Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 26 de novembro de 2005

Harry Potter e o Cálice de Fogo (2005): um filme excelente

Um dos melhores, se não, o melhor blockbuster de 2005. Diversão pura.

Rapaz, vou ser bem sincero: estou muito surpreso. Depois que acabou a sessão do filme, percebi o que é o cinema de alto nível. Um cinema que não tem a premissa de gerar obras de arte. Um cinema que tem o intuito único e exclusivo para o entretenimento. Não é absurdo dizer que ele conseguiu chegar ao ápice do entretenimento. Quando eu digo esta palavra, eu não estou falando da obra-prima do cinema, com roteiro magnífico ou com a sutileza de um bom filme francês, mas sim, daquele filme que você acaba de assistir e diz: “Poxa, foi uma experiência ótima.”. E assim posso definir “Harry Potter e o Cálice de Fogo”. Uma mistura de ação, romance adolescente, aventura, suspense, magia, comédia, partes de vitórias, partes de tristezas, partes de determinação, parte heróica. Tudo isso acontece no filme.

Assombrado por pesadelos que fazem sua cicatriz doer mais que o normal, Harry Potter (Daniel Radcliffe) está feliz por escapar dos maus sonhos assistindo à Copa Mundial de Quadribol com seus amigos Rony (Rupert Grint) e Hermione (Emma Watson). Diga-se de passagem, uma ótima representação. Emocionante. Mas algo sinistro aparece no céu no campo de Quadribol – a Marca Negra, o símbolo de Lorde Voldemort. São seus seguidores, os Comensais da Morte, que não tinham ousado aparecer em público desde que Voldemort (Ralph Fiennes) fora visto há 13 anos – na noite em que matou os pais de Harry. Harry quer voltar à segurança da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts, onde o Professor Dumbledore (Michael Gambon) pode protegê-lo. Mas as coisas serão um pouco diferentes este ano. Dumbledore anuncia que Hogwarts vai ser a sede do Torneio Tribruxo, um dos mais perigosos e sensacionais da comunidade dos bruxos. Será escolhido um campeão de cada uma das três maiores e mais prestigiosas escolas de bruxaria para competir numa série de tarefas que põem a vida em risco, com o objetivo de ganhar a cobiçada Taça Tribruxo. Os alunos de Hogwarts observam, encantados, as elegantes meninas da Academia de Magia Beauxbatons e os jovens sombrios do Instituto Durmstrang, que enchem o Salão Principal, prendendo a respiração ao esperar a seleção dos campeões.

O chefe do Departamento de Cooperação Mágica Internacional Bartô Crouch (Roger Lloyd Pack) e o Professor Dumbledore presidem a cerimônia à luz de velas, acompanhada com ansiedade, enquanto o Cálice de Fogo encantado seleciona um aluno de cada escola para competir. Entre chamas e clarões, são indicados o astro do Quadribol de Durmstrang, Victor Krum, seguido da beleza de Beauxbatons, Fleur Delacour (Clémence Poésy) e do representante de Hogwarts, o popular menino de ouro Cedrico Diggory. Mas então, inexplicavelmente, o cálice cospe mais um nome: Harry Potter. Com apenas 14 anos, Harry tem três anos menos do que o necessário para a árdua competição. Ele insiste em dizer que não colocou seu nome no Cálice, que não quer competir. A decisão do Cálice, porém, é soberana.

Já contei demais. Deu para perceber que rumo o filme terá, certo? Esqueça todo aquele paradigma de que Harry Potter tem que ganhar tudo, todo mundo sai bonitinho e vivem felizes para sempre. Neste, não existe isso. O clima sombrio dá uma amostra do que veríamos pela frente: cenários escuros e personagens enigmáticos. Lembrei de Tim Burton. Cenários desta aventura do bruxo são muito parecidos com os de A Noiva Cadáver (nas suas devidas proporções, lógico). Talvez seja por isso que a censura saiu de livre para 12 anos. Se bem que A Noiva Cadáver é bem mais assustador e possui até um humor negro, e tem a censura livre. Acho que não queriam que o filme da Warner Bros ficasse no topo da lista de filmes mais vistos de todos os tempos, porque Harry Potter e o Cálice de Fogo tem potencial para isso, e está caminhando para figurar entre os 10 filmes mais vistos de todos os tempos. Merecidamente.

