Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 11 de agosto de 2007

Duro de Matar 4.0

Após 12 anos, Bruce Willis volta a encarnar John McClane: o policial durão e azarado que sempre está no lugar errado, na hora errada. O novo filme pouco lembra os demais da franquia, apelando demasiadamente para cenas de ação que fogem dos padrões da realidade, e um clima constante de adrenalina. Mesmo assim, uma grande diversão para os fãs do estilo.

No ano de 1988, o filme “Duro de Matar” fez uma verdadeira revolução no gênero ação, apresentando explosões, destruição do começo ao fim, porém, com um herói completamente humano e enraizado no mundo real. Assim ficou marcado John McClane, personagem de Bruce Willis: um homem capaz de tudo, porém, com todos os sentimentos de fraqueza de qualquer ser humano. Cabeça de uma trilogia de sucesso, McClane estava sumido há nada menos que 12 anos. Nesse meio termo, muitas foram as tentativas de levá-lo às telas, mas muitos impasses envolvendo Willis (que não se interessava de modo algum em voltar a encarná-lo), roteiristas, e diretor. John McTiernan, responsável pela direção dos três filmes anteriores da franquia, pulou fora do barco, passando o comando ao ainda não muito confiável Len Wiseman. Mudou o diretor, e também a essência da franquia. McClane não é mais o mesmo…ele agora está mais velho, evoluído, mais poderoso, e mais artificial. Não é uma boa notícia para quem cresceu delirando com suas peripécias.

Os Estados Unidos sofrem um novo ataque terrorista, desta vez através da informática. Um hacker (Justin Long) consegue invadir a infra-estrutura computadorizada que controla as comunicações, transporte e energia do país, ameaçando causar um gigantesco blecaute. O autor do ataque planejou todos os passos envolvidos, mas não contava que John McClane (Bruce Willis), um policial da velha guarda, fosse chamado para confrontá-lo.

O grande problema é que transformaram McClane em um personagem completamente irreal, um daqueles 'exército de um homem só' capaz de destruir um tanque de guerra com um espirro. Até seu visual novo de cabeça raspada lhe deu um certo ar de superioridade, descaracterizando aquela imagem do ser humano comum e calvo dos filmes anteriores. Antes, apesar de ser um grande policial, ele tinha medo, se feria…agora ele não perde por um segundo sequer a cara de durão e no máximo sofre uns arranhões. Vejam o momento em que ele, absurdamente derruba um helicóptero jogando um carro nele e o personagem de Justin Long se mostra espantado, enquanto ele apenas responde “eu estava sem balas”. E pior: na primeira cena de ação, quando Long pergunta no carro pra ele, se ele por acaso sentiu medo, e ele responde “sim”, mantendo o constante ar de superioridade. Definitivamente, esse não é mais aquele resmungão dos filmes anteriores, para a decepção dos fãs.

Seria errôneo uma pessoa ir assistir a esse tipo de filme esperando algo mais do que ação desenfreada, que é o que acontece. Assim foram todos os filmes da ação, mas o problema é que nesse se nota uma maior superficialidade. Talvez por causa de Len Wiseman, que parece estar seguindo fielmente os passos do diretor Michael Bay ao querer deixar o espectador tonto com tantas imagens explosivas em curtíssimos intervalos de segundo, criando uma verdadeira confusão visual, enquanto a história é deixada para último plano. O roteiro de Mark Bomback (“O Enviado”) e Doug Richardson (que trabalhou com Willis em “Refém”) até que tem uma premissa interessante ao abordar uma gangue de hackers, visto que McClane desde o primeiro filme se mostra um tanto “atrasado” em relação a novas tecnologias, e isso poderia criar ganchos para muitos embates interessantes. Isso, é claro, abrindo a possibilidade de o personagem utilizar seu famoso humor irônico contra seus inimigos, característica que ele mantém firme e forte, muito bem utilizada neste.

Como diz o vilão Greg em um certo momento, McClane é “um relógio de pêndulo em uma era digital”. Muito se espera dessas diferenças de conhecimento, mas a história acaba por cair no lugar comum, se perdendo em situações completamente irreais. A dificuldade de relacionamento do policial com sua filha mostrada no início é simplesmente enterrada pelo roteiro durante o filme, e ainda cai no clichê extremo da situação em que o vilão utiliza a filha para chantagear o herói, originando o clímax explosivo. E convenhamos, para que a inclusão de capangas acrobatas, que se movimentam quase igual ao Homem-Aranha? Ainda é mais difícil engolir tamanha facilidade com que o herói os derrota, mesmo estando velho e, muitas vezes, sem artifícios em mãos. Ah, será que ninguém morre caindo de uma certa altura? Porque em muitas ocasiões, incluindo um vilão cair de um helicóptero e o herói de um certo andar de um prédio, eles despencam, mas se levantam facilmente como se nada tivesse acontecido.

Algumas passagens realmente foram bem aproveitadas, como o momento em que o vilão Greg, vivido por Timothy Olyphant, altera através de computador uma sinalização de um cruzamento, causando uma verdadeira destruição. Passagem muito empolgante! E é bom deixar claro: quem espera um filme explosivo do começo ao fim, com pouquíssimos diálogos e cenas que fogem completamente os padrões da realidade, “Duro de Matar 4.0” é o filme certo. Esqueçam os filmes anteriores em que a ação, por mais grandiosa que fosse, como o salvamento de um avião no segundo filme, pareciam reais.

Agora, temos um dos filmes mais mentirosos de todos os tempos, competindo em nível de igualdade com “Missão Impossível 2”, “True Lies” e outros do naipe. Não necessariamente isso é ruim, pois muitas cenas de ação são realmente de tirar o fôlego, como a da pick-up que cai no túnel do elevador. Por outro lado, há aquelas que é impossível dizer “calma aí, já estão exagerando muito”, como a que ele passa por um hidrante jogando água para cima e derrubando um helicóptero e o eletrizante clímax, mostrando uma perseguição de McClane a bordo de um caminhão contra um…jato F-15. Absurdo? Muito, não parece mais um filme da franquia “Duro de Matar”, porém, ainda é muito divertido para o que curtem ver tais peripécias.

“Duro de Matar 4.0” pode causar uma certa decepção naqueles que curtem a ação desenfreada enraizada no cotidiano, como nos filmes anteriores. Muita coisa foi distorcida e a ação ganhou um nível de grandiosidade sem igual, com passagens mais do que absurdas. Mesmo assim, certamente irá divertir os que procuram apenas por muita adrenalina. Um novo filme sempre será bem vindo, pois Bruce Willis vem mostrando que ainda está em forma. Mas, por favor, tragam de volta John McTiernam, pois diretor de "Anjos da Noite – Underworld" é apelação extrema!

Thiago Sampaio
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