Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Mestres do Universo

“Mestres do Universo” tem méritos que não foram percebidos na época de seu lançamento, em 1987, mas é um filme datado, frente à evolução dos épicos de magia.

Um dos desenhos animados de maior sucesso dos anos 80, é natural que He-Man tenha sido adaptado para o cinema naquela década. O surpreendente é que “Mestres do Universo”, agora disponível em DVD, tenha ido mal nas bilheterias. Afinal, tendo em vista a popularidade da franquia nos desenhos, ninguém poderia esperar o fracasso no cinema.

Com um custo de US$ 17 milhões, o filme arrecadou pouco mais do que isso nos Estados Unidos. O público do desenho não parece ter aceito a versão para o cinema – que aliás tomou várias liberdades em relação à matriz. Como filme, deixa a desejar e mostra o quanto as franquias dos anos 80 eram tratadas com desleixo, comparado aos padrões de hoje, quando séries como “X-Men” são cuidadosamente planejadas e executadas, em várias mídias diferentes – quadrinhos, desenho, cinema etc.

O filme inicia com Esqueleto tendo dominado o Castelo de Greyskull, no reino de Etérnia. A Feiticeira, guardiã do Castelo, é feita prisioneira. As forças de resistência são eliminadas. He-man e os poucos remanescentes entram em combate com Esqueleto, mas terminam tendo de fugir através de um portal que acidentalmente os lança no planeta Terra. A única maneira de retornar é através da chave que abre o portal e que também é lançada à Terra. He-Man e os mestres do universo precisam encontrar a chave, mas terão de enfrentar o exército de Esqueleto.

Há algumas coisas que podem explicar o fracasso nas bilheterias. Em primeiro lugar, aspectos do desenho que o filme não aproveitou. He-Man não tem superpoderes – é apenas um exímio guerreiro, uma espécie de Conan de outra galáxia. Sua espada ainda é mágica, mas na maior parte do filme ele usa armas de laser, no estilo “Star Wars”. Não há o príncipe Adam – o alter-ego do herói-, nem Gorco – o mago engraçado –, e Pacato – o tigre medroso que se transforma no Gato Guerreiro. Também faltam alguns dos aliados do herói. Os fãs costumam ser implacáveis com liberdades excessivas nas adaptações.

Outra falha do filme é a fraqueza como cinema. “Mestres do universo” se pretende um épico mágico, como outros filmes da época – por exemplo, “A História Sem Fim” (1984). Mas por descuido ou falta de dinheiro, oferece um cenário tímido e enxuto, enquanto filmes como “A Lenda” (1985) eram grandiosos na construção de seu universo. Mesmo quando a ação ocorre na Terra, o cenário é prejudicado: não há um pedestre ou motorista nas ruas da cidade onde He-Man enfrenta as forças de Esqueleto (e cujo nome não é dito no filme).

Mesmo assim, “Mestres do universo” também tem méritos. A temática remete a uma jornada para um mundo mágico, no qual se aprende a valorizar o que é mais importante na vida. No caso, através de Julie Winston (Courteney Cox), que vai a Etérnia e ajuda He-Man no combate com o Esqueleto. Ela jamais será a mesma após retornar da jornada. Como já notaram alguns críticos, é uma temática comum nos filmes da época, como “De Volta Para o Futuro” (1985) e “Peggy Sue – Seu Passado a Espera” (1986).

A caracterização de He-Man por Dolph Lundgren é próxima da perfeição na atitude, na aparência e até na voz – algo raro naquela época, quando os diretores pouco se preocupavam em retratar fielmente os heróis. Frank Langella dá ao Esqueleto um tom meio shakespeareano, retratando-o como um símbolo da ambição. As cenas de batalha parecem limitadas frente aos recursos técnicos de hoje, mas na época não faziam feio. O filme tem ainda um tom geral de humor, no mesmo espírito do desenho.

Apesar dos méritos, “Mestres do Universo” é um filme datado pela evolução do próprio gênero. Os filmes épicos são antigos em Hollywood – basta lembrar de “Ben-Hur” (1959) -, mas épicos que mesclam a magia com a ação e a ficção científica começaram com “Star Wars” (1977) e proliferaram nos anos 80 (“Highlander”, “Labirinto”). A partir da década de 90, continuaram sendo produzidos e são feitos até hoje, mas sempre em novas bases – como o recente “A lenda de Beowulf” (2007) e a série Harry Potter.

O gênero evoluiu ao longo das décadas, apresentando cada vez mais incríveis efeitos especiais, referências culturais diversas – muitas vezes eruditas – e perdendo muito da temática ingênua dos anos 80. Comparado com a evolução do gênero, “Mestres do U niverso” só tem de mágico a nostalgia dos que cresceram com os desenhos de He-Man.

Douglas Lobo
@faq.php

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