Com o dedo inegável de Steven Spielberg na produção, "A Conquista da Honra" chega aos cinemas mais como um filme de drama do que como um filme de guerra. Assumindo uma narrativa já antes vista em "Iluminados Pelo Fogo", o longa-metragem consegue manter sua linha e por isso ganha méritos, embora não consiga se aprofundar realmente na história.
Quando se acha que já foi dito tudo o que se existe sobre a Segunda Guerra Mundial, Hollywood consegue achar alguma vertente ainda não contada, escondida no passado da cultura americana, que por muitas vezes acaba criando personagens ou heróis inexistentes, como em qualquer história de outros países.
O envolvimento dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial veio a partir do ataque dos japoneses, que despertou a fúria do exército em um contra-ataque massivo. Pearl Harbor, Hiroshima, Nagasaki, todas cicatrizes de uma guerra irracional. O que alguns não sabiam era que os Estados Unidos sempre se utilizou do espetáculo para conseguir dinheiro e com a segunda guerra não foi diferente. Em uma campanha através do Pacífico para que os estadunidenses chegassem aos japoneses, várias batalhas foram travadas. Dentre as batalhas mais lembradas, a da ilha de Iwo Jima é a que mais chamou a atenção na história do povo americano. Não por seus números impressionantes ou mesmo por ser uma disputa de território próximo ao Japão (ilha que poderia servir de base à frota marinha americana durante a guerra), ou mesmo pela vitória dos Estados Unidos pela posse da ilha. Esta batalha em especial é lembrada por uma imagem. Uma que se tornou iconográfica e símbolo de uma vitória que ainda não existia. E também por se tornar o símbolo principal para conseguir fundos monetários para permanecerem com uma guerra que o país foi pegue de surpresa.
Os Estados Unidos não tinham o dinheiro. Estavam entrando em uma guerra e gastando fundos que não possuíam e sabiam que não teriam como repor. A batalha de Iwo Jima levou 110 mil homens à ilha, para lutar contra 22 mil japoneses. Resultado final foi de 20 mil e 703 japoneses mortos, enquanto no lado estadunidense foram 4 mil e 197 mortos, 19 mil e 189 feridos, 494 desaparecidos, que até hoje não foram encontrados. Nessa batalha pela conquista da ilha vulcânica, a intenção dos americanos era conseguir conquistar o ponto mais alto da ilha, o monte Suribachi. Depois de alguns dias de batalhas, um primeiro esquadrão de reconhecimento foi enviado ao topo do monte. Lá no topo, após enfrentar alguns japoneses, eles fincaram a bandeira dos Estados Unidos. A notícia, que se espalhou logo, tornou-se uma disputa política para ver quem ficaria com a primeira bandeira, um pequeno símbolo das primeiras vitórias americanas. Devido a isso, um segundo esquadrão foi enviado ao topo do monte para que substituísse a primeira bandeira por outra. A troca dessa bandeira foi feita por seis homens, já que era um mastro pesado. Entre eles estavam: Ira Hayes, Franklin Sousley, John Bradley, Harlon Block, Michael Strank e René Gagnon. Durante a troca das bandeiras, Joe Rosenthal tirou a foto que se tornaria o ícone do sonho americano, aquele que provaria que, nesta batalha, os Estados Unidos poderiam sair ganhando.
Logo a imprensa divulgou a foto em diversos jornais. Joe Rosentahl ganhou o prêmio pulitzer de 1945 em fotografia. E os seis homens se tornaram heróis da noite para o dia. Mas que na realidade não chegavam a ser. Dos seis, apenas três sobreviveram à batalha e foram trazidos a um Estados Unidos falido e desesperado por dinheiro para sustentar a máquina bélica. Seguindo em turnê pelo país, os três jovens, que eram clamados aos quatro ventos como heróis de uma nação guerreira, começam a sofrer com suas consciências, já que, para eles, os verdadeiros heróis permaneceram na ilha, em uma guerra que durou ainda 35 dias (meses de fevereiro e março de 1945).
