Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 15 de maio de 2006

Verdade Nua

Atom Egoyan até tenta, mas não consegue ressuscitar em "Where the Truth Lies" a intenção de fazer dele um filme noir, conseguindo apenas um filme fraco de mistério com algumas cenas de sexo espalhadas pela película.

“Noir” é um termo dado pelos franceses ao estilo de filme americano que chegava em 1946 aos cinemas da França. Estreavam com 5 anos de atraso, devido ao período em que os Estados Unidos se manteve em guerra (1941-45). Após a quebra da bolsa de valores americana em 1929, a vida econômica, se tornou um caos, e por causa da lei seca, surgiram às máfias e os tráficos nos EUA. Essa foi a primeira grande desilusão do povo norte-americano no sistema de ação da livre iniciativa no comércio.

Esse cenário foi o responsável pela criação de filmes de gangster. A evolução desse estilo de filme foi o filme Noir. Filmes com personagens desiludidos, tanto vilões como mocinhos. Personagens que não tinham escrúpulos nenhum, geralmente solitários e inseguros, ligados ao passado e não se importando com o futuro. Na estética cinematográfica, o filme abusava de cenas noturnas, acentuando as sombras e marcando o ar de fatalidade. Além de uma trilha sonora marcante.

É baseado nessa descrição que ao assistirmos “Where the Truth Lies” vemos que a tentativa do diretor egípcio Atom Egoyam é terrivelmente frustrante e até mesmo sacal. O filme começa em um programa de TV, onde Lany Morris (Kevin Bacon) e Vince Collins (Colin Firth) são comediantes e tentam arrecadar dinheiro em seu programa (algo parecido com o “Criança Esperança”) para diversas causas, e tem sua parceria encerrada após o encontro de uma jovem morta, na banheira de seu apartamento de hotel. Quinze anos depois (esse tipo de recurso tem sido utilizado muito ultimamente, não?!), a jornalista Karen O´Connor é enviada para escrever um livro sobre a vida de Vince e principalmente, desvendar o que acontecera no dia da morte da garota. A partir daí começa um jogo informações e sedução, onde nem sempre as intenções são o que parecem ser e onde Karen começa a juntar as peças para descobrir o que realmente acontecera na noite da morte da garota.

Em nenhum momento do filme percebemos nenhum dos elementos que transformaram os filmes “noir” da década de 40/50, imortais. Não há jogo de sombra e luz, inclusive há sim uma técnica que o diretor usa na fotografia para diferenciar o passado do presente que chega até mesmo a irritar. Grande parte das cenas são diurnas, o que dificulta mais ainda a manipulação de sombras e luz.

A trilha sonora, composta por Mychael Danna, que também é responsável pela trilha de Capote, é o único elemento reconhecidamente no estilo “noir”, mas que infelizmente, como nenhuma das cenas se encaixam no estilo, fica completamente destoado do restante, chegando a determinados momentos a beirar ao risível ou simplesmente ao ridículo.

Quanto a Kevin Bacon, este se encontra em uma verdadeira montanha russa em sua carreira. Com altos (Meninos e Lobos) e baixos (O Homem Invisível) ele chega, nesse filme, ao nível mais baixo em um dos seus piores papéis da sua carreira (até mesmo sua pequena participação em Sexta-feria 13 parte um, conseguiu ser melhor!). Interpretando Lenny Morris, ele não consegue sair de uma caricatura dos personagens canastrões que conhecemos da história do cinema, daqueles que nós, ao batermos os olhos, pensamos: “Não gostei dele. Ele esconde algo. Ele tem cara de sacana.”. Collin Firth também não está em melhor forma. Tentando ainda se manter no mercado americano cinematográfico, o inglês de 46 anos, que ainda tenta se firmar no cinema americano, mesmo com alguns filmes bons na sua carreira, infelizmente limita-se também as caricaturas de “mocinho” que depois vira canalha. Alisson Lohman, que vive a jornalista, não consegue de forma alguma convencer no papel, e até ficamos surpresos ao ver que ela chegou às conclusões principais do filme, sozinha, afinal, ela não parece fazer o tipo intelectual.

Infelizmente, Egoyam parece optar por outro atrativo no filme, que não seja o roteiro (aliás um pouco mal elaborado na adaptação do livro de Rupert Holmes). Ele exagera um pouco nas cenas de sexo, onde até esbarrou com o órgão americano de censura (MPAA), que acabou restringindo o filme para maiores de 17 anos (o nosso “censura 18 anos” a lá Tio Sam).

No geral, “Where the Truth Lies” é um filme fraco, que não consegue se sustentar por muito tempo sem nos brindar com alguns bocejos ou olhadas para o relógio, procurando ver quanto tempo ainda falta para o filme acabar, fazendo os 95 minutos de filme parecer um longo e duradouro Titanic.

Leonardo Heffer
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