O tão esperado fim da trilogia “Piratas do Caribe” chega com toda força e fecha a franquia com sucesso. Mesmo considerando que os fãs possam ter muita expectativa por um filme perfeito, “No Fim do Mundo” não deixa a desejar nos aspectos técnicos e traz uma história que se resolve em quase três horas de projeção. É preciso muita disposição e atenção para não se perder nos detalhes.
Começando exatamente onde terminou “O Baú da Morte”, o terceiro filme mostra a ambição do Lorde Cutler Beckett (Tom Hollander) ao assumir o comando do Holandês Voador para vagar pelos mares buscando a extinção dos piratas. Para tentar impedir tal fato, os protagonistas Elizabeth Swann (Keira Knightley) e Will Turner (Orlando Bloom), juntamente com o Capitão Barbossa (Geoffrey Rush), precisam reunir os Nove Lordes da Corte da Irmandade para tentar acabar com o objetivo de Beckett. Tendo que viajar até o fim do mundo para encontrar o exótico Jack Sparrow (Johnny Depp), um dos lordes, os heróis rumam para uma aventura perigosa em Cingapura para conseguir os mapas com pirata chinês Sao Feng (Chow Yun-Fat).
O final da jornada de Sparrow e seus companheiros chega aos cinemas um ano após o filme anterior. Tendo sido rodado juntamente com o “O Baú da Morte”, a nova aventura mantém o ritmo da história e envolve os fãs em um misto de muita ação, risadas, sem apelar para o melodrama convencional que o fim da história poderia explorar. O grande acerto de “No Fim do Mundo” esteve em reunir todos os elementos básicos que precisavam ser solucionados e fazer com que isso surgisse no decorrer da trama, sem pender para o lado do tédio, mesmo com seus 165 minutos de projeção. Isto, claro, quando o espectador consegue se ater ao desenrolar da trama e seguir o clímax que vai se instaurando, já que é preciso bastante disposição para acompanhar o abuso de informações que é proporcionado. Este também foi o diferencial para o segundo filme, que abusou em tempo perdido e não conseguiu se justificar inteiramente, causando tédio; o que em partes é compreensível visto que “O Baú da Morte” foi apenas um link entre as histórias principais, porém não se justifica por completo. Em “No Fim do Mundo”, o roteiro de Ted Elliot e Terry Rossio sustentam a lógica cronológica da trama e não exagera nas diferentes nuances que adota.
Elliot e Rossio conseguem consolidar com responsabilidade uma história que, inicialmente, não esperava conquistar tanto sucesso. É tanto que entre o primeiro e o segundo longa, foram necessários três anos para que Sparrow voltasse à tona e consolidasse seus fãs. “Piratas do Caribe” não é o tipo de franquia que se pode gostar parcialmente ou ser indiferente. Particularmente, considero que seja uma das melhores narrativas já feitas em anos, apesar de não ser fanático por ela. Além de responder bem como história, é inegável que a responsabilidade técnica é quase cem por cento para engrandecer o longa. De uma competência ímpar, jamais vista em blockbusters como “Homem Aranha” e até o próprio “Harry Potter”, os efeitos visuais de “Piratas do Caribe” justificam qualquer falha secundária. No terceiro filme, “Piratas” consegue ser bem mais detalhista ao trabalhar os efeitos, com uma reprodução perfeita e realista de um cenário que só a Disney conseguiria construir. Desde os efeitos de campo, até a maquiagem bem elaborada, o longa não deixa a desejar em sequer um momento, fazendo-o diferenciar das franquias ditas anteriormente. Como se não bastasse, a direção de arte consegue dar um upgrade na produção, colaborada com a fotografia que investe nas tonalidades nos momentos certos, sejam em planos abertos e luminosos até ambientes mais obscuros, temos reproduções perfeitas do que é quase palpável. Isso se justifica em diversos momentos, como quando um navio vaga pelos mares a noite e o reflexo das estrelas invade o mar.
