Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 10 de setembro de 2006

Minha Super Ex-Namorada

Com um roteiro que renderia uma ótima história, "Minha Super Ex-Namorada" acaba agradando em duas situações: se você estiver com um ótimo senso de humor ou se você se contenta com uma comédia light e sem compromisso.

O filme conta a história de Matt (Luke Wilson), um jovem arquiteto que não tem muito sucesso em relacionamentos que acaba conhecendo a atraente Jenny Johnson (Uma Thurman) no metrô e conseguindo um encontro com a moça. Aparentemente normal, o que Matt não imaginava é que Jenny é nada menos do que G-Girl, uma super heroína responsável por proteger a cidade onde vive, combatendo a violência e a criminalidade. Quando descobre a verdade, Matt percebe que estava apaixonado por uma colega de trabalho e decide terminar o relacionamento com Jenny, que passa a querer se vingar do rapaz e inferniza seus dias usando seus super poderes.

Partindo de uma situação basicamente interessante, "Minha Super Ex-Namorada" teria tudo para ser uma boa comédia, mas não passa de mero entretenimento. Quando se constrói um filme neste gênero, a primeira preocupação é de fazer rir e, para isso, deve-se trabalhar bem as piadas e ocasiões para que não caiam nos clichês e, se acabar caindo, mesmo assim ocasionar muito riso. Essa preocupação deve ser maior, pois a arte de usar o humor nem sempre atinge as pessoas do mesmo jeito. O roteiro de Don Payne parece que não teve a menor delicadeza para trabalhar, de uma forma geral, as possibilidades de tiradas de comédia e inclusive o uso do bom humor negro para elevar a qualidade da produção, atrapalhando no desenvolvimento do enredo. Não vou chegar a mentir e dizer que eu não ri ou que quase ri, pois eu ri mesmo. Talvez porque eu estivesse assistindo com uma boa companhia e com grande despreocupação, o filme chegou a mim como uma forma positiva, sabendo criar momentos interessantes, mas a falta de abordagem não tornou os momentos em impagáveis. Payne não consegue, mesmo tendo despertado alguns risinhos em mim, ter a competência de investir no que sua própria idéia poderia desenvolver, deixando tudo muito superficial e que não atingiria positivamente a audiência em geral.

Sem falar nas suas falhas seqüenciais, que são refletidas principalmente na direção mecânica de Ivan Reitman, que acaba ficando restrito nas opções que o roteiro oferece. Reitman soube muito bem tornar seus personagens versáteis e carismáticos, sabendo trabalhar a essência dos relacionamentos de uma forma imaginária, mas que, de certa forma, reflete na realidade, mostrando o machismo dos personagens, principalmente de Vaughn (Rainn Wilson), escrachando a visão que tem de relações amorosas, mostrando a facilidade com que os amigos podem interferir em um namoro e fazendo das mulheres submissas e fáceis de serem enganadas pelos homens. Até aí a abordagem foi bem sucedida, mas só até aí. As cenas que o roteiro de Payne trazia não conseguem estender essa boa linha que estava seguindo e transforma em estereótipos as seqüências finais do filme. Contrapondo esta linha, Reitman faz bom uso dos poderes de G-Girl, apesar de errar em alguns detalhes que passam despercebidos pelos olhos da maioria, mas que não podem ser perdoados, como o escracho do volume de seus movimentos e a montagem dos efeitos visuais dentro do cenário acaba imobilizando os elementos do cenário e mostram-se amadores e pouco convincentes.

Uma Thurman tem um bom timing para o humor. Claro que não é das melhores, mas depois de vê-la como uma anti-heroína (ou seria heroína?) em Kill Bill, ela mostra-se competente em transformar Jenny em uma garota simpática, atrapalhada e um pouco maluca, sabendo medir a intensidade da comédia e fazendo impostações de voz, diferente do filme de Tarantino. O que os dois personagens têm em comum? Uma atriz que consegue fazer personagens tipicamente semelhantes, mas que se encaixam em gêneros diferentes e em nada se confundem. Thurman soube administrar inclusive a mudança de Jenny para G-Girl, apesar de basear-se nos grandes clássicos de super heróis, como usar um óculos ou um penteado diferente para se "camuflar", mas deixando o público ciente da vida dupla. Luke Wilson constrói Matt a partir do típico fracassado em romances que, inibido pelas decepções, tem suas vontades, mas sabe medi-las. Wilson conseguiu inclusive fazer um bom canalha ao dispensar Jenny e confessar seu amor a Hannah (Ana Faris), apesar de que o roteiro não convença que entre ambos possa existir algum sentimento especial. Mesmo assim, Faris também faz uma boa interpretação. Ainda sendo apontada como "aquela atriz do Todo Mundo em Pânico", a afinidade com as piadas é visível, mas ainda acredito que ela possa ser usada em projetos mais complexos, quem sabe um drama ou um terror, e tirar seu nome somente por participar em comédias pastelões.

Sem muita técnica ao desenvolver uma boa comédia, "Minha Super Ex-Namorada" é um passatempo que pode agradar aos que vão ao cinema despreocupados e dispostos a sair da sessão com o mesmo nível intelectual que entrou. E isso é até bom, pois se o filme não é uma obra primorosa de comédia, pelo menos não brinca com nossa inteligência, sendo notável que, apesar da fantasia que é usada (afinal, coisas de super heróis nem sempre são tão acreditáveis), sabe mostrar sua irrealidade sem parecer tão fútil, o que não acontece com seu roteiro, basicamente amador que, talvez se tivesse sido reavaliado, poderia ter proporcionado ótimos momentos durante os noventa e cinco minutos do longa, ficando a vários pés atrás de outras boas (ou razoáveis) comédias que já passaram por nossas telonas. De qualquer forma, quem não tiver muita coisa para fazer e for pouco exigente, vale a pena conferir. Ao contrário disso, melhor escolher outro filme.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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