Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 26 de julho de 2007

Ex-namorado da Minha Mulher, O

Mais uma comédia romântica? Sim e não. Seguindo a estruturação básica do gênero, “O Ex-Namorado da Minha Mulher” tem a seu favor um roteiro que funciona, uma ótima química entre o casal de protagonistas e uma leva de situações engraçadas para arrancar divertidas risadas do público.

Tom Reilly (Zach Braff) e Sofia Kowalski (Amanda Peet) estão à espera do primeiro filho. Ela pretende largar a carreira de advogada para se tornar mãe em tempo integral. Ele precisa conquistar uma promoção no restaurante em que trabalha para aumentar a renda e garantir a sobrevivência da família. Em uma Nova Iorque com custos de vida altíssimos, a missão parece impossível. Para piorar a situação, Tom vai encontrar um pequeno problema que o acompanhou durante todos os empregos por quais passou: sua incrível capacidade de atrair confusão.

Após perder a promoção e o cargo que ocupava, decide aceitar a oferta de trabalho do sogro em Ohio, onde Sofia passou a infância e a juventude. Contratado como assistente de criação de uma agência de publicidade, ele descobre que o responsável pelo seu treinamento na empresa é na verdade um amigo e ex-namorado da esposa. Chip Sanders (Jason Bateman) é um pentelho que vai fazer de tudo para deixá-lo mal perante a mulher, os sogros e o pessoal no trabalho. A partir daí, o desenrolar da história segue os padrões de toda comédia romântica com um ex-namorado que atrapalha o relacionamento da ex, sem que essa desconfie de suas más intenções (acho que já vi isso em algum lugar), uma sogra esforçada para parecer agradável e um sogro que considera o genro um fracasso (provavelmente já vi isso em algum lugar) e a já esperada quebra de confiança antes do final feliz (definitivamente já vi isso em algum lugar).

O fato de beber do velho e conhecido clichê não impediu que “O Ex-Namorado da Minha Mulher” alcançasse algumas distinções em relação a fitas similares. A começar pelo início do filme. A dupla de roteiristas David Guion e Michael Handelman em seu primeiro trabalho optou por apresentar os personagens já em crise no seu relacionamento, evitando a fase inicial onde tudo são flores. Grana curta, falta de sexo e mal-humor são apenas alguns dos problemas enfrentados pelo casal. Esse artifício não é nenhuma novidade. “Separados Pelo Casamento” decide trazer o lado bom da relação a dois nos créditos de abertura quando uma montagem com fotos substitui as cenas desnecessárias. Mesmo assim, representa uma escolha acertada.

Outro fator determinante por dar à velha fórmula um rótulo novo e tornar o resultado final mais agradável é a forma que a história como um todo é tratada. A continuidade existe, mas muitas cenas ali funcionariam muito bem sozinhas. O filme, mais do que uma comédia romântica, é uma comédia de relacionamentos em que cada cena poderia ser tomada como uma esquete, independente uma da outra e, ao mesmo tempo, juntas fazendo um retrato da situação vivida pelo casal central. Trocas de fraldas, dificuldades de relacionamento no trabalho, jantares em família e todo o tipo de ocasião que a rotina traz para as nossas vidas.

No elenco, além dos ótimos coadjuvantes (aqui, me refiro àqueles que fizeram pontas como os excêntricos colegas de escritório de Tom e o pequeno vizinho capaz de engolir um sanduíche inteiro), o trunfo é mesmo de Braff e Peet. Ele com o já reconhecido e comprovado talento para o gênero e ela mostrando-se mais versátil a cada trabalho. E se os dois sozinhos já arrancam risadas da platéia, juntos eles conseguiram uma química de dar inveja à Hugh Grant e Drew Barrymore em “Letra e Música”, por exemplo. Os dois conseguem passar facilmente a idéia de que formariam um casal na vida real. Já a trilha sonora de Ed Shearmur lembra o trabalho de Xandy Janko e Chris Wilson em “Casamento Grego”, acompanhando cada cena e garantindo maior leveza e humor às situações.

É realmente uma pena que, próximo ao final da projeção, o longa acabe caindo na cilada de resolver tudo em questão de minutos. Da separação do casal ao reenlace (não constitui spoiler, já que a situação é típica em produções como essa), tudo acontece muito rápido. O desfecho só não é mais desacreditado graças ao talento da dupla principal que segura o vexame. Com Peet e Braff em cena, é até plausível acreditar que ela nunca tenha deixado de confiar no marido.

“O Ex-Namorado da Minha Mulher” pode ser tachado como mais uma comédia romântica dessas que aparecem todos os anos, mas quem nunca foi ao cinema contando somente com boas risadas e entretenimento gratuito que atire a primeira pedra.

Um adendo: o filme pode agradar àqueles que estudam propaganda pela forma como desvenda algumas crenças e artimanhas da publicidade. Reparem no reclame comercial gravado em uma das últimas cenas e percebam como a idéia funcionaria bem no mundo real. Se um dia Guion e Handelman desistirem da carreira cinematográfica, eles já podem se aventurar no mundo da criação publicitária.

Igor Vieira
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