E é justamente este clima que o livro de James Bradley (filho de John Bradley, um dos supostos heróis) e Ron Powers traz. O livro homônimo na língua inglesa ("Flags of our Fathers") foi lançado em 2000 e permaneceu durante 46 semanas na lista dos mais vendidos do jornal New York Times, sendo dessas, seis semanas como primeiro colocado. Com os direitos comprados por Steven Spielberg, o filme chega aos cinemas do Brasil com a direção de Clint Eastwood. A idéia do filme se assemelhou um tanto ao estilo de narrativa de "Iluminados pelo Fogo", um excelente filme argentino, que infelizmente ainda não possui distribuição no Brasil. A narrativa segue com inúmeros flashbacks, que não são complicados de se perceber a cronologia do longa.
O filme traz uma boa direção, embora não tenha nada muito extraordinário que merecesse uma indicação ao Globo de Ouro a Clint Eastwood. Nada vai além do que já foi feito em questão do cinema de guerra, e nos momentos dramáticos, nada vai além do que já foi feito em todos os filmes de drama, mantendo apenas uma postura correta por parte do diretor. Talvez um dos poucos problemas com a direção de Eastwood neste projeto (embora ainda assim crassos), seja a impessoalidade dos seus personagens. O filme não permite uma conexão direta entre o espectador e os personagens, o que acaba distanciando também em seus dramas pessoais e perca um pouco do impacto de alguns detalhes durante a história. Também falha nas cenas de batalha ao não permitir, ou ao menos dificultar, a identificação dos personagens em movimentos durante a luta, o que leva o espectador a ficar confuso em certos momentos e nem mesmo conseguir conectar os nomes dos personagens com o ator que o interpreta, por isso não ache estranho caso você ainda saia do cinema tentando saber quem interpretou fulano ou sicrano.
A fotografia de Tom Stern, colaborador de Eastwood nos últimos dois filmes do diretor ("Sobre Meninos e Lobos" e "Menina de Ouro"), também não vai muito além do já visto em outros filmes e seriados, com um estilo mais azulado e frio e nada traz de novo, pelo contrário, se torna comum, porém ainda assim serve ao seu propósito.
O elenco traz nomes conhecidos do público brasileiro, mas muitos aparecem apenas para pequenas participações como Paul Walker, Robert Patrick (o eterno T-1000 de "O Exterminador do Futuro 2"), Jamie Bell (o pequeno Billy Elliot). No elenco principal do filme, Ryan Phillippe, Jesse Bradford e Adam Beach. Não há atuações que possa dizer que ultrapassem as expectativas. Mas nenhum chega a decepcionar, fazendo o seu trabalho de forma correta. Também, o roteiro adaptado do livro homônimo não permite nenhum aprofundamento psicológico, mesmo com alguns personagens densos que poderiam valer a criação de um filme à parte com uma história centrada nesses papéis.
A trilha sonora infelizmente não chega a ser um fator surpreendente. Na verdade, fico agora comigo tentando lembrar alguma música do filme, e não me vem a cabeça nenhuma. Aliás, esta é marca de Clin Eastwood, que vem compondo as suas próprias trilhas sonoras em seus últimos trabalhos. Não que a trilha sonora seja ruim, já que se fosse, com certeza estaria gravada na minha memória, mas ela também não chega a ser elemento que complementa a cena ou marca o espectador.
No frigir dos ovos, "A Conquista da Honra" fala na verdade de um povo em busca de um mito. Fala sobre motivações. Ninguém chega a algum lugar sem uma motivação, sem algo que impulsione a sua força de vontade para atingir aquela meta, aquele objetivo. E muitas vezes a criação desse símbolo, ou ícone, para um povo, ou uma cultura, pode ser uma farsa, mas fica a questão em valores e princípios: será que é válida a criação de um falso-ícone para se conquistar uma meta? Afinal, a verdade sempre é dos vencedores, não daqueles que perdem.