Outro ponto que não posso deixar de tocar foi o realismo investido ao reproduzir os momentos aquáticos onde a computação gráfica se fez necessária. Um dos maiores desafios do cinema em quesito efeito especial é reproduzir com detalhe o movimento da água, fazendo com que não ganhe um aspecto artificial. “Poseidon” já havia conseguido um maior sucesso nisso e “Piratas 3” desbanca qualquer outro filme, até mesmo os dois anteriores da franquia. Momentos como os navios surgindo de dentro do mar e até na luta final são as provas de que o protocolo em atingir a perfeição está começando a ser quebrado. Mesmo assim, ter um filme cheio de bons efeitos precisa vir acompanhado de um sistema de som que se alinhe ao enredo e nisso “Piratas” sempre foi líder. Além dos ruídos bem reproduzidos, a trilha sonora continua fazendo um trabalho sem igual para dar um bom acompanhamento aos fatos e eletrizar os espectadores que não têm motivos para dormir no ponto, principalmente durante a última hora de filme, na qual tudo vai se encontrando e consolidando um final que faz jus ao que foi proposto inicialmente.
A direção de Gore Verbinski ganhou uma maior vitalidade e liberdade ao registrar os planos. Sem fazer de sua câmera um maquinário inútil, o diretor ousa em construir planos intensos e usa técnicas inteligentes de registros não só de emoções, mas também de momentos regulares que talvez não tivessem obtido tanta notoriedade se outro cineasta assumisse o cargo. Verbinski tem uma familiaridade com o roteiro e não se poupou em pensar detalhadamente como faria para registrar cada simples plano. Este caráter intimista é uma característica que pode fazer com que seu espaço na indústria cinematográfica ganhe uma projeção bem maior do que já tem. E não é somente durante a trilogia que isso fica claro, mas também ao assistir “O Sol de Cada Manhã” e suas reflexões sobre os momentos intensos vividos pelos seres humanos. Em “Piratas”, o mais importante que conseguiu foi dar a vitalidade que o tema precisava para ganhar a simpatia do público, já que por serem personagens comuns vistos em filmes anteriores, talvez não fossem tão convincentes como os da franquia “O Senhor dos Anéis”, apesar de que a particularidade de ambos os universos mágicos consigam dar margem ao distanciamento de um realismo apurado.
Em relação ao elenco, o destaque continua sendo de Johnny Depp, construindo um Jack Sparrow mais descompromissado com sua função social na trama e dando ótimos momentos de comédia. Essa característica veio sendo trabalhada desde o filme anterior, quando Depp conseguiu se familiarizar mais com Sparrow e construir um marco no cinema. Para o terceiro filme, o ator ganhou um roteiro com mais espaço para suas trapalhadas e trejeitos, dando espaço até a esquetes básicas que não fogem do teor geral do filme. A parceria com Geoffrey Rush também rendeu bons momentos e deu um caráter menos metódico do mundo dos piratas. Até porque em nenhum momento a franquia deixa claro que precisa fazer registros histórico sobre os personagens; muito pelo contrário. Tudo que poderia vir de ensinamento histórico sobre os piratas vem camuflado em diálogos que adquirem caráter interior à trama, sem cair na generalidade. Orlando Bloom e Keira Knightley também estão mais a vontade em seus papéis, pois ganham uma maior importância na franquia, virando verdadeiros piratas. Neste ponto, o carisma de Knightley é alcançado justamente por retratar o tão pouco conhecido mundo das piratas mulheres e o de Bloom por assumir um posto memorável na história. A participação de Keith Richards, guitarrista dos Rolling Stones, vem só acrescentar ao filme e a harmonia com Depp é impagável, por mais que seja breve.
Acertando em tantos aspectos, seria hipocrisia reclamar que a franquia não foi finalizada com sucesso. “Piratas” tem uma magia de atingir um público diversificado que dá crédito ao que está sendo exposto, e não seria diferente com “No Fim do Mundo”. É óbvio que muitos fãs possam ir com muita sede ao pote e se decepcionar com a chuva de informações e a longa duração, porém acredito que tem tudo para ser bem aceito entre os que conhecem a franquia. Tanto se falou se este seria mesmo o último filme, mas fica claro um gancho para próximas aventuras de Sparrow. O que não se sabe é se será dentro de “Piratas do Caribe” ou em um filme só dele. De qualquer forma, seria mais uma boa investida cinematográfica. Mais do que um filme competente, um exemplo de como traçar uma história que sabe caminhar por linhas retas e construir uma trama memorável. E aos que ainda conseguirem ficar na sala após o “the end”, poderá ver uma cena fraterna e particularmente bela após os créditos.