Fraco, porém aproveitável. O filme, aparte da sua exibição no cinema, é muito chamativo. Apresenta bons atores, bom cast de produção e a estréia de Maurício Farias (A Grande Família) como diretor. Infelizmente não é muito bem por aí, caros amigos.
O lendário lobisomem ataca em terras brasileiras. Quem é de interior sabe. Ô bicho das estórias temidas é esse. Eu passei a infância escutando bastante dessas e até hoje quando vou para minha cidade-natal no interior, andando nas ruas à noite, olho um pouco desconfiado para os lados. Não que seja com medo – pff! – é só curiosidade mesmo.
A crendice para com esse personagem é grande. O tal já participou de filmes, estrela em Hollywood, andou pelas ruas de Nova Iorque, roubou cenas em alguns quadrinhos e foi parar na fazenda (de direito) do coitado Coronel (por patente) Ponciano de Azeredo Furtado. Frouxo não, a criatura! Só não mente mais do que Chicó (personagem de "O Auto da Compadecida"), mas conta umas histórias meio distorcidas que é uma beleza.
Guel Arraes, era de se esperar mais por conta da presença desse nome na produção. Seus personagens muito “capuciosamente” trabalhados; roteiros ricos de humor; ironia e marcante essência nordestina, sempre arrancam diversos elogios da critica em geral. Então, você há de convir que depois de assistir “Lisbela e o Prisioneiro” e “O Auto da Compadecida” é aguardavel algo, no mínimo, primoroso. Mas, sua atual película caiu na façanha do contrário.
A idéia central do filme é a narrativa da história de vida de Ponciano de Azeredo (Diogo Vilela), por ele mesmo. Nela, tudo é apresentado: o roteiro, personagens e desenrolar dos fatos. Nesse desenrolar, sua luta é para manter a Fazenda Sobradinho, herança, no auge, rendendo-lhe lucros. Para isso conta com a ajuda de Pernambuco Nogueira (Selton Mello) em alguns momentos, diga-se de passagem. Por outro lado, a personagem interesseira de Ana Paula Arósio, como diria Ponciano, a docemente bela prima, Esmeraldina, apresenta seus planos ambiciosos que envolvem a afeição por ela da dupla de irmãos por criação, Ponciano e Nogueira.
A condução do filme pelo estreante diretor Maurício Farias, foi proporcional às pálpebras dos meus olhos sonolentos que prestavam atenção na telona do cinema. Errou demais a mão, deixando o filme alternar entre altos e baixos. Assim, ficou marcada uma precisão no amadurecimento do mesmo. Seu trabalho, se comparado, deixa a desejar, mas como não podemos estar sempre comparando, ele não é tão ruim assim. Como caso isolado, diríamos que é mediano. E deixemos essa conversa de que, em nível de filme brasileiro, sua direção está boa. A ascensão de muitos diretores brazucas no mundo cinematográfico está de vento em popa, trazendo consigo um aumento na pressão para com os novos diretores e a ambição dos expectadores também é crescida.
Um motivo que talvez tenha causando a monotonia citada em linhas anteriores, pode ter sido a forma como fora feito a narrativa do Ponciano. Não como desmérito do ator Diogo Vilela, mas por certos momentos, soou deveras cansativo e sem atrativo algum. Na narrativa, foi usada uma forma de flashbacks, entretanto, ao fim do filme, causa um pouco de confusão quanto a real intenção dos fatos.
Selton Mello: ator cativante, vozes memoráveis e belíssimos personagens. Dessa vez, o consagrado ator não atingiu níveis satisfatórios. É aquela coisa, expectativa, mas Selton poderia ter explorado muito melhor a índole do personagem. A voz, mais uma vez deslumbra, todavia, os trejeitos que poderiam causar muitas risadas ficaram por menos. Seu papel, comparado a “Lisbela e o Prisioneiro” e “O Auto da Compadecida”, acabou sendo bem menor. Não está em plano real de destaque.
O trabalho braçal acabou sobrando para Diogo Vilela. Como o Coronel da Fazendo Sobradinho, surpreendeu-me. Parece que perdeu um pouco o tremelique no pescoço, apresentando um personagem limpo e fiel ao roteiro. Ao contrário de Selton Mello, seu papel é bem mais explorado, lhe dando um bom plano de destaque. No restante do elenco, está desfilando uma boa parte da coqueluche brasileira quando se fala em atuação. Inclusive, o falecido Francisco Milani, rouba algumas cenas na pele do Doutor Serapião, ficando aqui uma saudade de seus gloriosos personagens, tanto da TV, quanto do cinema. Ana Paula Arósio não faz feio, mas também de bonito só ela em si, digamos que cumpre seu papel ali nas pontinhas dos dedos. Ao contrario de Lucio Mauro Filho, que, quando pouquíssimo aparece, agrada bastante. Ele vem até merecendo aparecer em uma película brasileira com plano melhor de destaque. Outros atores como Pedro Paulo Rangel, Tonico Pereira e Othon Bastos, completam o elenco de forma balanceada.
O momento mais esperado desde antes entrar na sala de cinema, era a respeito do “zum-zum-zum” sobre os efeitos especiais do tal lobisomem. No momento do clímax final, ele surge admirável e surpreendente. Sim, temos capacidade de alçar maiores vôos nesse sentido. Que, com essa amostra, essas alçadas sejam feitas. Para alguns parece besteira, pra mim, representa um chega de filminho brasileiro resumido a diálogos e roteiro. Uma pimenta dessas de vez em quando vem bem a calhar, nesse caso, salvou a projeção.
Muito bem no filme todo é a trilha sonora. Sem surpresas, já que nossas trilhas são sempre bem-vindas. Caetano Veloso acertou mesmo o “tiro”. A parceria com Milton Nascimento foi assertiva (eles que estão em parceria mesmo no mundo musical). Belas músicas, algumas cantadas, outras não, se encaixando sempre bem ao tema da cena.
Expectativa um tanto quanto furada, mas em se tratando de geral, o filme não é deveras ruim. Indiscutivelmente, vai acabar sendo menos lembrado do que seus irmãos de linhagem. Do jeito que estão sendo as recentes lançadas projeções, ele se torna valioso. Acima de tudo, é brasileiro e temos que valorizar o que é nosso! Quando falhas, aprender com tais. Quando acertos, aprender, crescer e ser elogiado. É assim na vida, é assim para as telonas.