Empolgante. Sabe aquele filme que você torce pelo herói? Chora quando acontece algo triste junto a ele? É o que acontece aqui. No primeiro desafio de Potter, na luta contra o Dragão, que sensação boa! Divertidíssimo. Nos outros desafios acontece o mesmo. É importante dizer que o filme foi evoluindo a passos largos desde a sua primeira versão. Definitivamente, este filme não é mais para crianças. Os temas já são adolescentes e as responsabilidades são de adultos. O primeiro filme (A Pedra Filosofal) era muito bobinho, contendo crianças chatas e sem conteúdo. À medida que os filmes foram sendo lançados até O Prisioneiro de Azkaban, as coisas foram melhorando, ganhando corpo em seu conteúdo e em seus personagens. Não existe mais molequinho de óculos redondo com varinha na mão, vemos um cavalo cabeludo (isso vale tanto para Potter como para Rony, que está até com uma voz grave). Estão com sentimentos de adolescentes, vivendo o primeiro sentimento amoroso e as primeiras descobertas. Falando nisso, esperava mais desse pseudo-romanc (Harry e a bonitinha Cho Chang).

Graficamente o filme está espetacular. Efeitos especiais de alta qualidade. Hoje em dia, todo estúdio que se preze, está com um ótimo arsenal de efeitos especiais nas suas equipes, e Harry Potter (da Warner) não poderia ficar de fora. Até o grau de evolução gráfica é percebido. Faça uma comparação entre o primeiro e este quarto filme, e veja que a diferença é quase que absurda. Para efeito de raciocínio, as cenas com inimigos, como na prova do Dragão e da água, são extremamente bem trabalhadas. Coitado de Daniel Radcliffe que teve que passar 41 horas debaixo d’água na segunda prova da competição do Tribruxo. Coitado dele e de seu dublê.

Em termos de interpretações, o nível é fraco. Percebemos como os atores são ruins, salvo algumas exceções. Só que o foco do filme é tão diferente, que acabamos não percebendo as falhas nas interpretações. Talvez o carisma dos personagens disfarce suas fracas atuações. O garoto que faz Harry Potter, Daniel Radcliffe, é um exemplo prático. Ele é um péssimo ator, mas tem um carisma absurdo. Aquela cara de mongol medroso dele e de seu melhor amigo Rony (Rupert Grint), fazem com tenhamos afeições para com eles. Hermione (Emma Watson) está crescendo e ficando muito linda, além de ter um talento que pode ser mais aprofundado. Muitos personagens podem ser comentados, mas irei me ater a esses.

O aclamado Mike Newell (diretor) dirige o quarto filme da série dos livros de J.K. Rowling com maestria. Todo o mérito do filme é dele. Nos dois primeiros filmes a direção foi de Chris Columbus, e no terceiro, de Alfonso Cuarón. Newell é o primeiro diretor inglês a dirigir um filme de Harry Potter. A carreira do diretor tem alguns filmes interessantes. Ele recentemente dirigiu Julia Roberts e Julia Stiles em “O Sorriso de Mona Lisa“, embora talvez seja mais conhecido por ter dirigido a comédia romântica de sucesso “Quatro Casamentos e um Funeral“, de 1994, que recebeu vários prêmios e duas indicações ao Oscar, incluindo a de Melhor Filme.

A luta entre Potter e Lorde Voldemort é extremamente bem dirigida. Voldemort só não conseguiu ser mais feio do que Gollum, de “O Senhor dos Anéis“. Eu esperava que este tal inimigo fosse mais forte. Ou Potter é O CARA, ou Voldemort ainda estava despertando (ou revivendo) seus poderes. Talvez o filme não tenha sido mais completo devido a sua trama, que continua bastante extensa, e sabendo de que este seria mais um filme da série, talvez isto tenha limitado um pouco o aprofundamento na trama. O pior é que o filme acaba com aquela sensação: “Pó, acabou? Só daqui a 2 anos agora? Droga!”. A vontade de ver mais é difícil de controlar.

A trilha sonora é extremamente competente. Patrick Doyle foi primoroso em recriar o estilo musical da série. Temos ótimas músicas durante todo o filme. Todas combinando com seu real momento e não aquelas trapalhadas das versões anteriores. Na parte do Baile de Inverno, uma banda de verdade faz seu som. Ela é formada por algumas figurinhas carimbadas, como: Jarvis Cocker e Jason Buckle (da Banda Pulp), e Jonny Greenwood e Phil Selway (do Radiohead). Para comentar esta cena do baile, eu esperava um pouco mais pelo o que os produtores comentavam. Pensava que ia ser nesse momento que Harry iria dar uns beijinhos.

Entretenimento de qualidade pra mim é quando você entra numa sala de cinema, consegue misturar boa parte das emoções existentes e possíveis (alegria, tristeza, medo, alivio, surpresa, etc). Este filme faz com que aconteça tudo isso. Há quem não concorde, mas quando um filme consegue isso, independente do roteiro ou de outros problemas, ele merece nota alta. Este faz por onde merecer.

Jurandir Filho
@jurandirfilho

Compartilhe