Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 19 de julho de 2007

Mistérios de Laura Cross, Os

Os filmes policiais já não são mesmos. Por mais que tentem inovar, a super-lotação de idéias não funciona mais e está muito difícil conseguir surpreender o público ou trazer situações que não caiam no lugar comum. Em “Os Mistérios de Laura Cross” podemos ver mais um exemplo da preguiça de criar uma história realmente interessante, visto que o seu título cria toda uma atmosfera de mistério, mas que não condiz com o conteúdo da trama. Malditas traduções!

O roteiro escrito por D. Alvelo e Leland Zaitz conta a história de Max Garrett (Stephen Baldwin), um policial com problemas matrimoniais que se envolve com a investigação da morte de um homem que caiu de um edifício após ser enforcado com um arame. Ao iniciar as averiguações de praxe, Garrett conhece Laura Cross (Kristy Swanson), uma bela fotógrafa que talvez esteja ligada ao crime. Incubido por Eddie Fulton (Charles Malik Whitfield) a protegê-la, Garrett acaba se envolvendo um jogo de sedução e se apaixona por Laura. O que ele não esperava é que isso pudesse causar problemas em seu trabalho investigativo, sem saber em quem confiar ou de quem desconfiar.

A trama é básica. Um crime inusitado, um suposto assassino, vítimas, um romance, sexo, descobertas e reviravoltas. Todos esses elementos já foram trabalhados antes e estão cada vez mais com a tendência de se submeterem a novos paradigmas, mas nem sempre funcionando como devia. A criatividade dos roteiristas até movimentam um certo ar de inovação, visto que a situação inicial do crime é, ao mesmo tempo, ousada e um tanto quanto piegas. De qualquer forma, o andamento do enredo vai demonstrando uma incapacidade de construir uma narrativa que se sustente durante os quase noventa minutos de projeção. Alvelo e Zaitz erram juntos ao trabalhar o mistério de seus personagens. Se a intenção era fazer de todos eles um suspeito, que eles pudessem ter uma abertura maior para dar motivos ao espectador a acreditar que um mistério realmente pode estar sendo guardado. O que acontece é que as idéias precipitadas de mastigar demais a história e seguir uma linha cheia de peças pregadas artificialmente para dar sentido à trama, acabam sendo vítima de sua própria armadilha e diversos questionamentos começam a serem feitos por quem consegue ter uma apuração maior acerca dos fatos que acontecem. Mesmo assim, o que percebemos é que o mal uso de uma profundidade maior de seus personagens se mescla com a falta de imaginação no desenrolar da trama e acaba levando o filme a cair no esquecimento e ser considerado dispensável.

Com todos os problemas de roteiro, a direção ainda consegue ser bem mais desagradável em quase toda a projeção. O amadorismo do olhar de Valerie Landsburg ao registrar o longa não consegue ambientar, nem que fosse minimamente, um clima de filmes policiais investigativos. Para piorar, os movimentos de câmera são tão mal pensados que erros seqüenciais e de continuidade aparecem a cada minuto, o que vai deixando o filme cada vez mais sem credibilidade. Até existem tentativas de dar um upgrade na trama e causar cenas boas, como a angustiante cena da banheira nos minutos finais, mas Landsburg não consegue sair dos registros caricatos e perde tempo tentando fazer o que qualquer diretor faria ao invés de pensar bem no desenvolvimento dos planos. Outro fato é que Landsburg não dispôs de uma equipe técnica tão ruim assim para poder pisar na bola. É verdade que a direção de arte não é das melhores, mas não chega a ser insignificante. O mesmo acontece com a direção de fotografia, os recursos sonoros e com o elenco. Mesmo sem atuações fenomenais, percebemos o desconforto dos atores ao dar vida a seus personagens. Eles parecem meros objetos a serem guiados em uma história sem firmeza e, certamente, a satisfação de ter feito um bom trabalho não deve ter aparecido após o fim das filmagens.

Stephen Baldwin é um ator um tanto quanto eclético e com uma presença cênica marcante. Ao viver Garrett, é impossível não perceber a sua irresponsabilidade de não conseguir variar nas várias nuances que seu personagem proporciona. As expressões e o tom da voz são sempre os mesmos, além de que a sua situação como marido insatisfeito acaba sendo o segundo do segundo plano, um mero detalhe encaixado somente para justificar seu envolvimento sexual com Laura Cross, o que no final acaba nem justificando por inteiro. Mesmo cheia de beleza e sensualidade, Kristy Swanson se vê limitada a criar uma atmosfera de femme fatale e acaba não demonstrando uma certa familiaridade com seu passado e presente postos no roteiro da trama. Ela talvez seja a personagem mais cheia de falhas, pois não consegue ser auto-explicativa ou ao menos convencer que haja todo um aparato de acontecimentos que tenham relevância para o desfecho da investigação. Charles Malik Whitfield é outro que possui uma boa presença cênica, mas fica limitado e não consegue uma identificação com o público capaz de dar sentido ao seu personagem. O ótimo Kevin Chamberlin acaba rendendo uma boa atuação, apesar de caricaturar sua obsessão, sendo atrapalhado, mais uma vez, pela vastidão do roteiro. Natassia Fuller e Julian Acosta só emprestam suas belezas em personagens dispensáveis e que participam de cenas totalmente alheias ao enredo principal.

Sofrendo com a falta de compromisso do roteiro e da direção, obviamente “Os Mistérios de Laura Cross” não consegue se estabelecer como uma produção razoável. Tendo alguns raros momentos interessantes, perde o fio da meada e não consegue engatar uma história convincente. Os erros do longa lembraram-me rapidamente a decepção de “A Marca”, que também não dispõe do mínimo de originalidade e corpo técnico para a realização do projeto, a não ser alguns recursos secundários. Além de um título totalmente comercial que não condiz com o grande parte da trama, o longa não é dos piores e pode até servir como entretenimento gratuito de filmes “B”, mas para os mais exigentes é melhor passar longe e escolher outro filme da prateleira oposta.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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