aos 10 anos e atuando profissionalmente pela primeira vez, Freasier forma um par adorável com Day-Lewis. Um filho que sabe trabalhar como um adulto e tem a maturidade que seu pai não tem. A inocência da criança, já perdida em Daniel Plainview, é o ponto de apoio da moralidade do adulto.

Outro ator que se destaca é Paul Dano, como Eli Sunday, um jovem que acredita encontrar na fé qualquer solução para os problemas da vida. Um pastor tão determinado em realizar seus objetivos quanto Daniel. A semelhança entre os dois personagens é notável e a qualidade da atuação de Dano é mantida mesmo ao lado de um ícone do cinema como é seu colega.

A fotografia e a cenografia de “Sangue Negro” agem como complementos da construção dos personagens. O clima árido onde prevalecem as terras petrolíferas parece formar um conjunto perfeito com o coração do magnata do petróleo e, por mais que isso seja exagerado ou piegas, seria somente em terras como essas que uma atitude tão feroz quanto ao alcance da riqueza e tão indiferente quanto à humanidade poderiam ser mescladas. Um clima tropical, uma fotografia mais voltada para o azul não sustentariam o personagem.

Enquanto Daniel é coberto de petróleo, sua alma também é suja. O rosto envelhecido de Day-Lewis, combinado ao figurino seco, mesmo para um personagem com tanto dinheiro, vive sujo pela substância que mais preza. A camada negra parece difícil de limpar, um tipo de material que impregna. “Sangue Negro” não seria nada sem atores altamente competentes. Não seria anda sem o cuidado na construção de personagens e do talento do seu protagonista.

Lais Cattassini
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